Com Bianca, 8 anos, e Lucas, 4, Catiuscia Costa conta que colocou o caçula na escola por considerar a idade certa |
Temas presentes nos programas de governo de todos os candidatos à Presidência foram detalhados ontem nos indicadores da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O levantamento mostra os principais desafios na área social do próximo presidente. Na educação, embora o analfabetismo tenha caído 8,6% para 8,3%, de 2012 para 2013, ainda existem no Brasil 13 milhões de pessoas que não sabem ler nem escrever. Entre crianças de 4 e 5 anos, cresceu a taxa de escolarização de 78,1% para 81,2% ; o maior salto dentro dos grupos etários analisados. Mas a proporção recorde de matrículas está na parcela de crianças de 6 a 14 anos (98,4%), faixa de idade que corresponde ao ensino fundamental.
A gerente da Pnad, Maria Lúcia Vieira, relaciona as maiores taxas de escolarização para crianças de 4 a 5 anos à necessidade imposta pelo mercado de trabalho às mães. ;No Sudeste, onde há a maior taxa, temos os níveis de ocupação mais elevados, inclusive entre a população feminina, que tem de deixar o filho na escola. Então, essa inserção influencia na taxa de escolarização;, diz. A Pnad mostrou que, do total de pessoas que trabalham no país, 42,8% são mulheres.
Mãe em tempo integral, Catiuscia Costa, 38 anos, pode escolher ficar em casa com os filhos. Mas ela decidiu matricular o caçula Lucas, 4 anos, no Jardim de Infância 308 Sul, porque, para ela, essa é a idade certa para o ingresso de uma criança no sistema educacional. ;Respeito quem prefere colocar antes, por ter que trabalhar ou outra questão. Mas achei importante ele ficar comigo em casa até os 4 anos. Dei toda a orientação em casa, conforme o ritmo deles;, disse. A mais velha, Bianca, 8 anos, também começou a estudar com a mesma idade.
João Batista Oliveira, presidente do Instituto Alfa e Beto (IAB), que trata da alfabetização na primeira infância, diz ter ficado impressionado com o número de crianças que ingressaram nas escolas. Ao mesmo tempo, ele questiona a qualidade dos serviços oferecidos. ;O que preocupa é tanta gente entrar sem ter programa de formação de professores, sem a infraestrutura necessária para o colégio. É crescer sem os cuidados necessários;, analisa o especialista.
O ingresso mais cedo da crianças no colégio contrasta com o número de analfabetos: no total, 13 milhões de pessoas com 15 anos ou mais não sabem ler nem escrever, dos quais 7 milhões no Nordeste (53,6% do total). A maior parte tem mais de 60 anos. A Pnad mostrou também uma redução no trabalho infantil, que caiu de 12,3% de 2012 para 2013, passando de 3,1 milhões de trabalhadores de 5 a 17 anos para 2,6 milhões.
Envelhecimento
Outro dado apontado pela Pnad é o envelhecimento da população. A quantidade de brasileiros de 60 anos ou mais já representa 13% do total, ou 26,1 milhões de pessoas. Psicanalista e professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Júnia Vilhena acredita que o país não está preparado para a mudança do perfil demográfico. ;Tem a ver com o lugar que o velho ocupa na sociedade. Eles só são respeitados quando se tornam nicho de mercado;, afirmou. ;É preciso um projeto pedagógico, social, cultural, de valorização do velho.;
Entre as pessoas de 5 anos ou mais, 95,5% eram alfabetizadas no Distrito Federal em 2013. Mesmo entre a população de 60 anos ou mais, a taxa dos que sabem ler e escrever é alta: 87,8%. Em relação à frequência na escola, a proporção dos estudantes que acessam a rede privada (40%) é maior que a média nacional, de 23,5%. Nas fases de maternal e jardim de infância, o acesso aos serviços particulares é ainda mais elevado, de 51,38%, contra 27% na média brasileira.
O que preocupa é tanta gente entrar sem ter programa de formação de professores, sem a infraestrutura necessária para o colégio. É crescer sem os cuidados necessários
João Batista Oliveira, presidente do Instituto Alfa e Beto (IAB)
Quase 36% das casas sem esgoto
Os dados divulgados pelo IBGE também mostram que o acesso à água encanada cresceu entre os lares menos favorecidos. Se, em 2004, apenas 53,8% dos 5% mais pobres da população contavam com o serviço, em 2008 o número atingiu 61,8% dessas residências. Em 2013, chegou a 68,1%. Houve também avanços discretos em outros serviços: o acesso à coleta de lixo cresceu 1% e atingiu 89,8%, e o acesso à iluminação elétrica chegou a 99,6%. Em termos regionais, destacaram-se as regiões Centro Oeste, Norte e Sul, com aumentos de 7,1%, 8,3% e 8,4%, respectivamente. Entretanto, a Região Norte continua sendo a menos atendida do país, com apenas 19,3% das residências com acesso à rede de esgoto. No Sudeste, em comparação, a taxa é de 88,6%. A melhora nos serviços de água, esgoto e coleta de lixo tem forte relação com a qualidade de vida e com a saúde da população.
No Setor Habitacional Buritis, em Sobradinho II, os moradores sentem na pele as consequências da ausência da rede de esgoto. Mesmo com a regularização dos lotes, a infraestutura de saneamento no local é parca. Pavimentação e iluminação pública inexistem no bairro. ;A Caesb veio aqui e deixou a água certinha, mas o esgoto não funciona, não presta, corre água contaminada no meio da rua;, conta o morador Everaldo Rogues, de 50 anos. ;Minhas filhas passam dois dias na escola e cinco no hospital por causa desse esgoto a céu aberto;, lamenta. O morador Amilton da Cruz Melo enfrenta dificuldades para dar banho e cuidar dos seis filhos pequenos. ;Isso sem falar no mau cheiro que volta para dentro de casa;, observa ele. O Distrito Federal é a unidade da Federação com a maior cobertura relativa de rede de esgoto, com 87,9% dos domicílios atendidos.
Lentidão
O especialista destaca a aprovação do Plano Nacional de Saneamento Básico, o Plansab, como um avanço, mas enumera os entraves. ;As dificuldades persistem, sobretudo em relação ao investimento, que hoje está muito atrelado ao PAC, voltado sobretudo para obras. Não se trata somente disso. Há ainda pouca atenção e poucos recursos para medidas estruturantes, como capacitação, assistência técnica e regulação dos serviços de saneamento.;
As dificuldades persistem, sobretudo em relação ao investimento, que hoje está muito atrelado ao PAC, voltado sobretudo para obras. Não se trata somente disso. Há ainda pouca atenção e poucos recursos para medidas estruturantes, como capacitação, assistência técnica e regulação dos serviços de saneamento
Leo Heller, professor do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG