BONN - A conferência da ONU sobre biodiversidade encerrada nesta sexta-feira (30/05), em Bonn, foi um êxito, segundo o ministro do Meio Ambiente, pois permitiu avançar na questão dos recursos genéticos e no uso de biocombustíveis, o que não vai de encontro com a opinião das ONGs presentes ao encontro. "Há algumas questões que ainda devem ser abordadas. Mas sou otimista e acho que poderemos resolvê-las", declarou Sigmar Gabriel.
Entre os êxitos mencionados, Gabriel destacou a decisão de estabelecer um 'mapa do caminho' para o acesso a recursos energéticos e divisão dos benefícios resultantes de seu uso. Trata-se do primeiro progresso neste sentido desde a adoção do Convênio sobre a Biodiversidade Biológica (CDB) na cúpula da Terra na Rio-92.
O chefe do Programa da ONU para o Meio Ambiente, Achim Steiner, também parabenizou os progressos obtidos em Bonn, mas as ONGs ecológicas saíram da reunião com uma visão totalmente diferente. "Esta conferência avança como um caracol, enquanto animais e plantas desaparecem em grande velocidade", lamentou Martin Kaiser, do Greenpeace Internacional. Segundo ele, este encontro de 12 dias só "confirmou a indiferença da comunidade internacional quando se trata de proteger as florestas, o clima e a biodiversiade"
Juan Carlo Jintieach, porta-voz da ONG brasileira Aliança Amazônica, também expressou sua decepção ao criticar que é preciso deixar "a retórica de lado e passar logo para a ação". Segundo os organizadores do encontro, mm passo à frente decisivo rumo à criação de desse que seria um 'IPCC da biodiversidade', uma referência ao Painel Intergovernamental para Mudanças Climática, vencedor do Prêmio Nobel da Paz 2007. "Decidiu-se convocar uma reunião intergovernamental para novembro com o objetivo de concluir e lançar esse mecanismo", informou à AFP Didier Babin, que dirige o projeto há três anos.
Essa decisão, que foi adotada em grupo de trabalho, foi retificada nesta sexta-feira em sessão plenária pela conferência. A idéia é instaurar uma rede de especialistas que possa desempenhar pela biodiversidade o mesmo papel de interação entre os cientistas e políticos que os especialistas do IPCC para o aquecimento global. A biodiversidade é um desafio maior, tanto para a redução da pobreza, para o aprovisionamento de água potável, para o fim dos conflitos ligados à utilização e à apropriação de recursos renováveis, quanto para a saúde.
Mas devido à complexidade dessas questões, a comunidade científica que estuda esse tema está muito fragmentada, e suas idéias não chegam aos ouvidos dos líderes políticos. "A informação científica sobre a biodiversidade está muito dispersa. É preciso estabelecer relatórios que tenham impacto", considerou Didier Babin. Para Abdul Zakri, que co-presidiu a Avaliação do Milênio dos Ecossistemas do Planeta de 20O1 a 2005, "o IPCC é verdadeiramente um modelo muito forte no qual é preciso se inspirar para realizar avaliações sobre a biodiversidade".
Os três pontos fortes do grupo de especialistas sobre o clima devem ser a "credibilidade científica", a "pertinência" e a "legitimidade política". A erosão da biodiversidade é tão grave quanto as mudanças climáticas, mas a problemática suscitada carece de visibilidade. "Não é um processo claro como o do aquecimento global, com o derretimento das geleiras do Árctico e da neve do Kilimanjaro", explicou Abdul Zakri, hoje diretor do Instituto para os Estudos Avançados das Nações Unidas no Japão.
Se o clima representa um desafio mundial, comum ao conjunto da humanidade, a biodiversidade também abrange os desafios nacionais de maneira mais direta, como a proteção dos mangues, a pesca predatória, o desmatamento. "Com isso, alguns países tendem a proteger de maneria egoísta sua soberania", ressaltou Abdul Zakri. Portanto, "temos muito a aprender sobre o planeta", acrescentou.
Um IPCC da biodiversidade permitiria "organizar melhor as informações básicas e fazer alguns temas emergirem", considerou Didier Babin. Por exemplo, "se pudéssemos dispor de um relatório completo sobre o impacto dos biocombustíveis sobre a biodiversidade há um ano, conseguiríamos avançar muito mais rápido nessa questão em Bonn", afirmou Babin. A idéia da criação de um IPCC da biodiversidade foi mencionada em janeiro 2005 em Paris, durante uma confêrencia internacional, por iniciativa do presidente Jacques Chirac.