Wellington lembra que o Américo Antunes se tornou uma unidade escolar militar ano passado. "Em 2017, houve um movimento para militarizar um outro colégio, que não deu certo. Então, acabaram militarizando o nosso;, explica. ;A maioria votou a favor com medo da escola fechar;.
O professor ressalta que foi o único docente a votar contra a proposta, mas permaneceu na escola. Em agosto do ano passado, o novo diretor, um capitão da Polícia Militar, começou a conversar com os professores, um por um, querendo saber o que os decentes pensavam sobre diversos temas. "Quando ele falou comigo, manifestei minha posição, que era o único que tinha sido contra o colégio se tornar militar. Fiquei na escola para ver como seria o funcionamento da escola. Não devemos criticar antes de conhecer;, conta Wellington.
Polêmica sobre o slogan de campanha do Presidente Jair Bolsonaro
Em fevereiro, ocorreu o afastamento de Wellington da escola por ele criticar a leitura do slogan do presidente Jair Bolsonaro após o Hino Nacional. "Cheguei um pouco atrasado e eles já estavam se preparando para cantar. Quando começaram a entoar, o coordenador começou a filmar o pátio. Ao terminar, o diretor Eduardo Filho leu a carta enviada pelo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodrigues, inclusive coma leitura do slogan do Bolsonaro;."Quando terminou a leitura da carta do ministro, o diretor perguntou se algum professor pretendia se manifestar. Respondi sim, e falei: Eduardo, não concordo com o que você leu, não deveria ter sido lido por ser slogan de campanha. Se o senhor me permite, a filmagem tem que ter autorização dos pais por serem os alunos menores de idade;;, relata.
;Ele acusa que fui insubordinado, porque o que tem na minha carta de afastamento é essa causa, insubordinação;, conta. ;Quando terminei de falar ele virou uma arara, me atacou falando que qualquer professor havia entrado de porta aberta e poderia sair de porta aberta, que aquela unidade era militar e teria que se ajustar. Também falou ;nossa bandeira nunca será vermelha e não haverá comunismo;;.
Pedido de afastamento e começo das investigações
Após o episódio, o capitão foi até a Regional de Ensino levando, além da denúncia, reclamações de pais de alunos contra minha conduta. ;Fiquei sabendo depois que ele (Eduardo Filho) contou sua versão dos fatos e apresentou três reclamações de pais de alunos formuladas no corrente ano;, afirma. Segundo o professor Wellington, o Sindicato de Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego) reconhece que a Secretaria da Educação errou em determinar o afastamento dele por um período de até 180 dias sem abrir um processo administrativo. ;Conversei com o Sintego, entrei com uma ação com advogados de Goiânia, anexei os documentos e fizemos esse processo;, informa. ; Essa ação pode resultar em danos morais pelo constrangimento e o impedimento do meu exercício de professor;, acrescenta.Repercussão da história
Após a divulgação do caso, ocorreram várias manifestações nas redes sociais em favor do professor goiano. Wellington agradece essas menções e diz que esse apoio dará força para enfrentar as investigações. ;Quero que seja resolvido, uma retratação, que tudo seja reparado. Foram feitas denuncias formais ao Conselho Estadual de Educação e ao Ministério Público de Goiás e ao MP de de São Luís;, disse.;Sabemos que é uma perseguição política do comando da escola por eu pensar diferente deles e ser ateu. Convenceram alguns pais a reclamar de mim contra minha posição religiosa;, alega. ;Citei o que há na constituição e foi ignorado, e minha resposta não está anexada ao processo que tem na Regional. Não tive direito de defesa, nem no âmbito do colégio tampouco na Regional de Ensino;, lamenta. ;As pessoas viram a perseguição que se deu, ainda mais com o contexto atual político, é difícil ser professor e trazer temas caros e aguçados para serem debatidos;, conta.
Várias entidades postaram notas de repúdio contra o afastamento de Wellington. A Associação Mobilização dos Professores de Goiás (AMPG), Associação dos Geógrafos Brasileiros Seção Goiânia (AGB) e a Universidade Estadual de Goiás (UEG) publicaram notas de repúdio à decisão da Seduce. O MPGO investiga o afastamento do docente da unidade por meio de inquérito civil . Confira as notas da UEG e AGB.
O ator Pedro Cardoso, famoso por ter interpretar Agostinho Carrara, na série A grande Família, que está sendo reexibida nas tardes da TV Globo, fez uma publicação em seu Instagram a favor do docente goiano. No post, o ex-ator da emissora agradece às escolas por ; fazer publicidade da administração messiânica atual;.
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O Sindicato de Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego) afirma que está prestando apoio jurídico a Wellington, tentando reverter a suspensão e o afastamento do professor administrativamente. Caso não seja possível, entrarão com todos os recursos cabíveis. Na opinião do sindicato, houve excesso por parte da direção da escola na decisão de pedir a remoção de Wellington.
Versão da Secretaria de Educação
A escola fez uma reclamação à Secretaria de Educação (Seduce) de Goiás, que instaurou sindicância para apurar os fatos. Além disso, suspendeu e transferirá o professor Wellington para uma outra unidade escolar enquanto investiga o caso. De acordo com a Seduce, com informações enviadas por e-mail, ;a medida avalia se as pessoas citadas teriam cometido algum ato de transgressão administrativa. Se forem encontrados indícios de autoria e materialidade em possível transgressão, a ocorrência será transformada em Procedimento Administrativo (PAD), após apreciação da autoridade instauradora (no caso a Secretaria de Estado da Educação);.Além do conflito entre o professor com o diretor na hora do canto do Hino Nacional, a escola enviou reclamações de três pais de alunos que acusam Wellington de doutrinação comunista em sala de aula. Dois deles procuraram a Coordenação Regional no dia seguinte ao ocorrido, acusando o professor de geografia de ;fazer proselitismo de cunho político e religioso, de se opor ao canto do hino e desrespeitar o diretor;.
Como os fatos estão sendo apurados, a Seduce informou que a transferência do docente para outra escola foi autorizada para preservar os envolvidos. ;A decisão foi tomada para que não haja uma desordem administrativa na unidade escolar, com conflitos durante a investigação. O afastamento é por até 180 dias, sem prejuízo da remuneração;, afirma a secretária.
A Secretaria assegura que o afastamento não é uma punição ao professor: ;O afastamento preventivo não é penalidade, mas medida cautelar para investigar sem ingerências externas, além de manutenção da ordem durante os trabalhos, prevenindo a incolumidade de provas e pessoas, incluindo servidores, testemunhas, comunidade e o próprio investigado;, explica. Em nota, a Seduce esclarece que ;se não forem encontrados indícios de autoria e materialidade, o procedimento será arquivado;.
O Correio procurou o diretor da unidade, capitão Eduardo Filho, da Polícia Militar, mas eles não quiseram falar. Alegaram que todas as informações sobre o caso do professor estão disponíveis na nota emitida pela Seduce. Sobre as acusações feitas pelo docente, a Secretaria rebate: "Sobre os novos questionamentos, a Secretaria de Estado da Educação (Seduce) esclarece que o afastamento do professor é amparado por dispositivo legal (Lei n; 10.460, artigo 326). A Seduce informa ainda que as investigações a respeito do assunto estão em diligência e, no momento oportuno, o professor será ouvido. Reforçamos que o afastamento do professor ocorreu de forma a preservar todos os envolvidos, inclusive ele mesmo, e para evitar alguma influência durante as investigações.;
Colégio Militar
A Escola Estadual Américo Antunes se tornou militar em maio de 2018. De acordo com a Secretaria de Educação, a decisão foi tomada pela comunidade escolar, professores e servidores em assembleia. Eles aprovaram, por unanimidade, a militarização da unidade. A Seduce também afirma que o período de adaptação não teve nenhuma dificuldade. A unidade tem 275 estudantes matriculados e 17 professores, ambos em tempo integral.Estagiária sob a supervisão da editora Ana Sá*