Correio Braziliense
postado em 03/08/2020 21:37
Em decreto de 14 de março de 2020, o governador Ibaneis Rocha (MDB-DF) suspendeu as aulas das escolas públicas e particulares como medida de prevenção à pandemia de covid-19. A medida se mostrou acertada para combater e evitar o vírus. Desde então, porém, o que eleva os ânimos é a questão do retorno aos colégios. Quando retornar? E a quem cabe essa decisão?
Adiamentos no retorno, disputa judicial, discordâncias entre sindicatos marcam esse debate. Também não há coesão entre os pais. De um lado, uma expressiva quantidade de responsáveis declara que não levarão os filhos para a escola mesmo se ela reabrir por causa dos riscos do novo coronavírus. De outro, pais justificam necessitar desses espaços por não terem onde deixar as crianças enquanto trabalham.
Advogado especializado em direito educacional, Célio Müller, do escritório Müller Martin Advogados, vê como solução para essa divergência de posições o estabelecimento de um termo em que pais assumem a decisão do retorno de seus filhos à sala de aula. “Eu entendo que não há ilegalidade em um termo de opção educacional”, defende o advogado. “A quem cabe o retorno, no meu entender, é à família.”
Müller argumenta que, em tempo de pandemia, não há espaço para considerar negligentes os pais que decidem por deixar os filhos em casa. “O abandono intelectual ocorre quando os pais não se importam em levar os filhos à escola”, afirma. “O dever de levar os filhos à escola não deve ser maior que o dever de assegurar a saúde dos filhos.”
A favor da volta
O servidor público Alan Freitas, 30 anos, tem um filho de 6 anos e uma filha de 7 anos. O menino estuda Colégio Elite Ceac, no Gama; e a menina, no Colégio Conexão, em Taguatinga. Ambos estão em esquema de ensino remoto. “O meu filho tem um pouquinho mais de dificuldade em manter o foco. Então, sem a presença da professora chamando atenção, ele se perde mais fácil. Isso forçou a mim e a minha esposa a fazer esse papel”, afirma o servidor público. “Foi um desafio para a gente e a gente também se adaptou.”
Apesar da boa adaptação ao ensino remoto, Alan pensa que é hora de os filhos voltarem às salas de aula. “A minha posição pessoal, que não é a da minha esposa, é que pode sim retornar, tomando os devidos cuidados. Eu sou da opinião de que essa pandemia, essa doença vai se espalhar de qualquer jeito”, diz. “Eu acho que a hora já chegou. O momento ideal é agora”, argumenta.
Contra qualquer retorno
Mãe de uma menina de 10 anos, aluna do 5º ano do Colégio Elite Ceac, no Gama, Nara Adriane de Araújo, 38, também viu boa adaptação ao ensino remoto. “Não tivemos nenhum problema, nenhuma dificuldade. Nem em relação a horário ou ao sistema. A gente se adaptou muito bem”, afirma.
Ela segue a corrente de não apoiar o retorno nem mesmo no formato híbrido, que combina momentos intercalados de ensino presencial e a distância. “Eu não gostaria que as aulas voltassem neste momento de forma híbrida. Eu fico preocupada, eu fico apreensiva. Como mãe, eu não me sinto segura. Eu acho que não é o momento”, afirma Nara. “Eu penso também nos professores e nos funcionários”, diz.
“Eu temo uma retomada antes da hora. O momento ideal mesmo seria quando tivesse a vacina e a população estivesse imunizada”, avalia. “Porém a gente não tem uma certeza absoluta dessa data. Eu acho que o momento coerente seria quando houvesse queda de casos e o número de leitos, em especial os de UTI, estivessem em número maior”, pondera Nara.
Um terceiro elemento
As consequências de qualquer tomada de decisão não se limitam ao estudantes e suas famílias. Diretores, professores e demais funcionários também são afetados. Na avaliação de Eduardo Dias da Silva, 38 anos, professor e pedagogo da educação básica da rede pública de ensino do DF, chama a atenção para a importância de pensar também no lado desses profissionais.
“Em nenhum momento, nestas discussões, se levou ou se leva em consideração o aspecto do professor que é uma figura extremamente importante e fundamental nessa questão de organização do espaço”, pondera. “A gente não pode esquecer que a classe dos professores, principalmente os professores de rede pública, já é uma classe adoecida por muitas outras questões anteriores à pandemia. É uma classe adoecida pelo próprio ofício”, considera Eduardo
“O que parece é que existe uma imposição governamental de instituições particulares e públicas na área educacional para que as coisas aconteçam como eram num passado recente”, reforça. “A gente tem que trabalhar com o possível e não com o desejável”, destaca o professor de francês do Centro Interescolar de Línguas (CIL) do Gama.
O que diz a Aspa-DF?
“Cabe à Secretaria de Educação e ao GDF prestar as informações, como Poder Público, acerca do momento para a retomada das aulas e se todos os cuidados foram tomados pelas escolas particulares bem como a comunidade escolar no ajuste de entendimentos para o retorno”, defende Alexandre Veloso, presidente da Associação de Pais e Alunos das Instituições de Ensino do Distrito Federal (Aspa-DF). “Aí, sim, a decisão final de mandar o filho para a escola ou não, não há dúvida, resta aos pais”, declara.
*Estagiário sob a supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa
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