;Sempre achei que os estudos seriam a chave e a saída que dariam um futuro melhor para toda a minha família;, diz Roberto Augusto Brito Alves, 17 anos, aprovado em direito na Universidade de Brasília (UnB) pelo Programa de Avaliação Seriada (PAS). O resultado da seleção foi divulgado na última sexta-feira (26) e Roberto teve a alegria de ver seu nome na lista de selecionados. Caçula entre três irmãos, ele é o primeiro da família a acessar o ensino superior e está em êxtase com a notícia. Por isso, ele fez um post no Twitter, que teve enorme repercussão na internet: foram mais de 38 mil curtidas e mais de 5 mil compartilhamentos, muitos de estudantes parabenizando-o pela conquista. ;Quando eu soube do resultado, contei para a minha mãe e nos abraçamos e choramos. A ficha ainda não caiu, estou vivendo um sonho meu e da minha família", revela. "Eu não esperava passar", admite.
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De fala calma e articulada, o jovem, filho de uma diarista e de um encarregado em serviços gerais, conta que cresceu em meio à violência e às poucas oportunidades existentes onde mora, em Santa Maria. Na escola, desde a segunda série, sofria preconceito por causa da cor da pele. ;O que mais me impressiona é que muitas eram pessoas que passavam por condições semelhantes a minha;, relata. As dificuldades não serviram como desculpas para Roberto e ele, motivado pelos pais, buscou na educação a reviravolta para as condições impostas pela vida. ;Tanto minha mãe quanto meu pai, embora não tenham concluído o ensino fundamental, desde que eu era pequeno, mostraram que a única saída é a educação, buscar o conhecimento.;
Sem condições de pagar um cursinho, o ex-aluno do Centro de Ensino Médio (CEM) 404 em Santa Maria, teve algumas oportunidades de bolsa, mas nunca as agarrou, pois isso representaria dificuldades. ;Por não serem integrais, se eu fosse pagar, certamente faltaria algo em casa;, conta. O rapaz dedicava quatro horas por dia aos estudos e frequentava a biblioteca da escola para se preparar para o vestibular.
O incentivo dos pais era o combustível para que ele alcançasse o objetivo de ser defensor público, traçado ainda aos 13 anos de idade. A criminalidade e as influências, contudo, quase fizeram com que Roberto se desviasse para um caminho comum a parte dos amigos e conhecidos. ;Tive breves envolvimentos com usuários de drogas, problemas na rua, rixa com outras pessoas, mas isso serviu de lição e me motivou a chegar aqui.;
A luta contra as desigualdades e contra o preconceito racial fizeram parte da vida do jovem desde o ensino fundamental, com a participação em movimentos estudantis e manifestações nas redes sociais. Por isso, o desejo de se tornar defensor público surgiu não apenas com o objetivo de melhorar as condições financeiras da família, mas de ajudar outras pessoas que vivem em situações precárias. ;A minha maior motivação é tentar minimizar as injustiças e buscar ser a voz daqueles que são silenciados na sociedade. Essa vitória que eu conquistei não é só minha, é da família, de todo o meu convívio;, orgulha-se.
Além dos pais e dos professores, se tornaram referências para Roberto outras personalidades. ;Negros como João Cândido, Almirante Negro, Martin Luther King, Malcon X, Angela Davis foram importantes para mim. Busquei na história deles força para impulsionar minha carreira e estudos;, conta. Houve um momento em que Roberto pensou em desistir da busca pelo ensino superior, em 2015, quando perdeu a primeira etapa do PAS e se viu em desvantagem quase irrecuperável perante os concorrentes. ;Tinha me preparado o ano inteiro e, quando foram abertas as inscrições, corri atrás de toda a documentação para enviar, mas o prazo apertou e não consegui enviar tudo;, lamenta. Graças ao esforço, ele conseguiu boa pontuação: 15,2 pontos na segunda etapa e 44,6 pontos na terceira etapa. Roberto passou por cotas para alunos de escolas públicas para pretos, pardos e indígenas com renda familiar de até 1,5 salário mínimo.
O apoio da escola foi fundamental para que ele não desistisse. ;O curso que eu queria era concorrido e, como as outras pessoas, teriam três notas e eu apenas duas, pensei que não daria para recuperar. Meus professores me incentivaram a correr atrás e a acreditar. Eu me dediquei bastante para chegar aonde cheguei;, lembra. A conquista da vaga na UnB tornou Roberto numa figura inspiradora perante colegas e outros jovens da periferia. ;O que eu posso dizer para pessoas nas mesmas condições é: não desistam. Obviamente existirão obstáculos, palavras negativas e pessoas que não acreditam no seu sonho, mas se você tiver foco e perseverança no objetivo e buscar o conhecimento, vendo a educação como fator de mudança social, com certeza, alcançará o que deseja;, ensina.
*Estagiário sob a supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa