Com a retomada do comércio e de outras atividades no DF, empregadores precisam adotar medidas para proteger funcionários e clientes. Ao mesmo tempo, trabalhadores também devem se resguardar tomando cuidados. Nem todos os setores voltaram ao normal, mas a expectativa é de que é questão de tempo até a reabertura total. Quando isso acontecer, é importante estar preparado para prevenir novos casos de covid-19.
No Brasil, 92% dos profissionais admitem estar preocupados com a exposição ao novo coronavírus no local de trabalho ou em atividades relacionadas ao emprego, segundo pesquisa da Udemy (veja quadro O medo da contaminação na página 6). Valéria Paes, infectologista formada pela Universidade de Brasília (UnB) e membro da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, enxerga a flexibilização das medidas de isolamento social com preocupação.
“É inevitável que haja o aumento do contato entre as pessoas e, consequentemente, da transmissão do novo coronavírus. Isso vai repercutir em internações e, possivelmente, em mortes”, aponta a especialista em qualidade em saúde e segurança do paciente pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca. A recomendação da infectologista para minimizar os riscos é que, mesmo com o comércio aberto, as pessoas continuem em casa e só saiam em caso de necessidade.
Nessas ocasiões, não tocar o rosto, utilizar máscaras, levar sempre consigo o próprio álcool em gel e evitar sair durante os horários de pico fazem a diferença. Para quem precisa voltar ao trabalho, os conselhos são, geralmente, os mesmos. No entanto, alguns cuidados a mais devem ser tomados. “O funcionário vai estar mais exposto. Ele vai ter contato direto com outras pessoas. Esse profissional deve seguir as recomendações desde o momento em que sair de casa, principalmente se for utilizar o transporte público”, explica.
O ideal é que o trabalhador tenha um conjunto de máscaras para trocar durante o dia. Segundo a infectologista, o tempo de uso varia entre quatro e seis horas. Se o profissional fala muito enquanto usa o acessório, a troca deve ocorrer em período menor de tempo, quando perceber umidade no equipamento. “É importante levar um saquinho plástico para guardar a máscara usada, lavar quando chegar em casa e ter outra seca e limpa para usar no dia seguinte”, indica.
Além disso, a médica recomenda manter o máximo de distância possível de outras pessoas, no mínimo, um metro e meio. “É uma nova cultura. Brasileiro tem o hábito de se aproximar, pegar na mão, abraçar. Este é um momento em que vamos precisar manter distância por uma questão de segurança”, diz. Os donos dos estabelecimentos reabertos devem viabilizar a higienização do ambiente. As mãos, os balcões e as maçanetas precisam ser desinfetados muitas vezes ao dia. O material para limpeza deve estar sempre à disposição dos colaboradores.
Valéria Paes explica que a ventilação natural do ambiente, com as janelas abertas, é mais adequada. Por isso, nada de ar-condicionado ligado. A frequência de limpeza dos banheiros depende do quanto ele é utilizado, uma vez por dia no mínimo ou mais vezes, se necessário. Para garantir que não haja mais contaminações, a especialista alerta que, caso o profissional esteja com algum sintoma respiratório, não vá ao trabalho. “Essa pessoa deve ficar isolada”, afirma. Por isso, vale também a compreensão dos chefes.
Ansiedade para voltar
Dona da própria marca de roupas, Lindalva Alves, 49 anos, espera o dia em que verá as duas unidades da loja Ava, ambas na Feira do Guará, abertas. Há sete anos, a designer de moda formada pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO) se dedica a cuidar das bancas de roupas e acessórios. Cerca de 80% dos produtos são criados por ela, como joias artesanais e tecidos pintados à mão. Sobre o período da pandemia, ela comenta: “Realmente, está muito difícil. Não só para mim, mas para todos os comerciantes”.
