Correio Braziliense
postado em 25/01/2020 07:00
O jovem mora apenas com a mãe, Ana Paula de Carvalho, 46. Ela não terminou os estudos e lutou para que o futuro do filho fosse diferente. Quando Lucas contou que queria fazer medicina, ela não hesitou e duplicou a jornada de trabalho para pagar um cursinho preparatório. A funcionária doméstica e diarista conta que chegava a chorar de cansaço, mas o resultado valeu a pena. “Hoje eu digo que, no dia em que eu me for, vou tranquila porque sei que a vida dele está estruturada”, afirma. A força e o apoio da mãe são reconhecidos por Lucas. “Ela sempre foi a minha maior inspiração”, diz.
Lucas era um dos únicos alunos negros e de escola pública da turma que frequentou, por três anos, no cursinho Exatas, onde tinha 30% de bolsa. Os comentários racistas que ouvia dos colegas fizeram com que ele repensasse a escolha algumas vezes. “Eu tive medo de estar envolvendo as pessoas que amo em algo que podia não ser real por causa das minhas condições”, confessa. O preconceito, porém, se transformou em motivação. O calouro adotou a sigla Esum para a vida, que significa Eu serei um médico. “Eu escrevia isso em todos os lugares e ficava sempre repetindo”, conta.
Saiba Mais
O adolescente estudou o 2º e o 3º anos no Centro de Ensino Médio Ave Branca (Cemab), em Taguatinga. O futuro cirurgião cardíaco garante que não abandonará as raízes. Para ele, a maior realização será trabalhar na comunidade. “Imagine atender as pessoas com quem convivi na infância, minha família... Eu sonho com isso todos os dias”, relata.
Com a igreja Comunidade Cristã da Aliança, que Lucas frequenta, ele fez um levantamento e descobriu que 80% da vizinhança não tem ensino fundamental completo. Ele deseja transformar essa realidade. “Eu quero mostrar que o estudo, a perseverança e a garra podem mudar uma vida”, descreve.
Passar na UnB foi o primeiro passo: manter-se durante a graduação em medicina exigirá muito esforço da família. Para bancar os custos com os materiais da faculdade, Ana Paula pretende arrecadar roupas para fazer um bazar e continuar trabalhando em dobro. Lucas quer ampliar a marca de doces e vender brigadeiros na universidade.
A história de superação de Lucas começou ainda antes do nascimento: Ana Paula teve toxoplasmose durante a gravidez, e médicos chegaram a dizer que ele nasceria com algum problema ou ficaria em estado vegetativo. A evolução do menino sobrevivente surpreendeu a todos: aos 8 anos, ele já estava na classe para alunos com altas habilidades.
Mesmo frente às adversidades, o estudante, que precisava pegar quatro conduções diárias para estudar e carregava uma mochila com cerca de 15kg de materiais, nunca se deixou abater. O esforço será recompensado: Lucas será médico.
*Estagiária sob supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa
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