Jornal Correio Braziliense

Trabalho e Formacao

Em entrevista, Paulo Vieira ensina o caminho para emoções inteligentes

Para o coach, o segredo para o sucesso envolve parar de culpar os outros pelos problemas, se autorresponsabilizar e passar a correr atrás do que deseja

Aos 30 anos, divorciado, morando de favor na casa de familiares e sem dinheiro para comprar o básico, Paulo Vieira transformou sua vida e descobriu uma vocação quando achou a chave para sair daquele contexto difícil. Depois de ler o livro Sem medo de vencer, do psiquiatra Roberto Shinyashiki, compreendeu que o grande inimigo que o impedia de prosseguir era ele mesmo. ;A partir de uma metáfora sobre Sísifo, personagem da mitologia grega, entendi que eu era o meu o meu sabotador. Eu culpava o governo, as pessoas, a todos. Compreendi que o problema estava em mim e passei a assumir a minha responsabilidade;, relata. A partir disso, o engenheiro de pesca passou a se transformar internamente. Um ano depois, tinha uma empresa de consultoria comercial em ascensão, um carro, uma casa e estava noivo da atual esposa.

De lá para cá, o carioca se aprofundou em ajudar outras pessoas que precisam ;mudar de vida;. PhD em coaching pela Florida Christian University, é fundador e presidente da Federação Brasileira de Coaching Integral Sistêmico (Febracis), uma das maiores empresas de coaching do mundo. Entre 2011 e 2017, o faturamento da instituição aumentou em quase R$ 119 milhões. A empresa tem cerca de 600 funcionários espalhados em 30 unidades no Brasil em países como Estados Unidos, Angola e Portugal. Autor de livros best-sellers como O poder da ação, o master coach em gestão de pessoas acumula 10.800 horas em sessões de coaching individual.

O método desenvolvido por ele, o coaching integral sistêmico (CIS), alcançou mais de 250 mil pessoas, entre elas, empresários de multinacionais e atletas de renome, como o lutador brasileiro de UFC Lyoto Machida e o jogador de futebol Lucas Moura. Aos 50 anos, Paulo Vieira cobra R$ 15 mil por uma individual com ele, com duração de cerca de duas horas. Quem tem interesse e dinheiro disponível para investir terá de esperar: a agenda está cheia até outubro. O último lançamento dele, o livro Poder e alta performance sintetiza a experiência de 17 anos como coach, trazendo ainda histórias de pessoas que afirmam ter as vidas transformadas a partir de uma nova mentalidade emocional. ;É um manual com conteúdos e exercícios para se atingir a alta performance;, define.

O que aconteceu antes da transformação da sua vida?
Cresci no Rio de Janeiro. Quando tinha 17 anos, meu pai, que tinha empresas e indústrias, faliu. Voltamos para o Nordeste, onde ele nasceu. Foram 13 anos de muitas dificuldades. Meu primeiro casamento acabou e fui morar na casa de familiares, em Fortaleza. Faltava dinheiro para o básico. Não tinha recursos nem para comer ou dar ração para o cachorro. Havia um parente que, quando ouvia o barulho de talheres, na cozinha, corria e dizia: ;Tá com fome, né?;, tentando me envergonhar e me constranger. Por causa disso, eu comia pouco. Cheguei a emagrecer 10 quilos.

Quando a mudança radical na sua trajetória aconteceu?
Uma semana após ler o livro do Roberto Shinyashiki, eu e uma amiga sofremos um acidente de carro. Ficamos presos na ferragem e as pessoas não ajudavam porque tinham medo de o carro explodir, já que vazava combustível. Depois daquele dia, foi como se eu renascesse. Dali em diante, meu comportamento mudou. Passei a assumir minha responsabilidade. Estudei, abri uma empresa de consultoria comercial e, um ano depois, tinha carro, casa, estava noivo e ganhava bastante bem.

Como decidiu que o coaching seria sua atividade profissional?
Sou engenheiro, mas nunca exerci a profissão. Eu passei a gostar das ciências humanas. Minha empresa estava prosperando e fiz uma pós-graduação em gestão de pessoas, em 1999. Amei aquilo. Um dia, um cliente disse que gostaria de fazer coaching comigo. Eu nem sabia o que era isso. Fiz um curso de formação na área em São Paulo, voltei e fiz a primeira sessão com o americano Daniel Goleman, considerado o pai da inteligência emocional, que ministrou as aulas. Vi como a vida dele mudou drasticamente com a técnica. Em 2003, decidi parar de trabalhar com empresas para lidar com pessoas. Foi uma transição difícil, persisti.