Saiba Mais
Lindalva tenta reinventar-se enquanto as lojas não podem reabrir. No Instagram, tem publicado as peças e feito promoções, mas sem muito sucesso. “Só tenho a loja para sobreviver e não estou vendendo nada pela internet”, conta. Para não demitir as duas funcionárias que tem, a designer suspendeu temporariamente os contratos por dois meses. O ato é legal, de acordo com Medida Provisória (MP) 936 de 1º de abril de 2020, que institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública decorrente da pandemia.
Na volta, Lindalva pretende manter os contratos suspensos e conta com a ajuda de uma nova gerente. Segundo ela, os lucros serão incertos, mesmo quando as lojas abrirem. Por isso, não pode arriscar recontratar sem saber se poderá pagar os salários. A designer diz não ter receio em voltar para a feira. “Eu penso que as pessoas têm de ter consciência, tanto o empresário quanto os clientes”, diz. As regras para reabertura estão previamente determinadas: o estabelecimento deverá ser limpo três vezes ao dia, principalmente o balcão, o vestiário e a máquina de cartão.
“Saiu uma cliente, tem que limpar”, afirma. A entrada dos fregueses será controlada. Além disso, só poderão entrar pessoas usando máscara. Lindalva planeja ter um estoque do acessório para oferecer, caso o visitante não tenha. Álcool em gel deverá estar sempre ao alcance. “É uma maneira de proteger a mim e o cliente”, explica. “Tem tudo para dar certo se cada um fizer sua parte e ter respeito pelo outro. É o momento de a gente se ajudar”, completa.
Nunca parei
Funcionária há quatro anos de um restaurante no Areal, Raquel Oliveira, 31 anos, continua indo todos os dias ao trabalho, onde presta o serviço de caixa e auxiliar de cozinha. Sem esquema de delivery, o estabelecimento prepara cerca de 150 marmitas por dia. Na porta, ela e a cozinheira são quem entregam as refeições aos clientes que vão buscar. “As vendas estão boas. É mais ou menos o mesmo tanto que vendia antes”, afirma.
Antes da pandemia, a auxiliar de cozinha, que estudou até a 5ª série do ensino fundamental, trabalhava também em uma casa noturna em Vicente Pires. Enquanto o serviço no restaurante continua a todo vapor, do segundo emprego, Raquel foi demitida. “Graças a Deus, quando me dispensaram estava nos dois serviços. Se não, agora, estaria desempregada”, agradece.
Mãe de quatro filhos, Raquel diz não ter medo de voltar para rotina normal de trabalho. Junto às colegas, ela toma todas as precauções para não se contaminar e se sente protegida. “Passamos álcool em gel, usamos luvas e trocamos a máscara a cada duas horas. Também não usamos o mesmo uniforme todos os dias”, relata. Para ela, o comércio poderia reabrir todo logo, assim, quem sabe, ela poderia recuperar o segundo emprego, que fornecia uma renda fundamental para a sua família.
Continuando em home office
Apesar de os escritórios estarem excluídos da suspensão de atividades desde 22 abril, muitas empresas optaram por continuar com o trabalho remoto. Para a infectologista Valéria Paes, o ideal é que instituições que conseguem manter o trabalho nesse sistema não voltem para a rotina presencial por enquanto. “O funcionário sai de casa, tem que pegar transporte público e tem contato com os colegas. Essa pessoa pode trazer ou levar alguma coisa para casa”, explica.
A ClickA, startup de triagem de currículos para a área de tecnologia da informação, está em home office desde 12 de março, antes mesmo de as atividades comerciais terem sido suspensas. “Assim que a doença começou a chegar ao Brasil, começamos a nos preparar. Toda a equipe está em casa”, conta Danilo Custódio, 38 anos, CEO da empresa e cientista da computação pela Universidade de Brasília (UnB).
Os colabores continuam sem precisar ir ao escritório, na 511 Norte. “Nossa expectativa é de que, a partir de junho, possamos começar a voltar gradualmente”, afirma. A startup está desenvolvendo um plano de ação para poder retornar ao trabalho presencial. Primeiramente, está sendo criado um protocolo sanitário, para, depois, ocorrer revezamento de turnos no escritório e, por fim, a volta total.
