A pesquisa foi conduzida em Pequim, onde a política é extremamente rigorosa, e contou com a participação de 421 chineses nascidos em 1975, 1978, 1980 e 1983. Enquanto apenas 27% dos voluntários do primeiro grupo eram filhos únicos, o percentual subiu para 90,7% entre os que nasceram em 1983. Os cientistas aplicaramtestes econômicos que avaliaram questões como altruísmo, competitividade, sensibilidade e disposição para se envolver em situações arriscadas, além de questionários sobre a personalidade dos entrevistados.
Em um dos experimentos, por exemplo, eles eram divididos em duplas aleatórias, sendo que um assumia o papel do ;ditador; e tinha de decidir quanto, de um total de US$ 30, ele dividiria com seu par. Já o questionário incluía 44 perguntas, como ;quais as chances de fazer sol amanhã?;, emuma escala de 0 e 100. Segundo os pesquisadores, esse tipo de questão avalia o nível de otimismo do indivíduo. Todos os resultados mostraram que, quando comparada às pessoas nascidas antes de 1979, a geração que surgiu após a política do filho único é mais nervosa e desconfiada, tende a dividir menos, prefere não se comprometer com riscos e demonstra um grau de interesse menor nos problemas dos outros. Variáveis como nível educacional dos pais, idade e estado civil foram ajustadas e a única característica que se sobressaiu foi o fato de ter nascido sob esse regime populacional.
;Há muita preocupação na China sobre a geração do filho único e como ela difere das anteriores. Muito dessa discussão no país se foca em como as pessoas se comportam umas com Mulher caminha com bebê em rua de Pequim: governo anuncia que planeja mudar aos poucos a política e passar a permitir dois filhos por casal as outras;, disseram, por e-mail, as professoras Lata Gangadharan e Lisa Cameron, que conduziram a pesquisa. ;Estudos prévios sobre os efeitos da política do filho único têm se baseado em entrevistas feitas com pais, professores e crianças. Em alguns casos, em observações na sala de aula.Diferentemente, nós conduzimos testes da literatura econômica que foram feitos para extrair emoções como altruísmo, habilidade de confiar e ser confiável, preferências de riscos e competividade. Esses experimentos têm a vantagem de permitir ao pesquisador observar tipos de comportamentos particulares e bem definidos;, explicaram. Essa também é a primeira vez que se pesquisam os efeitos da política populacional da China entre os filhos únicos já adultos.
Presidente e fundadora da ONG Direitos das Mulheres sem Fronteiras,uma coalizão internacional que tem como objetivo se opor ao aborto forçado (leiamais abaixo), ao preconceito de gênero e à escravidão sexual na China, a ativista Reggie Littlejohn concorda que a política do filho único tem importantes impactos comportamentais. ;Em alguns casos, a criança é o foco deamore esperança de dois pais e quatro avós. Isso tem levado à ;síndrome do pequeno imperador;, na qual a criança espera sempre ser o centro da atenção e receber mimos. Em outros casos, esses meninos e meninas têm passado por uma tremenda pressão para vencer na vida, já que são as únicas sobreviventes de duas linhagens familiares;, acredita.;Uma visão de mundo autocentrada tem sido uma marca da geração de filhos únicos. Eles são menos preparados para a socialização que as gerações anteriores;, observa o dissidente chinês HarryWu, diretor executivo da Fundação de Pesquisa Laogai, em Washington.
Alterações
Lançada pelo presidente Deng Xiaoping para frear o crescimento populacional e permitir o desenvolvimento econômico, a política do filho único deve ser revista pelo Partido Comunista Chinês.De acordo com a agência oficial Xinhua, estuda-se aumentar para dois o número de crianças toleradas por casal em algumas províncias, até que a medida se torne nacional em 2015. O governo argumenta que a estratégia evitou o nascimento de 400 milhões de pessoas desde 1979 e, com isso, diminuiu problemas como fome, desemprego e falta de acesso aos serviços básicos em um país que, hoje, tem 1,3 bilhão de habitantes.
Em um artigo publicado no British Medical Journal, os pesquisadores Penny Kane e ChingY Choi, da Universidade de Melbourne e do Instituto de Saúde Australiano, reconhecem que a política estimulou o aborto e o preconceito de gênero, mas destacam o sucesso da medida em termos econômicos. ;O sucesso da política não deve ser desprezado. A redução na fertilidade aliviou ao menos alguma parte das pressões sobre as comunidades, o Estado e o meio ambiente em um país que ainda tem um quinto da população mundial;, escreveram.
O problema, em termos econômicos, é que a população chinesa está envelhecendo. Além da redução da força de trabalho ;a ONU estima que o encolhimento será de 17,3% em 2050 ;, o comportamento dos filhos únicos pode ser outro empecilho. ;No nosso estudo, descobrimos que aqueles nascidos sob essa política são menos propensos a escolher ocupações mais arriscadas, como trabalhar no setor financeiro ou ser autônomo. A preocupação é falte nessa geração a habilidade empreendedora, o que pode ter consequências econômicas negativas;, dizem Gangadharan e Cameron. ;Do mesmo modo, níveis baixos de confiança podem impactar na capacidade dos indivíduos de negociar e trabalhar de forma cooperativa com os outros;, completam.