Em comum entre eventos tão distintos, há o fato de que todos partem de um ponto e, a partir daí, seguem em rede. O grande diferencial do programa desenvolvido na instituição holandesa é sua capacidade de apontar a origem de eventos desse tipo com um grande grau de confiabilidade depois de observar apenas alguns dos indivíduos participantes do esquema. O pesquisador português Pedro Pinto e sua equipe desenvolveram um modelo com base no quadro da rede padrão para epidemias. ;Ele permite determinar a origem de uma doença, rumor ou contaminação. Para conseguir isso, utiliza a informação acerca da estrutura de rede, ou seja, quem está ligado a quem, e o tempo de chegada do vírus para os observadores;, detalha Pinto.
Nesse sistema, os indivíduos são imaginados como pontos (ou nós) interligados por uma rede de linhas (ou arestas). A partir daí, um indivíduo passa a transmitir as informações (seja o boato, o vírus ou a ordem para o ataque) para um ou mais de seus vizinhos, em intervalos de tempo aleatórios. Ao receber os dados sobre de quem um indivíduo recebeu a informação e a que momento, o programa começa a realizar uma série de cálculos que o permitirá chegar à origem.
Para tornar o algoritmo capaz de fazer isso, os pesquisadores buscaram inspiração também em um sistema muito usado pelas empresas de telefonia para identificar usuários de telefones celulares: : o princípio da triangulação. Para determinar a localização de um usuário de celular por GPS, por exemplo, suas coordenadas são computadas pela distância dele a pelo menos três diferentes satélites. Como o computador munido do programa não contará com satélites, ele elege alguns integrantes da rede a ser observada que servirão de referência ; os chamados nós observadores. ;Diferentemente da localização sem fio, em que um celular pode estar em qualquer localização contínua no espaço, na rede complexa, a fonte é somente mais um dos outros conjuntos de nós;, explica Patrick Thiran, professor da EPFL envolvido no estudo.
Testes
Desenvolvido o programa, era preciso colocá-lo à prova. Primeiro, a equipe testou quem seriam os nós observadores ideais. Descobriu-se, então, que se a análise se concentrar nos membros da rede com mais conexões, o algoritmo apontará o ponto de origem com 90% de confiabilidade depois de observar apenas 5% dos integrantes.
Os cientistas chegaram a esse resultado depois de imaginar as três situações descritas anteriormente: um boato no Facebook, uma epidemia de cólera e os ataques de 11 de setembro. No caso de uma mentira de espalhada na rede social, o programa escolheria, entre os usuários que reproduziram a informação, aqueles com mais contatos. Observando quais de seus amigos também transmitiram a mentira e fazendo uma série de relações, chegaria a um ou alguns poucos nomes que seriam os principais suspeitos.
No caso dos ataques às Torres Gêmeas em Nova York, os testes foram feitos a partir de informações divulgadas por notícias de jornal. O programa era abastecido com notícias que mostravam possíveis ligações de pessoas com os envolvidos diretamente no ataque. Depois de realizar seus cálculos, o algoritmo chegou a três nomes. Um deles era justamente o de Mohammed Atta, apontado pelas autoridades americanas como mentor dos ataques.
Os pesquisadores mostram que, além das situações descritas primeiramente, o método também poderia ser útil na resposta a ações terroristas como o ataque com gás sarin, em 1995, no metrô de Tóquio. O atentado matou 13 pessoas e feriu cerca de mil. De acordo com Pinto, o método também pode ser usado preventivamente para entender um surto infeccioso antes que ele saia de controle.
Confiabilidade
Para o professor do Departamento da Ciência da Computação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Wagner Meira, o principal mérito da pesquisa está no registro de confiabilidade do resultado. ;Existem variáveis que ele não consegue controlar, como a noção de onde estão os melhores observadores. Mas ele consegue estimar seu erro, ou seja, o nível de confiabilidade de seu resultado;, diz o cientista da computação.
O brasileiro só considera o uso do algoritmo no episódio de 11 de setembro um pouco longe da realidade, especialmente, pela impossibilidade de processamento da informação telefônica de mais de 1 milhão de pessoas que estavam em Nova York no momento do atentado. ;Ainda assim, é um grande avanço. Em uma epidemia, com certeza, há uma aplicação mais possível, já que são analisados pontos de infecção em um rio e não pessoas infectadas;, conclui. Entre os próximos passos da pesquisa traçados pelo professor Patrick Thiran, o trabalho se concentrará em outras possíveis aplicações do algoritmo, como identificar blogs mais influentes na internet.