Para o CEO, manter o trabalho remoto é uma maneira de contribuir para que o vírus não seja propagado nem colapsar o sistema de saúde. “Nosso serviço não depende de estar em determinado local. Então, optamos por ficar em casa. Primeiramente, pela segurança dos nossos colaboradores e, em segundo lugar, por ser uma questão social”, pontua Danilo.
O privilégio da opção
Apesar de aberto, o escritório de advocacia trabalhista em que Natália Oliveira Santos, 24, atua deu aos funcionários a possibilidade de continuar trabalhando de casa. Por precaução, a advogada, formada pelo Centro Universitário de Brasília (UniCeub), preferiu o home office. “Quando o governador permitiu a abertura dos escritórios, a empresa perguntou quem queria voltar. Foram pouquíssimas pessoas, e só essas retornaram”, relata.
Natália mora em Águas Claras, cidade com o segundo maior número de infectados por coronavírus no Distrito Federal. Somente no prédio em que a advogada mora, há três casos confirmados. “Apesar de estar cansada de ficar em casa, fiquei com medo de voltar. Em qualquer vacilo no elevador, por exemplo, posso pegar e acabar transmitindo para os meus pais”, diz.
A mãe da advogada é policial militar e continua indo ao trabalho. Já o pai, funcionário da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, presta serviço remotamente. No dia a dia, Natália sai apenas para comprar o essencial em locais como padaria, mercado ou farmácia. Na bolsa, leva sempre álcool em gel e máscara. Quando volta ao lar, as roupas vão direto para a lavanderia.
Para Natália, é importante que as pessoas que tenham essa possibilidade continuem trabalhando remotamente. “É necessário ter mais paciência e manter essa rotina em casa. Todo mundo está muito ansioso, no limite. No entanto, quem puder, que faça o home office”, pede.
Volta às aula é aguardado com apreensão
Ainda sem data definida para a reabertura de escolas, a Secretaria de Estado e Educação do Distrito Federal (SEEDF) divulgou estratégias para a volta às aulas. O plano prevê o sistema de ensino híbrido de revezamento emergencial, em que os alunos devem ser divididos para intercalar entre aulas a distância e presenciais. Além disso, serão instalados diversos protocolos de higienização, como a desinfecção de sapatos e mochilas, uso de máscaras e álcool em gel e ainda medição de temperatura na entrada da escola.
Professora de química em dois colégios particulares, Gabriela Monteiro, 24 anos, continua a dar aulas nas instituições a distância e acredita que este ainda não é o momento de voltar para as escolas. “Ao mesmo tempo que estou morrendo de saudade da sala de aula, tenho noção de que podemos sofrer com a volta. Penso que é cedo, não sei se me sinto segura para retornar”, confessa. Gabriela explica que, no retorno, será difícil controlar a distância entre os alunos.
“Fico apreensiva. Os meninos passam longos períodos no colégio. Então, dispender esse tempo sem ter contato com ninguém é complicado”, afirma. Para a educadora, é preciso um plano mais elaborado para o retorno. O uso da máscara, por exemplo, pode ser um problema, uma vez que os professores deverão usar a voz com mais potência ainda. De qualquer forma, Gabriela já pensa nos diálogos que terá com alunos assim que voltar às aulas. “Barrar o contato físico e o empréstimo de material terão de ser reforçados todos os dias, até mesmo entre os professores, já que gostamos de abraçar, apertar as mãos”, projeta.
Artigo
Voltando ao trabalho nas empresas que operam na China
“É útil acompanharmos como grandes empresas que operam na China estão voltando ao trabalho. Afinal, o mundo necessita estabelecer regras para o pós-pandemia, e a China pode ser vista como um laboratório onde se descobrirá o que funciona e o que não funciona. Medidas óbvias estão sendo tomadas ali, como o uso de máscaras, desinfetantes e manutenção de distância entre os trabalhadores, mas, naquele país, que é uma ditadura, vêm sendo adotadas certas medidas que, talvez, sejam vistas com estranheza em países democráticos.