Qual é o foco do livro Poder e alta performance?
É a minha história de vida, mas contada de maneira técnica. Quais foram os métodos que eu usei para sair de um fracasso de 13 anos e ser abundante em todas as áreas? Escrevi para todas as pessoas que acreditam, dentro de si, que podem ser mais na vida. Não importa se elas estão no fundo do poço ou em um céu de brigadeiro. Eu mostro um caminho científico, técnico e acessível para que elas mudem.

Segundo sua nova obra, o poder e a alta performance têm uma fórmula básica: conhecimento %2b emoções inteligentes ação focada. Como alcançar o equilíbrio entre esses fatores?
Eu tenho um pressuposto: estamos aqui para ter uma vida muito boa. Temos recursos internos, cognitivos e emocionais para termos uma vida extraordinária. Eu e meus clientes somos prova disso. Muitos buscam ter a cognição, a razão inteligente. Fazem curso, leem livros, montam currículo, mas param nisso e se esquecem de que todo o resultado passa pelas emoções. Não dá para ter sucesso sem estar bem consigo e com as pessoas ao seu redor. Tornar minhas emoções inteligentes é agir com empatia com o próximo, ter autoconfiança, autocontrole, sair da zona de conforto.

O que a sua técnica, chamada de método CIS, tem de diferente do tradicional?
É uma metodologia para não apenas explicar, mas para fornecer inteligência emocional para as pessoas. Não adianta ter um balde cheio de conhecimento cognitivo, se a vazão da torneira, que é a inteligência emocional, é pequena. Alguém limitado, com um ;balde cognitivo; não tão grande, mas com estrutura emocional extraordinária, é mais capaz, por vezes, de alcançar o sucesso. Por exemplo: o João tem um currículo cheio, leu 50 livros, tem duas graduações, três MBAs, doutorado, fala três línguas, mas não tem sucesso. Isso é comum. A questão é que para esse balde cognitivo gigante ser manifesto, é preciso passar por uma torneira, que é a inteligência emocional. Do que adianta ter todo esse conhecimento, se a vazão é pequena? Já o balde de cognição do Lucas é pequeno, é alguém que fala português com alguns erros, acabou o ensino médio apenas, mas a estrutura emocional dele é extraordinária, por ser otimista, autoconfiante, empático, se conectando com pessoas. A partir dessas conexões, ele alcança o sucesso.

Não adianta ter um ótimo currículo se o profissional não tiver autocontrole?
Cada vez mais, o mundo empresarial está desconectado do currículo formal das pessoas. O que os líderes querem saber é qual o conhecimento aplicado, quais resultados a pessoa gerou, a competência comprovada e qual a capacidade de trabalhar em equipe.

Parte do que se entende por alta performance no seu livro envolve nunca se ver no ápice. Ou seja, sempre há algo a melhorar em cada área da vida?

Eu posso estar nota nove, 10, mas não posso dizer que não poderia ficar ainda melhor. A busca é para ter nove ou 10 em todas as áreas. ;Sorte no jogo, azar no amor; é um mito. Essa frase mentirosa diz que nós não conseguimos ser felizes em tudo. Não é verdade. Podemos ser plenos em todas as áreas da vida. Não quer dizer ter uma vida perfeita, mas ser feliz nos relacionamentos, na gestão do dinheiro, na saúde.

Um dos temas do livro é a autorresponsabilidade. Achar que os problemas são culpa dos
outros e não de si mesmo é um mal do presente?

Isso vem desde Adão e Eva. Quando Deus questiona se eles comeram a fruta, Adão diz: ;Eu comi essa fruta porque a mulher que tu pusestes no paraíso me deu de comer. A culpa é tua;. Eva põe a culpa na serpente que Deus havia criado. Nenhum deles assumiu as falhas e a autorresponsabilidade. Todos imputaram a culpa a outro.

*Estagiário sob a supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa