Sérgio Rodrigo Reis
postado em 12/08/2013 16:00
Publicação: 12/08/2013 04:00
Capuchinha (Trapaeolum majus L.) |
Batata-doce (Ipomea batatas (L.) Lam.) |
Araruta (Maranta arundinacea L.) |
Belo Horizonte ; A Organização das Nações Unidas (ONU) propôs, já há algum tempo, um tratado global sobre a necessidade de se resgatarem as formas alternativas de alimentação diante do aumento da população e da iminente falta de comida para todos. O Brasil se mobilizou em várias instâncias nos últimos anos, e os resultados já começam a aparecer de maneira mais concreta em programas como o que prevê o resgate da biodiversidade de hortaliças não convencionais no cotidiano da mesa da população. Em Minas Gerais, um programa chama a atenção não só como fonte alternativa de nutrientes saudáveis como também pelas possibilidades que oferece de se incrementarem os cardápios com novos ingredientes.
As receitas que têm aparecido com essa preocupação se destacam pela criatividade e pelos nomes inusitados: biscoito de araruta, fígado ao molho de vinho com purê de batatas com azedinhas, carne com cará-do-ar e o já popular frango com ora-pro-nóbis. Além do paladar agradável, as hortaliças não convencionais trazem outras vantagens: são fáceis de ser preparadas e contêm alto valor nutricional. Então, qual o motivo de desaparecerem do dia a dia dos pratos? A resposta, segundo os especialistas, está na dificuldade da produção em larga escala, pois, até então, não havia tecnologia e conhecimento disponíveis. Aí é que entrou a contribuição de pesquisas desenvolvidas pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig).
Com o objetivo de resgatar as características culturais e o cultivo de alimentos regionais, os técnicos da Epamig desenvolvem pesquisas e transferência de tecnologia para levar à mesa de um número cada vez maior de pessoas variedades pouco acessíveis de hortaliças. São alimentos que, até então, têm consumo regionalizado e que nascem de maneira aleatória nos quintais. A intenção é mudar a escala de produção e de cultivo com as ações desenvolvidas pelo projeto, batizado de Avaliação de Sistemas Orgânicos no Cultivo de Hortaliças Não Convencionais. A Epamig o desenvolve com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) na fazenda experimental Santa Rita, em Prudente de Morais, região centro-oeste do estado.
A pesquisa pretende avaliar o sistema orgânico de cultivo sem agrotóxicos, visando à produção de tecnologias para essas espécies. O objetivo é incentivar, ainda, a plantação de hortaliças por meio de práticas ecologicamente mais equilibradas, a fim de promover a sustentabilidade social, ambiental e econômica. O projeto também tem um caráter educativo. Com a correria da vida moderna, o que se vê é uma predisposição cada vez maior para uma alimentação mais industrializada. As exceções, quando ocorrem, são vistas em lares nos quais são comuns hortaliças bastante difundidas no prato do brasileiro. O que essa nova pesquisa pretende oferecer é uma gama enorme de novos ingredientes saudáveis e ricos em nutrientes capazes de incrementar e tornar as refeições muito mais deliciosas.
Taioba (Xanthosoma sagittifolium (L.) Schott) |
Fava (Phaseolus lunatus L.) |
Beldroega (Portulaca oleracea L.) |
Potencialidade
O projeto já criou 28 bancos comunitários de multiplicação e conservação de hortaliças não convencionais de diferentes espécimes em comunidades e fazendas experimentais da Epamig em São João del-Rei, Prudente de Morais e Oratórios. Lá, são produzidas mudas e sementes. A intenção é, pouco a pouco, trazer de volta os ingredientes para a mesa dos brasileiros.
Algumas das hortaliças, pelo menos para quem tem ligação com o campo, fazem parte da lembrança remota. É o caso da taioba e do ora-pro-nóbis. Mas há outras que são pouco conhecidas da maioria e cultivadas em regiões mais distantes dos grandes centros urbanos, como é o caso da araruta, da azedinha, do almeirão-de-árvore, do feijão-mangalô, do maxixe e do caruru. São hortaliças não muito fáceis de serem encontradas no comércio. O programa da Epamig quer, nos próximos anos, contribuir para reverter esse quadro.
A coordenadora da pesquisa é Marinalva Woods Pedrosa. Antes de tomar para si os créditos da iniciativa, faz questão de dar nome a importantes colaboradores. Segundo ela, as ações, de fato, começaram com o trabalho incansável do pesquisador de Brasília Nuno Madeira. Ele montou um viveiro no próprio quintal reunindo esse tipo de hortaliça. ;Fazia parte da sua vida consumi-las. Ele entrou em contato com a Emater em Minas por meio do técnico Georgeton Silveira e, assim, iniciou o desafio do resgate das plantas com a implantação do primeiro banco em Três Marias, na região central de Minas. A Embrapa entrou nesse momento no processo;, lembra. Hoje, já são mais de 30 hortaliças que integram o projeto. ;Entramos com a parte de manejo, produção, propagação, controle de pragas e doenças. O objetivo é formar uma cadeia produtiva;, anuncia Marinalva.
Gastronomia
Sempre em busca de novidades para incrementar as receitas, vários dos chefs brasileiros têm impressionado, inclusive fora do país, quando apresentam pratos com hortaliças tidas como exóticas aos olhos estrangeiros. Na maioria das vezes, a criatividade é o limite. O chef de Juiz de Fora Pablo Oazen, recentemente, levou ao Madri Fusion, congresso gastronômico na capital espanhola, um prato preparado com seleção das verduras desconhecidas lá, como ora-pro-nóbis, taioba, couve, agrião, serralha e maria-gondó, todas salteadas no azeite. Serviu-as com pasta de alho-negro e gelatina de porco com flor de jaborandi. A receita impressionou. A chef Maria Alves de Deus, do restaurante Gôndola, de Sete Lagoas, é outra que tem lançado mão dos ingredientes. ;Faço risotos e suflês usando taioba e hibisco. O povo tem adorado;, conta ela.