SYDNEY - Uma espetacular Via-Crúcis encenada pelas ruas de Sydney acompanhada por milhares de fiéis marcou o quarto dia das Jornadas Mundiais da Juventude (JMJ), quando o Papa Bento XVI advertiu que o mundo cristão enfrenta uma conjuntura decisiva. A multidão lotou as ruas para ver a grandiosa encenação das últimas horas de vida de Cristo, interpretada por cerca de cem atores, e o Papa acompanhou o espetáculo através de telões na catedral de Santa Maria, no centro de Sydney.
Na catedral transcorreu grande parte da agenda do Sumo Pontífice nesta sexta-feira. Bento XVI recebeu pela manhã os líderes cristãos, ante os quais advertiu que "o movimento ecumênico alcançou uma conjuntura decisiva", no momento em que os anglicanos enfrentam a ameaça de um cisma pela ordenação de mulheres e homossexuais como bispos. "Queridos amigos em Cristo, creio que estarão de acordo em que o movimento ecumênico alcançou uma conjuntura decisiva", disse o Papa para representantes anglicanos, ortodoxos, luteranos e maronitas, entre outros.
"Devemos estar vigilantes para qualquer tentação de ver a doutrina como algo divisor e, por conseguinte, um impedimento para a tarefa mais urgente de melhorar o mundo no qual vivemos". "Os cristãos devem trabalhar em conjunto para garantir que o prédio se mantenha firme e para atrair a atenção dos outros, para que entrem e descubram os abundantes tesouros da graça", disse o Papa, que participa das Jornadas Mundiais da Juventude (JMJ), ao lado de mais de 200 mil peregrinos.
As palavras de Bento XVI são pronunciadas depois da ordenação da primeira bispo anglicana, o que provocou indignação entre os conservadores desta Igreja. A ordenação de mulheres e homossexuais é um tema que ameaça dividir os anglicanos, cerca de 77 milhões em todo o mundo, cujo conclave mais importante ocorre desde a quarta-feira, na cidade britânica de Canterbury.
Na catedral de Sydney, o Papa também recebeu representantes de outras crenças, e disse que "a Igreja busca com entusiasmo oportunidades para escutar a experiência de outras religiões". Diante de representantes judeus, islâmicos, hindus e budistas, Bento XVI destacou que a experiência humana, acima das limitações culturais e geográficas, "torna possível o diálogo entre os seguidores das várias religiões".
Após o encontro na catedral de Sydney, o Papa almoçou com jovens peregrinos, entre eles Jorgiana Aldren Lima de Santana, uma brasileira de 26 anos. Antes do início da Via-Crúcis, a polícia australiana retirou de uma praça ativistas que realizavam um protesto contra os escândalos sexuais na Igreja Católica.
Sete membros do grupo Broken Rites, que concede apoio a vítimas de abusos do clero católico, afirmaram que foram obrigados pela polícia a deixar um parque nas imediações da catedral de Santa Maria. "É vergonhoso que a Igreja faça isto, retirar a gente. Estão impedindo que as pessoas sejam ouvidas", afirmou John Ellis, uma vítima de abuso sexual em Sydney.
Os manifestantes, que exibiam cartazes com os dizeres "Tirem as mãos de nossas crianças" e "Denuncie o abuso", afirmaram que os policiais obrigaram todos a se retirar, já que não tinham permissão para protestar. Ellis disse que os peregrinos que estavam no local se mostraram compreensivos, e que inclusive alguns se aproximavam para cumprimentá-los.
"Só uma mulher protestou e nos perguntou 'por que estragam nossa diversão?'", acrescentou. O Papa disse durante sua viagem à Austrália que pediria desculpas pelos casos dos religiosos pedófilos, assim como o fez em abril nos Estados Unidos, mas essa possibilidade foi em seguida colocada em dúvida pelo porta-voz do Vaticano.
Bento XVI encerrou sua agenda nesta sexta com uma visita na igreja da Universidade de Sydney a um grupo de jovens em reabilitação, com os quais voltou a falar do "culto às posses pessoais, o amor possessivo e ao poder, que levam as pessoas a tentar bancar Deus".