Entre elas, o uso obrigatório de aplicativos aprovados pelo governo para acompanhar o estado de saúde e os locais por onde as pessoas transitaram e a adesão compulsória a outras regras que variam de cidade para cidade. Há um ponto, porém, em que todos parecem concordar: a vida não voltará a ser como antes. A Foxconn, empresa taiwanesa que, entre outros produtos, fabrica iPhones, recomenda que os empregados evitem o transporte público, lavem as mãos antes e depois de tocarem documentos e almocem com bastante espaço entre as pessoas. As salas de reuniões devem ter as janelas sempre abertas.
Gigante da área química, a alemã Basf exige que os ônibus que transportam seu pessoal também tenham as janelas abertas, independentemente do frio. A temperatura dos que chegam às fábricas são tomadas, e aqueles com febre são imediatamente enviados para um hospital; seus colegas são postos em quarentena. A empresa, em parceria com o governo, tenta descobrir se funcionários viajaram em trens ou ônibus em companhia de pessoas infectadas.
Todos na Basf são obrigados a usar máscaras; mesas e outras superfícies são higienizadas continuamente e, nos refeitórios, cada mesa só pode ser ocupada por uma pessoa. Os funcionários administrativos trabalham em regime de home office, e as fábricas e laboratórios passaram a operar em dois turnos, diminuindo a quantidade de pessoas trabalhando simultaneamente; nas trocas de turno, as informações são passadas com o uso de telefones.
Os motoristas do DiDi, a versão chinesa do Uber, todas as manhãs devem enviar um vídeo à companhia, comprovando terem higienizado seus carros, além de informarem sua temperatura, tudo com o uso de um aplicativo da empresa; devem também usar máscaras e luvas. A gigante do e-commerce JD.com desinfeta todos os pacotes que saem de seus armazéns; seus entregadores, sempre usando máscaras, agora podem falar com os clientes, o que eram proibidos de fazer anteriormente.
Predomina o home office, mas os empregados que vão aos escritórios foram divididos em dois turnos; marcas no piso mostram onde as pessoas podem ficar e os elevadores foram programados para parar em determinados andares, evitando que os usuários toquem os botões. Empresas de porte menor também tomam medidas de defesa: alguns restaurantes só permitem que clientes entrem após exibirem em seus celulares o ‘sinal verde’ gerado pelos aplicativos aprovados pelo governo; esses aplicativos em breve serão unificados, operando à base de QR codes.
Em resumo: é uma luta diferente contra um inimigo novo e terrível; medidas como essas que vêm sendo tomadas na China provavelmente serão de difícil implantação nos países ocidentais, de cultura e governo muito diferentes, mas talvez sejam as únicas alternativas eficazes.”
Por Vivaldo José Breternitz, administrador pelo Centro Universitário Padre Anchieta, doutor em ciências pela Universidade de São Paulo (USP) e professor da Faculdade de Computação e Informática da Universidade Presbiteriana Mackenzie
Ajuda
Senac oferece cursos on-line gratuitos
O Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial do Distrito Federal (Senac-DF) disponibilizou 16 cursos on-line gratuitos para capacitar e orientar empresários e empregados na abertura dos estabelecimentos comerciais. A iniciativa é uma forma de contribuir com as ações programadas para a reabertura sustentável da atividade econômica do comércio de bens, serviços e turismo no Distrito Federal.
No treinamento a distância, serão abordadas informações técnicas para a adoção de novos hábitos e atendimentos nos diferentes segmentos. Há orientação, por exemplo, de como diluir e manusear soluções desinfetantes, cuidados individuais e coletivos no fluxo de ida e volta ao trabalho e mudanças nos protocolos e rotinas. A carga horária dos cursos varia entre duas e 12 horas. A inscrição deve ser feita no site.
* Estagiária sob supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa