Carreiras em crescimento
A revolução tecnológica condena determinadas profissões à extinção, mas alavanca outras ao estrelato. Se você é piloto de drone ; como Everton (foto) ;, analista de big data ou cientista da computação, por exemplo, saiba que seu campo de atuação deve se tornar ainda mais promissor nos próximos anos
À medida que algumas formas de produzir renda se tornam obsoletas graças ao desenvolvimento tecnológico, outras, pelo contrário, despontam. Trabalhos que se baseiam em processos repetitivos e previsíveis têm alta probabilidade de passarem a ser executados por computadores. A indústria 4.0 requer pessoal capacitado para operar, compreender e desenvolver softwares e hardwares modernos, além de contemplar diferentes tarefas. Entretanto, em um mundo repleto de computadores cumprindo todo tipo de encargo, as habilidades mais intrínsecas aos seres humanos, como empatia, tendem a ser ainda mais requisitadas. As funções que dependem de intervenção da relação humana, com baixa expectativa de robotização, devem permanecer; ao passo que atividades mecânicas, como as de quem confecciona e costura roupas, se tornarão cada vez menos comuns. Designers de moda, entretanto, utilizam-se de atributo ainda longe de ser alcançado por máquinas: a criatividade.
Os professores Carl Benedikt Frey e Michael Osborne, da Universidade de Oxford, elaboraram, em 2013, um estudo encomendado pelo Citigroup intitulado The future of employment: how susceptible are jobs to computerisation? (O futuro do emprego: quão suscetíveis são os postos de trabalho à informatização?, em tradução livre). Os britânicos apontam qualidades desejáveis aos profissionais do futuro. Entre as aptidões importantes que robôs não conseguem reproduzir, estão: interação social (na hora de negociar), adaptação (uma vez que as máquinas ainda não se ajustam bem a ambientes irregulares) e criatividade (que abrange campo amplo, como criação de conceitos, poemas, músicas, teorias, receitas culinárias, piadas). Neste último quesito, o Brasil leva vantagem, acredita João Lacerda, diretor da escola de programação Mind Makers.
Ele chama a atenção para a necessidade de as empresas investirem em tecnologia e, assim, acompanharem o ritmo da nova indústria. ;A criatividade brasileira é reconhecida no mundo inteiro, mas os negócios daqui precisam repensar o trabalho. Lá fora, apostam pesadamente em inteligência artificial. Quem se mantiver preso ao formato antigo ruirá;, comenta ele, ao citar a companhia Kodak como exemplo de organização que não seguiu os avanços tecnológicos e acabou por falir em 2012. A atualização é mandatória tanto para organizações quanto para pessoas. ;Para manter seu lugar no mercado, o profissional precisa se diferenciar.; Segundo Lacerda, é interessante adquirir perícia em mais de uma área. ;As profissões que serão criadas tendem a exigir múltiplas habilidades e conhecimentos. Quanto mais diversas forem as especializações do profissional, mais ele se destacará;, diz.
[SAIBAMAIS]A tecnologia será ;requisito consensual; na hora de empregar. ;Robotização é tendência e o que está por trás do robô é o engenheiro;, observa. ;Toda a parte de engenharia ligada à automação aumentará e será ainda mais valorizada nos próximos anos, especialmente para quem tiver capacidade de interligar inteligência artificial a outras áreas de conhecimento;, analisa Esther Luna Colombini, professora do Instituto de Computação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e membro da Sociedade Brasileira de Computação (SBC), com pós-doutorado em engenharia da computação pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Ela explica que ;a natureza dessas atividades é multidisciplinar, então engenheiros associados à automação acabam tomando emprestado muitos conhecimentos da psicologia, da neurociência, da medicina...;
Vítor Duarte está se adaptando bem para as exigências do mercado. Desde pequeno, é curioso. O brasiliense desmontava objetos para desvendar o conteúdo deles. ;Eu queria entendê-los;, explica. Por volta dos 14 anos, descobriu a engenharia mecatrônica e passou a cobiçá-la. Hoje, aos 21, está no décimo semestre do curso na Universidade de Brasília (UnB). Profissionais desta área projetam, constroem e aperfeiçoam aparelhos mecânicos e automatizados para a indústria. ;Conheci muito sobre machine learning (aprendizado de máquinas, em tradução livre), área em que vou me apoiar para meu trabalho de conclusão de curso;, conta .
Áreas para apostar
Confira algumas das profissões que podem ser impulsionadas pelo desenvolvimento tecnológico
Drones em alta
A lista de tarefas que drones podem cumprir é extensa: combate a incêndios, salvamento aquático, investigação em cena de crime, mapeamento, cinegrafia, inspeção... As projeções para usos futuros das pequenas aeronaves são as mais diversas. Desde entrega de encomendas, cartas e pizzas até assistência médica, com desfibriladores que voam em direção a vítimas de ataque cardíaco. O termo ;drone;, de origem inglesa, significa zangão, em função do som emitido pelas hélices do objeto. Outro nome que o designa é veículo aéreo não tripulado (Vant).
Esses equipamentos deixaram de ser apenas ferramenta bélica do governo estadunidense e passaram a sobrevoar o mercado de trabalho. Por isso, a profissão de piloto de drone tem ganhado destaque. Para o engenheiro da computação Everton Oliveira, 40 anos, emprego e paixão se misturam. Ele era funcionário público e chegou a trabalhar com helicópteros de aeromodelo em 2010. No mesmo ano, começaram a aparecer os primeiros drones no Brasil, os quadricópteros. ;Foi amor à primeira vista.; Hoje ele é dono da Multidrones, empresas de filmagens aéreas, venda de equipamento e treinamentos voltados às aeronaves de controle remoto.
Segundo Everton, a remuneração mensal desses profissionais (em geral, freelancers) costuma variar entre R$ 2 mil e R$ 9 mil. Para quem deseja seguir a carreira, ele sugere a aquisição de equipamento próprio para viabilizar treinamento contínuo. A maioria das escolas fornece o Vant durante o período de aprendizagem, que varia entre três e seis meses. ;A pessoa tem que ter boa noção espacial e de distância;, afirma o empreendedor. Ele acredita que os praticantes de jogos eletrônicos costumam ter mais traquejo para operar drones. ;Isso porque a musculatura dos braços e os reflexos mentais estão mais treinados. Quem joga videogame acaba absorvendo conhecimentos para pilotagem mais rapidamente.; Um drone custa entre R$ 5 mil e R$ 150 mil.
Dados, dados e mais dados
Já ouviu falar em big data? O termo cunhado para designar grande volume de dados está por todo lugar. Não é à toa. Segundo pesquisa elaborada pela consultoria de tecnologia da informação IDC (International Data Corporation), o universo digital dobra a cada dois anos. A progressão geométrica de informações criadas pela humanidade vem de inúmeras fontes, que incluem áudio, texto, e-mail, vídeo, cotações da bolsa, transações financeiras e o que mais você conseguir imaginar na tela do computador. ;É necessário tirar valor dos dados e não simplesmente deixá-los armazenados para consultas pontuais, gerando inteligência com base neles;, observa Sérgio Zaccarelli, especialista em big data na multinacional de software SAS, formado em engenharia da computação pela Unicamp. O campo é cada vez mais atrativo no mercado de trabalho.
Os cientistas da área coletam grandes bancos de informação e os lapidam utilizando linguagens de programação, extraindo informações importantes em formato palatável. Padrões de negócios podem contribuir com estratégias empresariais.
O profissional desse campo poderá passear por diversas zonas de perícia. ;A base acadêmica é muito importante, normalmente ligada a área de exatas, mas todo conhecimento a ser adquirido está diretamente relacionado ao tipo de negócio em que a pessoa desenvolve a análise de dados;, explica Zaccarelli. ;É importante ter capacidade de aprender rapidamente e habilidade comunicativa para poder extrair o que é relevante. Além da base matemática e computacional, é importante conhecer bem o mercado para atrair mais vendas ou reduzir custos tendo a análise como referência;, completa. Ele cita as graduações em matemática, ciências da computação, engenharias e estatística como boas opções para quem deseja se tornar gestor de big data. A última, salienta Zaccarelli, é a mais adequada a quem aspira ao cargo, cuja média salarial é de R$ 10.689, segundo o site Love Mondays. ;A faculdade de estatística é a que mais prepara, aborda os dados de modo mais prático;, diz.
ÁREAS PARA APOSTAR ;
Eu desenvolvo inteligência artificial
A ciência da computação é outro campo que se encaixa bem nas exigências do futuro por contemplar o desenvolvimento de inteligências artificiais no currículo, acredita Isaac Roitman, coordenador do Núcleo de Estudos do Futuro (n-FUTUROS) da UnB e doutor em microbiologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Conhecimentos múltiplos são requisitos para especialistas deste ramo, uma vez que esses devem se adaptar à área de conhecimento na qual aplicarão a computação, seja ela biologia, administração, economia, seja qualquer outra. Hugo Honda, 24 anos, cursa o 10; semestre de ciência da computação na UnB e trabalha como desenvolvedor na startup Legal Labs, empresa responsável por criar uma advogada virtual (inteligência artificial que faz gestão de processos jurídicos e peticionamento automático), chamada doutora Luzia. As noções que adquiriu em direito em pesquisas para elaborar a ferramenta foram fundamentais para escrever o código da solução.
Hugo fazia engenharia da computação, mas não estava satisfeito com o leque de opções que o curso abria (cujo foco está na produção de equipamentos eletrônicos). Resolveu mudar para uma carreira que ;via como expoente;, sob incentivo de familiares. ;Transferi para ciência da computação para não ficar preso a um setor específico. Vejo a programação não como fim, mas como ferramenta que permite trabalhar em quase qualquer campo;, justifica. ;Algumas áreas passam por crise, mas não acredito que a computação passará por uma. O programador também não vai ficar longe de ser reinventado, mas acho a possibilidade de ser flexível e poder se adaptar muito atrativa;, comenta Hugo. Para ele, a essência dessa flexibilidade está no domínio de uma linguagem de programação. ;Você tem um dialeto para desenvolver todo tipo de coisa. Com ele, é possível ;conversar; sobre tudo. Se uma linguagem computacional não der certo, posso aprender uma nova;, completa o jovem, que já foi analista de dados no Laboratório de Neurociência e Comportamento do Instituto de Biologia da UnB.
Seriam os androids artistas?
Um robô escritor desenvolvido por cientistas da Universidade do Futuro (Hakodate, Japão) produziu um conto que chegou a ser selecionado em concurso de literatura. O texto elaborado pelo software teve palavras e frases pré-selecionadas por programadores, assim como um tema geral. Outra invenção curiosa feita pela ING (Internationale Nederlanden Group), em parceria com a Microsoft em 2016, foi o The next Rembrandt (O novo Rembrandt, em tradução livre), capaz de assimilar traços e outros padrões do famoso pintor e replicá-los no que seria uma nova obra do artista. O mundo musical não passa impune. Vários modelos de programas computacionais capazes de ;compor; vêm sendo criados. O projeto Magenta do Google, também de 2016, foi capaz de, similarmente, construir inteligência artificial que compõe músicas rudimentares de até 90 segundos. O Instituto de Tecnologia da Geórgia (EUA) criou, em 2017, o Shimon, robô que combina influências musicais diversas e produz um som inédito ; capaz até de improvisar.
O que está por trás
Isso significa que escritores, pintores e músicos estão ameaçados por tecnologias como essas? Longe disso. Máquinas criativas não estão no horizonte de projeção dos cientistas ; ainda. ;Esses softwares existentes são baseados nos modelos que a gente tem sobre obras de grandes artistas. Ainda tem muita força humana nesse processo. Vamos demorar para chegar ao ponto de produzir máquinas imaginativas, se a gente chegar;, explica Esther Luna Colombini. ;Não é o computador que está se programando. Nada mais são do que comandos. Sempre tem lá o engenheiro de computador que programou aquilo e está instruindo o software para fazer algo;, diz Fernando Iazzeta, professor de música e tecnologia da Universidade de São Paulo (USP) e pós-doutor em música e tecnologia pela mesma universidade. Além disso, segundo ele, ;o grande barato de ouvir música é quando alguém compõe.;
*Estagiário sob a supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa