Ana Paula Lisboa
postado em 18/03/2020 14:39 / atualizado em 26/04/2021 17:54
Enquanto a pandemia do novo coronavírus avança a passos largos, com mais de 200 mil contagiados globalmente, universidades em todo o mundo mudam suas rotinas e modos de ensinar para proteger a comunidade acadêmica. No Brasil, com pelo menos 291 casos da doença, e em muitos países, várias instituições de ensino superior substituíram as aulas presenciais por encontros virtuais. Na portaria nº 343, publicada quarta-feira (18/3) no Diário Oficial da União, o Ministério da Educação (MEC) autoriza essa troca por pelo menos 30 dias ou enquanto durar a pandemia. Esse período será revisto de acordo com a necessidade.
A substituição por aulas a distância é vedada aos cursos de medicina. A tecnologia também não poderá ser usada para intermediar práticas profissionais de estágio e laboratório de todos os cursos. O ensino a distância é a alternativa recomendada pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), mas as faculdades podem optar por simplesmente suspender as atividades acadêmicas presenciais pelo mesmo período, mas essas deverão ser integralmente repostas depois. O MEC também dá às instituições de ensino superior a alternativa de alterar o calendário de férias.
Monitorando a situação, a Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES) revela que faculdades de todos os estados e do DF registram interrupção de aulas presenciais por causa da pandemia. Na capital federal, que tem 33 casos confirmados, todas as instituições de ensino superior, sejam públicas (a Universidade de Brasília, a Escola Superior de Ciências da Saúde e o Instituto Federal de Brasília), sejam particulares, estão com funcionamento suspenso a partir de decreto do Governo do Distrito Federal. Confira no mapa da ABMES a situação em todas as unidades da Federação. Veja como instituições de outros países estão lidando com a questão:
Na Universidade Livre de Berlim, alunos são dispensados das provas
Nesta quarta-feira (18/3), o Instituto Robert-Koch alertou que a Alemanha poderá ter 10 milhões de casos de coronavírus em dois ou três meses se medidas de prevenção não forem cumpridas. Nos últimos tempos, o país tem apresentado 1.000 casos novos a cada dia. Nesta quarta, o Instituto Robert-Koch divulgou o montante de 8.198 pessoas infectadas na Alemanha, 1.042 a mais que na terça-feira (17/3). A apreensão já chegou às instituições de ensino alemães: em Berlim, todas as escolas e creches estão com atividades suspensas por cinco semanas; período que poderá ser estendido em caso de necessidade.
Morando na Alemanha desde outubro de 2019, a mexicana Karelia Llanos, 30 anos, faz mestrado em estudos interdisciplinares da América Latina na Universidade Livre de Berlim. A capital alemã tem 391 casos de coronavírus confirmado, sendo que o primeiro foi identificado em 1º de março. Por enquanto, a rotina de Karelia não mudou muito porque está de férias, no entanto, há estudantes ainda fazendo trabalhos finais e necessitando usar as bibliotecas, que foram fechadas. Além disso, todos os eventos dentro do câmpus foram cancelados. No sábado (14/3), a universidade autorizou que os estudantes desistam de fazer provas sem ter de apresentar justificativa e sem prejuízo às suas notas.
“Só espero que o próximo semestre não seja afetado, por enquanto as autoridades da universidade disseram que estão analisando a ideia de aulas e cursos on-line”, conta Karelia. “Parece-me que, de uma maneira ou de outra, todas as pessoas serão afetadas, tanto em seus trabalhos e estudos quanto na vida cotidiana”, percebe. A estudante mora num apartamento compartilhado na capital alemã e, atualmente, tem ficado mais em casa por causa da pandemia. Ela também lava as mãos com frequência.
À medida que o tempo passa e o número de infectados aumenta na Alemanha, o governo toma atitudes cada vez mais severas na tentativa de frear o avanço da doença, incluindo fechamento de fronteiras, bares, boates, clubes, igrejas, além de restrições ao funcionamento de restaurantes. “As medidas se intensificam a cada dia, visando evitar, tanto quanto possível, o contato com outras pessoas, porém considero que as medidas tomadas pelo governo daqui são pertinentes para enfrentar a crise”, diz. Karelia entende as restrições impostas à população.
“Eu acho que é o mais apropriado, serão semanas difíceis, mas tudo será para evitar um número maior de infecções.” A família da estudante vive no México e se preocupa com o bem-estar dela por viver na Europa, o novo epicentro da pandemia do coronavírus. No entanto, ela pondera que notícias sensacionalistas e falsas acabam por despertar uma preocupação excessiva, por isso, procurar se informar em fontes confiáveis é tão importante, pondera ela. Apesar de confiar no sistema de saúde da Alemanha, ela não deixa de temer pelo que possa acontecer daqui para a frente. “Em situações extremas, não sabemos o quão bem ele pode responder à demanda da população.”
Stanford pede para alunos de graduação irem embora
“Temos aulas on-line, e o câmpus está vazio porque as pessoas estão ficando só em casa ou estão indo embora”, diz Ana Machado, estudante de mestrado da Universidade Stanford, nos Estados Unidos. A jovem de 27 anos vive numa residência individual e não integra o grupo dos que compartilham residências universitárias, dos quais foi exigido que voltem para suas casas ou países de origem. Stanford passou tantas atividades quanto possível para o formato on-line por causa do novo coronavírus. Alunos, professores e funcionários receberam uma série de recomendações.
Desde que um faculty member testou positivo para o Covid-19, as aulas presenciais foram canceladas. A medida começou a valer em 9 de março. As provas do trimestre de inverno para alunos de graduação passaram a ser no formato take-home e se tornaram opcionais. A semana de boas-vindas, quando possíveis futuros calouros, visitam o câmpus, foi cancelada. A Universidade Stanford continua aberta, mas só atividades impossíveis de serem feitas on-line estão sendo mantidas presencialmente. Com o passar dos dias, medidas mais radicais foram tomadas após um estudante de graduação testar positivo para o novo coronavírus, na sexta-feira (13/3).
Residências para alunos de graduação
Em 10 de março, o presidente da Universidade Stanford, Marc Tessier-Lavigne, pediu para todos os estudantes de graduação que moram na universidade desocuparem os edifícios e voltarem para suas casas ou países de origem. “Como os estudantes de graduação moram em nosso câmpus em dormitórios e casas altamente comunais, com banheiros e refeitórios compartilhados, concluímos que reduzir a concentração de pessoas nesses espaços é essencial para ajudar a reduzir o risco de propagação de vírus durante a próxima fase crítica da evolução do Covid-19”, explicou o presidente Marc Tessier-Lavigne, em comunicado.
Alunos sem condições financeiras de se mudar podem pedir ajuda da universidade. Inicialmente, a instituição dava uma opção para os que se recusassem a sair do câmpus: os estudantes tinham a alternativa de permanecer assinando um termo de compromisso. Marc Tessier-Lavigne emitiu novo comunicado com medida mais drástica, requisitando a saída de todos os estudantes, na sexta-feira (13/3), quando um caso de coronavírus foi confirmado num aluno de graduação, que está em isolamento. No mesmo dia, o Condado de Santa Clara, na Califórnia, onde fica a Universidade Stanford, registrou 79 casos de Covid-19 e proibiu reuniões com mais de 100 pessoas, além de estabelecer restrições para encontros menores.
Até terça-feira (17/3), o condado registrou 155 casos e cinco mortes pela doença. Nos Estados Unidos, onde há mais de 6 mil diagnosticados, o número de mortos chegou a 100. Tudo isso tornou impraticável a continuidade do serviço de restaurante nas residências universitárias. Stanford só oferecerá acomodações e refeições para um número muito limitado de universitários, compreendendo “aqueles que não têm outra opção a não ser estar aqui” durante o trimestre de primavera. “Priorizaremos estudantes internacionais que não podem ir para casa; estudantes que têm riscos graves à saúde ou segurança; e estudantes sem-teto”, explica o presidente.
Quem não está em uma dessas categorias deve deixar o câmpus, no máximo, até esta quarta-feira (18/3). Os estudantes de graduação que já deixaram o câmpus ou que estão saindo agora não devem planejar retornar, a não ser que sejam chamados de volta, pois o próximo trimestre de aulas será on-line. O pedido de saída é voltado a universitários de graduação, que vivem em residências universitárias compartilhadas. Por enquanto, a restrição não afeta pesquisadores e estudantes de pós-graduação (incluindo mestrado, doutorado e pós-doutorado), pois esses moram em residências individuais.
Mesmo assim, isso causa preocupação entre estudantes de pós-graduação, como a brasileira Ana Machado. Ela faz mestrado em estudos de política, organização e liderança desde setembro de 2019. “Se Stanford mandasse todo mundo embora, eu, por exemplo, teria muita dificuldade de arrumar minhas coisas em tempo recorde e voltar para o Brasil”, afirma. “Eu espero que não resolvam obrigar todo mundo a sair”, comenta. Ela pondera que aulas presenciais são muito melhores do que a distância, mas percebe que foi uma medida necessária dada à situação. “É mais desafiador porque temos aulas longas, às vezes de três horas. É desagradável ter aulas a distância, mas, diante do que está acontecendo, Stanford não teria outra opção, a gente vai se adaptando e se ajustando”, opina.
*A jornalista é bolsista do Internationale Journalisten-Programme (IJP)
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