Com o tema ;Enem: o caminho mais democrático para o ensino superior;, o Ministério da Educação (MEC) ilustra a campanha da edição 2012 do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). No site da pasta, o banner eletrônico com esses dizeres chama atenção de quem navega. Apesar de utilizar o slogan inclusivo, o governo federal não garante uma avaliação igual para todos, a começar pela inscrição no teste.
Por falta de ferramentas de acessibilidade, um deficiente visual não consegue, por exemplo, nem sequer passar da primeira página no site do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). O Correio acompanhou a tentativa de dois estudantes cegos de se registrarem no sistema. Ambos só conseguiram preencher o formulário com a ajuda de uma pessoa que enxerga. De acordo com balanço parcial, divulgado na terça-feira pelo MEC, 1.849 candidatos pediram auxílio de um ledor no dia do exame, 203 solicitaram prova em braile, 1.846 requisitaram assistência para deficit de atenção e dislexia e 1.103 pediram intérprete em língua brasileira de sinais (libras). As inscrições terminam amanhã.
Paulo Lafaiete, 26 anos, pretende fazer o Enem pela segunda vez. O jovem passou na prova de 2010 e, atualmente, cursa o quinto semestre de publicidade em instituição particular. Ainda assim, ele deseja ingressar em uma universidade federal. Para garantir a participação no teste, Paulo precisou enfrentar as dificuldades do site do Inep mais uma vez. Nem mesmo com o auxílio de um moderno sistema de leitura de tela para cegos ; um programa desenvolvido pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ);, conseguiu ter acesso ao conteúdo.
Quando fez o exame em 2010, ele lembra que também não conseguiu acessar a página para visualizar o gabarito e a nota final. O universitário afirma que não recebeu o auxílio esperado ao entrar em contato com a Central de Atendimento do Inep. ;Eles não sabiam resolver minha dúvida e falaram apenas: ;você precisa seguir o passo a passo do site;. Eu expliquei que era deficiente visual;, destaca. De acordo com o MEC, todos os atendentes são capacitados para resolver esse tipo de demanda.
O problema enfrentado por Paulo é uma amostra clara do descumprimento da legislação brasileira, que obriga a administração pública a dotar as páginas oficiais de ferramentas que garantam a acessibilidade de todos. No entanto, apenas cerca de 5% dos endereços do governo federal oferecem esses recursos. O MEC reconhece que a página não possui acessibilidade e informa que o candidato deve recorrer a uma pessoa de confiança para fazer a inscrição. ;O site não avança. Eu clico nas opções, mas não saio da primeira página;, reclama Paulo.
Auxílio
Avessa a computadores, Maria das Graças Ferreira de Morais, 20 anos, preferiu não se aventurar. Como não sabe mexer no programa, pediu ajuda de um monitor do Centro de Ensino Médio do Setor Leste, onde estuda. O colégio atende alunos do ensino médio regular e com deficiências. A professora da sala de recursos multifuncionais da unidade, Cristina Negry, conta que é comum estudantes e até mesmo ex-alunos recorrerem ao auxílio da instituição.
Para Amaralina Miranda de Souza, professora da área de educação especial e inclusiva da Universidade de Brasília (UnB), o fato de o governo federal não oferecer um site acessível é um erro grave. ;Quando se trata de uma coisa pública é ainda mais sério. A tecnologia já avançou bastante e oferece recursos para a inclusão. O problema é a falta de tomada de decisão das pessoas responsáveis. Com isso, o candidato fica impedido até mesmo de tentar;, critica a especialista. Na avaliação da docente, o Brasil oferece uma das legislações mais avançadas na área, mas ainda é grande a distância entre o que determina a norma e o que acontece na prática.
R$ 24 milhões
Valor gasto em 2011 com o atendimento especial no Enem
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