;Passar não é um bicho de sete cabeças como as pessoas dizem. Não é tudo isso: basta ter dedicação, insistir, ter perseverança. É chegar em casa e estudar mesmo;, indica. Um dos seus lemas vêm da Canção do Tamoio, de Antônio Gonçalves Dias, que diz que viver é lutar: ;A vida é combate, que os fracos abate, que os fortes, os bravo só pode exaltar.;
O que ajudou na aprovação também foi o hábito de buscar conhecimento. ;Se eu via livros e cadernos jogados por aí, eu pegava e lia. Tentava resolver os exercícios. Nunca me deixei enferrujar e também já trazia um embasamento do meu passado;, analisa. Desde os tempos de escola, José Mario, ou Maranhão como é conhecido na rua, tem facilidade e gosto por geografia, história, química, física e matemática.
[SAIBAMAIS];Eu gosto muito dessa área que o curso envolve. Também tem a ver com a natureza;, esclarece. A maior dificuldade foi na redação, em que obteve nota 5 no vestibular. ;Em São Luís, aprendi o sistema de redação narrativo, mas, nas provas, é cobrado o texto dissertativo. Tive que aprender a dissertar e a ter coerência e coesão;, lembra.
Uma mãozinha
A chance oferecida logo deu resultados e, em dezembro de 2013, José Mario apareceu entre os aprovados para o curso de geografia no vestibular da Universidade Estadual de Goiás (UEG). ;Fui aprovado, mas não classificado, mas foi por pouco. Meu déficit em português fez com que meu desempenho em redação não fosse bom;, lembra. ;Quando os professores do cursinho viram que eu estava levando a sério, resolveram me dar bolsa por mais tempo. Estudei, então, até o vestibular;, disse.
A professora de geografia Aracelly Castro foi uma das grandes incentivadoras de José Mario. ;No início, ele estava mais inseguro, achava que não ia passar e pensou em desistir. Muita gente o estimulou a ficar. Ele é um aluno muito participativo e não volta para casa com dúvidas;, afirma a professora.
Para as colegas de cursinho Flávia Magalhães, 24 anos, e Marilda Rodrigues, 20, o vigia de carros é uma inspiração. ;Ele é um guerreiro e uma motivação para os outros alunos;, afirma Flávia. ;Ele é um exemplo e mostra que é possível conciliar trabalho e estudos. Ele não tem vergonha de errar e vai atrás do que quer;, finaliza Marilda.
Sonho de integração
Para Maranhão, a aprovação no vestibular significa um novo começo. ;Eu queria me reintegrar à sociedade ou por meio do vestibular ou por meio de um concurso público. Não estou cheio de glamour, mas estou satisfeito. Tenho a sensação de dever cumprido;, comemora. ;Fui a uma igreja evangélica uma vez, e o pastor disse que Deus estava preparando uma universidade para mim. Eu acreditei naquilo piamente. Acreditei, estudei e passei;, conta.
Segundo Maranhão, chegar ao ensino superior é algo que ele deveria ter feito há mais tempo. ;Minha irmã, tias, todo mundo da minha família tem nível superior. O meu problema foi que, muito cedo, eu arrumei mulher e filha e fui trabalhar para sustentar a família. Assim, deixei os estudos para trás;.
Pai de quatro filhas com quem não têm contato há anos, veio tentar a vida em Brasília, há nove anos, depois de terminar um casamento que durou 13 anos. ;Minha irmã mora no DF, mas não me queria na casa dela. Fui para a rua. Depois, fui trabalhando e melhorando, até conseguir morar de aluguel. Agora, estou morando na casa de uma tia. Isso me deu tranquilidade - e menos despesas - para estudar para o vestibular;, disse.
Segundo José Mario, o faturamento como flanelinha era maior antes de ter de conciliar estudo e trabalho. ;Depois que passei a estudar no cursinho, passei a tirar de R$ 800 a R$ mil por mês. Até as pessoas reclamavam que não me achavam mais porque eu estava estudando.; Como aluno da UnB, José Mario pretende deixar de vigiar carros. ;Conversei com o diretor do câmpus da UnB Planaltina para saber dos benefícios que eu poderia ter. Posso ter auxílio-alimentação, auxílio-moradia; Vou ir atrás de tudo isso para não ter que vigiar nem lavar carro. UnB é casamento: tenho que me dedicar a ela por inteiro;, brinca.
Entre os planos do calouro para o período de curso está abrir uma roda de capoeira na UnB. ;Sempre gostei muito e sou mestre de capoeira. No câmpus Darcy Ribeiro já tem um grupo, mas em Planaltina não. Quero passar a dar aulas lá e tirar algum dinheiro para viver;, planeja. Outra meta é continuar estudando, agora, para outro vestibular. ;Vou fazer o curso de gestão ambiental e ficar estudando para passar, pelo Enem, para comunicação social ou direito;.