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Índices do Saeb retratam desigualdade educacional no Brasil e no DF

Apesar de figurar entre as 10 melhores médias do país em todos os cenários, DF apresenta diferença de quase 30% entre pobres e ricos. Ministro da Educação classifica desempenho do ensino médio no país como "falido" e "fundo do poço"

O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) divulgou nesta quinta-feira (30) os resultados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), dados bienais que medem o nível dos alunos do ensino básico de todo o país. Os números correspondem ao desempenho de 2017 de estudantes do 5; e 9; ano do ensino fundamental e do 3; ano do ensino médio, em provas de matemática e língua portuguesa. As médias dos alunos do Distrito Federal figuram entre as 10 melhores em todas as turmas e disciplinas, mas a desigualdade de aprendizagem, levando em consideração as diferenças socioeconômicas entre alunos, chega a picos de 101 pontos, a maior do país.
Na classificação geral dos estudantes, estabelecida em médias de 0 a 9, o pior desempenho está no ensino médio, com nível 2 nas duas disciplinas, enquanto a melhor ficou entre os jovens do 5; ano. O nível é considerado adequado a partir de 7. ;É possível que, em 2021, o fundamental do 9; ano esteja com desempenho acima do ensino médio na escala de pontuação. Seria um absurdo e, literalmente, o fundo do poço;, disse, sem meias-palavras, Rossieli Soares, ministro da Educação.

Ministro descreve sistema educacional como "falido"

Pela primeira vez, os dados do Saeb foram publicados separadamente do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que será divulgado na próxima segunda-feira (3). Mais de 5,4 milhões de estudantes fizeram as provas do Saeb. No Centro-Oeste, foram 431 mil alunos. Na apresentação dos dados, o ministro não poupou críticas, classificando o sistema educacional brasileiro como "literalmente falido". O nível de insuficiência em língua portuguesa nos anos finais do ensino fundamental, por exemplo, é de 60%. Presidente do Inep, Maria Inês Fini entende o Saeb como fonte de conscientização dos gestores. "Há um grande contingente de jovens em nível insuficiente de aprendizagem e isso se arrasta do 5; ano do fundamental ao 3; ano do ensino médio. O Saeb deve despertar os gestores das escolas para isso."
Ainda em língua portuguesa, contudo, a proficiência média aumentou progressivamente nas últimas três edições (2013, 2015 e 2017) em todos as séries. "É a boa notícia do ensino fundamental. Destaco o crescimento de estados como Alagoas, Tocantins e Paraná", disse Rossieli. ;Precisamos apoiar mais estados como o Maranhão, ainda abaixo dos demais, de modo que essas desigualdades diminuam no Brasil.;
Em matemática, a média oscilou no 5; ano do fundamental (era 270 pontos em 2013, passou para 256 em 2015 e retornou para 270 em 2017) e aumentou timidamente nos demais, pulando de 252 pontos (em 2013) para 258 (em 2017) no 9; ano e de 211 (em 2013) para 224 (em 2017) no 3; ano do ensino fundamental. Na disciplina, sete em cada 10 alunos do ensino médio tiveram notas consideradas insuficientes.
"A média dos estudantes em matemática no 9; ano é um desastre. Mais de 63% dos jovens têm aprendizado insuficiente, estão com grande dificuldade. Isso é um problema gigantesco para o Brasil. Está na hora de tomar uma direção certeira, especialmente na educação básica;, admitiu o ministro. ;São alguns absurdos que demonstram o quanto o ensino médio não está agregando ao jovem brasileiro. Não há nenhum país no mundo que tenha melhorado seu PIB e outros indicadores que não tenha partido da melhoria das escolas;.
Os melhores desempenhos estão no 5; ano, período em que os alunos estão no nível quatro nas duas disciplinas. No 9; ano, eles apresentam a média geral em nível três. O ensino médio não tem melhoras significativas desde 2009. É nesta etapa que estão a maior parte dos alunos considerados com o ensino insuficiente, cerca de 70%. "O jovem que, no 5; ano, tem nível insuficiente de proficiência tem maior probabilidade de abandonar os estudos nas etapas mais à frente."

[SAIBAMAIS] Índices do ensino médio preocupam

Fernando Cássio, membro do Comitê São Paulo da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, não há motivos para comemoração. "São dados que não indicam melhora. Há crescimentos aqui e ali, mas apenas porque as redes aprendem a lidar com essas métricas", explica. "O aluno que fica retido em um ano e está num nível insuficiente, se não for socorrido, vai arrastar a deficiência de aprendizagem até o final do ensino médio;, observa Maria Inês Fini.
Segundo Fernando Cássio, olhar para indicadores não é o suficiente. "Eles são importantes, pois produzem conhecimento e diretrizes, mas não podemos priorizar os números e esquecer de pensar na valorização da educação", afirma ele, que é professor da Universidade Federal do ABC (UFABC). A estagnação dos resultados do ensino médio, acredita Fernando, é um dado que chama a atenção. "Nós temos vários problemas. Não sou daqueles que acredita que a solução é currículo. Penso que, quando os alunos ocuparam as escolas em São Paulo, ficou muito claro que a questão não era essa e sim várias outros fatores", diz.
"Se olharmos para a reforma do ensino médio, que seria a solução miraculosa, não está funcionando. Em São Paulo, do jeito que ela está sendo implementada, apenas amplia as desigualdades. Concentra recursos em algumas ilhas de excelência, onde está sendo colocado o ensino integral. Essas escolas vão produzir os melhores resultados, enquanto as outras, não." Fernando Cássio enxerga desigualdade nos gastos com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). "Os investimentos estão sendo todos para a BNCC. E nós já sabemos que currículos centralizados não resolvem", diz. Kátia Smole, secretária de educação básica do ministério da Educação, ao contrário, acredita na prioridade absoluta da pauta. ;A aprovação da BNCC do ensino médio não é pressa apenas do MEC, mas pressa da sociedade brasileira.;

Para a gerente de pesquisa e desenvolvimento do Itaú Social, Patrícia Mota Guedes, o essencial é olhar para os anos finais do fundamental. "Nos três níveis avaliados, o único que pode ser considerado adequado é o do 5; ano, em português. As médias continuam abaixo de onde deveriam estar. Isso reforça uma tendência de um desempenho melhor nos anos iniciais, o que vem acontecendo desde 2015.; Para ela, salta aos olhos o gargalo dos anos finais, nos quais estão localizados os maiores índices de reprovação e de abandono. ;É uma etapa esquecida, não temos dado atenção", destaca.
O caminho para a evolução, de acordo com ela, é longo e exige cooperação mútua. "Não tem fórmula mágica. Envolve melhorar a gestão educacional, recursos, condições de trabalho para os professores e foco na aprendizagem. Deve-se ter uma articulação entre governo federal, estados e municípios", enfatiza.

Distrito Federal é o mais desigual

O Distrito Federal está entre as regiões que conseguiram os melhores resultados gerais, mas ocupa o 1; lugar na diferença de aprendizagem entre os níveis socioeconômicos, medidos pela posse de bens domésticos, renda e contratação de serviços pela família dos alunos e pelo nível de escolaridade de seus pais. No ensino médio, os alunos brasilienses de bom nível econômico alcançam 357 pontos em matemática, contra 256 daqueles mais pobres. Uma diferença de 28,3%, portanto. Em português, a desigualdade é de 74 pontos.

"A explicação para esse diferencial de aprendizagem que é negativo no ensino médio é gestão. Tem que aumentar o investimento em gestão e a conexão da rede com cada escola", argumentou Haroldo Rocha, presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed).

Para Fernando Cássio, os gráficos refletem a falta de investimento. "O gargalo é dinheiro. O Temer sancionou a Lei de Diretrizes Orçamentárias 2019, que trazem como prioridade o Plano Nacional de Educação, mas veta a priorização do custo aluno qualidade. Sem isso, você não consegue concretizar a formação de professores e infraestrutura, de modo a possibilitar que haja na escola uma biblioteca, uma quadra coberta e insumos mínimos", afirma. "Um aluno de ensino médio custa R$ 300. Qualquer escola particular, por pior que seja, custa R$ 700. Isso é questão de prioridades políticas", crítica.

Ceará é destaque positivo

O estado que apresenta a menor diferença entre escolas com níveis socioeconômicos diferentes é o Ceará, no caso do ensino fundamental. ;O destaque inegável é o estado do Ceará. São apenas quatro pontos de diferença entre os alunos de nível socioeconômico mais alto e mais baixo", afirmou Rossieli Soares, referindo-se ao desempenho em matemática no 5; ano do ensino fundamental. Cearenses e paranaenses demonstram a menor desigualdade entre alunos ricos e pobres.
No ensino médio, Pernambuco é o que se sai melhor. ;Esses estados devem ser estudados. Precisamos ver qual metodologia está sendo usada para fazer essa mensuração. Eles estão mais preparados para fazer provas, de fato, porque os alunos foram muito disciplinados;, afirma. No caso do 9; ano em português, o desempenho médio das escolas de menor nível socioeconômico de Santa Catarina é semelhante ao desempenho médio das escolas com melhor nível socioeconômico no Pará. De acordo com o Saeb 2017, os estados que apresentaram maiores avanços em relação à última avaliação foram Acre, Alagoas, Ceará, Goiás, Piauí e Tocantins.
São esses exemplos que precisam ser seguidos, avalia o ministro. "O próximo presidente do país precisa trabalhar para alterar e transformar a educação básica brasileira", afirmou. "Precisamos de mais recursos, é claro, mas também é preciso gastar melhor os recursos que temos, gastando no que há evidências de sucesso. Alunos que estão em sistemas de educação integral têm maior chance de ingresso no ensino superior através do Enem", exemplifica.

*Estagiários sob supervisão de Ana Sá