Na obra, de autoria do historiador Paulo Bertran (1948-2005), um dos maiores estudiosos da pré-história de Goiás e do Distrito Federal, constam mais detalhes da linha no Planalto Central, como sua exata localização. Ela coincide com o Meridiano 48;35;25;;, que passa em Olhos D;Água. Dali, segue pela Serra dos Pireneus, cujo pico mais elevado mede 1.385m acima do nível do mar.
Sob a serra, fundaram-se as goianas Pirenópolis e Corumbá. A serra serve ainda de espigão divisor das águas das bacias dos rios da Prata e Araguaia-Tocantins. A Linha de Tordesilhas surgiu do Tratado de Tordesilhas, que, de 1498 a 1750, serviu de limite territorial entre os domínios coloniais dos portugueses e dos espanhóis no continente americano.
Mas, enquanto o povoado de Corumbá foi fundado em terras de Portugal ; por uma bandeira dominada por paulistas em sua maioria de origem espanhola ;, o arraial de Meia Ponte (atual Pirenópolis) foi erguido em terras da Espanha por uma bandeira liderada por portugueses. Já o povoado de Santo Antônio de Olhos D;Água nasceu vinculado a Corumbá (ver Memória).
Placa
Para marcar a Linha de Tordesilhas, a prefeitura de Alexânia pretende instalar um monumento ao Tratado de Tordesilhas (ver Para saber mais) na Praça Santo Antônio. Ele já está pronto. Trata-se de uma placa em mosaico, com os brasões de Espanha e de Portugal, criada e doada pelo artista plástico brasiliense Henrique Gougon. Porém, não há data definida para sua inauguração.
A obra contará, também, com o brasão da Igreja Católica, bem como o texto das bulas papais que deram validade ao Tratado, a Inter Coetera, de 1493, e a Ea, quae pro bono pacis, de 1506, pela paz. Outro trecho a ser anexado é o da história da linha imaginária, fazendo com que o espaço venha a ser ponto de aulas a céu aberto, onde os alunos possam aprender história além dos muros da escola.
Por anos, Olhos D;Água era conhecido apenas pelo estereótipo de destino hippie e pela tradicional Feira do Troca. Agora, faz fama internacional com o rico artesanato e atrai muito trabalhador e aposentado cansado da correria da cidade grande. Gente que habita os casarões coloridos da vila, onde os vizinhos são acolhedores, e as fazendas próximas conservam cachoeiras inexploradas.
Pinga turbinada
A maioria dos turistas desconhece a relação do lugarejo com a Linha de Tordesilhas. Além de consultar o livro de Bertran, quem quiser saber mais sobre essa história basta dar um pulo no Bar Museu, em frente à Praça Santo Antônio. O minúsculo estabelecimento expõe em suas paredes, em meio e sobre as mais de 200 garrafas de cachaça com raízes variadas, recortes de jornais sobre a linha.
O museu e bar rústicos não tem mesas nem cadeiras. Apenas um velho e gasto balcão de madeira e uma banco igualmente maltratado. Mas é possível passar horas ali conversando com a dona, Cecília Machado, 60 anos. Na verdade, ouvindo mais do que falando, pois ela tem muitas histórias para contar. Algumas, sem muito nexo. Outras, curiosas e divertidas.
A paulista mudou-se com os pais e os cinco irmãos para Goiás quando tinha 12 anos. O pai comprou duas vendas perto de Brasília, mas acabou morto com tiros nas costas, na época da construção da capital, em circunstâncias não explicadas pela filha. Ela casou-se com um marinheiro que conheceu no Rio de Janeiro. Passou 15 anos viajando com ele Brasil afora.
Após a morte do primeiro marido, decidiu se casar com outro há 12 anos. Com ele, voltou a Olhos D;Água em 2002, quando montou o bar em um casebre construído em 1937. Passou a misturar cachaça a raízes compradas em cidades próximas. Criou mais de 200 variedades de bebidas, mais conhecidas como garrafadas. Ela jura que curam quase tudo. Vende a garrafa de três litros a R$ 80.
Contudo, é preciso seguir as instruções da inventora. ;Não é qualquer um que faz uma bebida dessas. Tem que saber marcar o dia, a lua e as quantidades, senão explode. Isso é igual a uma bomba atômica;, diz, soltando um riso. Mas o cliente pode apenas tomar uma ou mais doses de suas pingas turbinadas. Ou mesmo um refrigerante. O de que Cecília mais gosta mesmo é contar casos em um ritmo alucinante.
Para saber mais
Divisão territorial
Assinado na povoação castelhana de Tordesilhas em 7 de junho de 1494, o Tratado de Tordesilhas foi celebrado entre o Reino de Portugal e o recém-formado Reino da Espanha para dividir as terras ;descobertas e por descobrir; pelas duas Coroas fora da Europa. Ele surgiu na sequência da contestação portuguesa às pretensões da Coroa espanhola resultantes da viagem de Cristóvão Colombo, que um ano e meio antes chegara ao chamado Novo Mundo.
Memória
Utensílios de barro
Olhos D;Água surgiu de uma promessa feita por uma moradora de construir uma capela para Santo Antônio de Pádua. Em 1941, nasceu o povoado de Santo Antônio de Olhos D;Água, subordinado a Corumbá de Goiás. Os homens plantavam milho, feijão, arroz e mandioca e produziam utensílios de barro. O povoado foi emancipado em 14 de novembro de 1958, tornando-se município. Em seguida, a sede municipal foi transferida para Alexânia e, em 1963, Olhos D;Água tornou-se distrito.
Como chegar
São 100km do Plano Piloto até Olhos D;Água. Pega-se a BR-060 (Brasília-Goiânia) até Alexânia, percorrendo 85km. Entra na principal avenida comercial da cidade até a GO-139. Segue 10km pela rodovia estadual até um trevo, onde há uma placa indicando Olhos D;Água.