O sonho de passar em um concurso pode se tornar um pesadelo para aprovados que não chegam a ser nomeados. É essa novela que os classificados no concurso do Instituto de Defesa do Consumidor do Distrito Federal (Procon/DF) de 2011 vivem até hoje. Mais de 100 mil concurseiros fizeram as provas organizadas pelo Instituto Americano de Desenvolvimento (Iades) em novembro daquele ano de olho nas 200 vagas efetivas e no cadastro de reserva.
O edital, de agosto de 2011, oferecia 60 chances para nível médio ; no cargo de técnico de defesa do consumidor com salário de R$ 3.919,13 ; e 140 para superior ; nos postos de fiscal de defesa do consumidor (60) e analista de atividades de defesa do consumidor (80) com remuneração de R$ 5.293. O resultado do certame foi divulgado em março de 2012 com 720 aprovados para analista, 490 para fiscal e 13.647 para técnico. O documento valia por dois anos e foi prorrogado por igual período, enquanto o órgão continuou a nomear comissionados. Segundo o Procon/DF, atualmente a casa conta com 141 servidores, dos quais 70 são efetivos da carreira da organização, 59 não têm vínculo com a administração pública (comissionados) e 12 são cedidos de outras instituições públicas.
Minha história
A indignação acompanha o dia a dia de Mário Augusto Latino, 28 anos, aprovado em 45; lugar para o cargo de fiscal de defesa do consumidor, para o qual foram abertas 60 oportunidades. ;Sinto enjoo ao saber que passar dentro das vagas e esperar quatro anos não é suficiente para ser nomeado;, lamenta. Graduado em ciências biológicas, ele atua como fotógrafo autônomo. ;Não ganho nem perto do salário do cargo.;
Classificada na 77; posição no posto de técnico em atividades de defesa do consumidor, que também ofereceu 60 vagas, Ana Paula Lima, 31, espera ser convocada e, assim, voltar ao mercado de trabalho. Quando fez o exame público, ela era secretária, mas, hoje, está desempregada. ;É um absurdo saber que existem comissionados exercendo nossa função;, indigna-se.
Caminhos na Justiça
O Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) investiga indícios de ilegalidades na seleção do Procon/DF por meio do processo n; 9947/2012. Em 16 de fevereiro, por meio da decisão n; 392/2016, o TCDF determinou a suspensão do prazo de validade do concurso para garantir o direito dos aprovados, até o cumprimento da decisão n; 6.240/2014, que determinou a substituição de 66 servidores comissionados por candidatos aprovados, ou até a nomeação de todos os candidatos aprovados dentro das vagas abertas no edital. O documento deste ano também exige que o Procon/DF encaminhe informações sobre as medidas adotadas para cumprir a decisão em até 90 dias.
Depois de analisar os resultados de uma inspeção feita pelo corpo técnico do TCDF, foi demonstrado que comissionados ocupam cargos de assessor técnico dos núcleos de atendimento e não têm funções de direção, chefia ou assessoramento, conforme seria o correto segundo a Lei Orgânica do DF.
;O Procon/DF trouxe claros prejuízos tanto aos candidatos aprovados no concurso público, uma vez que tiveram seu direito subjetivo à nomeação tolhido pela Administração, quanto à sociedade, mais uma vez prejudicada com o não cumprimento da missão/objetivos da entidade, voltados ao interesse público, ao privar a clientela de uma atuação célere, eficiente e eficaz;, observou trecho da decisão. No mesmo processo aberto em 2012, o Tribunal de Contas do DF apura outros indícios de ilegalidades no Procon/DF, entre elas, desvio de função de servidores, assédio moral e supressão de informações em documentos enviados aos órgãos de controle para esconder erros. Em nota, o Procon/DF informou que prestará todos os esclarecimentos dentro do prazo estabelecido pelo TCDF.
Esta não foi a primeira vez que esperanças foram dadas aos aprovados: em 27 de janeiro, a Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos do Consumidor do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (Prodecon / MPDFT) enviou ao governador Rodrigo Rollemberg uma recomendação para garantir a nomeação de todos os aprovados. Em 2012, após processo para apuração de nomeação de comissionados, o TCDF exigiu ao Procon/DF e à Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania que substituíssem os servidores sem vínculo com a administração pública que não exerciam funções de direção, chefia ou assessoramento no órgão, dando posse aos aprovados. No mesmo ano, a Defensoria Pública do Distrito Federal e Territórios interpôs ação civil pública para que o GDF se abstivesse de contratar servidores comissionados para o Procon/DF até a nomeação de todos os classificados no concurso.
Caso semelhante
Em 11 de março, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) garantiu a nomeação de uma candidata aprovada dentro do número de vagas em concurso para enfermeiros da Secretaria de Saúde do DF (edital n; 6/2011) por meio de mandado de segurança. O concurso tinha prazo de validade de dois anos e foi prorrogado por mais dois. Na decisão, o relator citou jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do TJDFT afirmando que ;a aprovação de candidatos a concurso público dentro do número de vagas se traduz em direito líquido e certo à nomeação;.
Palavra de especialista
O que dá para fazer?
Quem passou dentro das vagas do concurso do Procon pode entrar com um mandado de segurança ou uma ação ordinária já qua a validade do concurso foi suspensa. O primeiro é um processo mais rápido, precisa de provas pré-constituídas e não tem audiência. Já na ação ordinária, o candidato teria que produzir provas em audiência e levar testemunhas. Enquanto está suspenso, o direito dos aprovados às vagas fica reservado.
Júlio César Tolentino, advogado da área trabalhista