Mesmo após 30 anos de experiência em sala de aula, o professor doutor em física Erizaldo Cavalcante decidiu que era o momento de tentar algo novo. Após uma pesquisa, descobriu que o smartphone tão vilanizado por muitos professores era, na verdade, uma oportunidade de aprendizagem. Há quatro anos surgiu o ;Cine com ciência: Luz, câmera; educação;, projeto que tem o objetivo de aliar a tecnologia à produção audiovisual dos alunos na disciplina de cinema do Centro de Ensino Fundamental 01 do Cruzeiro.
Deu tão certo que, além de ser finalista do Prêmio Professores do Brasil 2017, a iniciativa serviu de inspiração para o Banco de Práticas Inspiradoras, parceria do Ministério da Educação com o Instituto Península, que reúne uma série de ações de professores da rede pública de ensino, as quais estão relacionadas às dez competências gerais da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
O objetivo do banco é compartilhar práticas inspiradoras de professores para que outros tantos possam se motivar e transformar a realidade ao redor, auxiliando na implementação da base até nos contextos mais difíceis. Além disso, serve como ferramenta de valorização ao trabalho dos docentes espalhados pelo Brasil. O professor Zaldo, como é conhecido carinhosamente entre os alunos, e mais 29 professores finalistas do prêmio foram os escolhidos, mostrando as práticas inovadoras em formato de artigo e vídeo.
;A nossa intenção era, com a homologação da base, jogar luz em fatos positivos que estavam acontecendo a fim de exemplificar para os professores de uma maneira simples como as 10 competências já estão sendo colocadas em prática; descreve Heloisa Morel, diretora executiva do Instituto Península. Para ela, os relatos reais dos professores visam inspirar e não ;ofertar um plano de aula a ser seguido;.
Erizaldo está em Dublin, na Irlanda, para conhecer o sistema educacional do país e mostra felicidade com a participação no banco de práticas. ;Essas práticas apontam caminhos de quem nadou contra a maré apesar das dificuldades e achou tempo para pesquisar e elaborar. A ida ao país europeu faz parte da premiação aos finalistas do Prêmio Professores do Brasil. ;Vimos com bons olhos o coroamento do prêmio com essa visita;, celebra.
Sucesso
Até o fim de 2017, os alunos do professor Zaldo produziram mais de 50 filmes. O processo de produção é rigoroso e envolve etapas que vão desde roteiro técnico, montagem de elenco, até edição dos curtas. O sucesso é tão grande, que o CEF 1 do Cruzeiro teve três edições do festival de audiovisual próprio, o Curta seu curta. ;Se você, como professor, procura capacitar e aprender as técnicas de linguagem do cinema e faz suas experiências de criar roteiro, de como melhor contar uma história por meio da narrativa audiovisual, você tem condições de mostrar para o aluno que ele pode criar, aprender e interagir por meio de um processo de produzir um filme do zero;, ressalta Zaldo.
A diretora do Instituto Península destaca a importância da ação desenvolvida pelo professor Zaldo: ;O projeto do Erizaldo explora a quinta competência da BNCC, que trata da cultura digital, colocando os alunos como protagonistas e os envolvendo na criação e no pensamento reflexivo do processo a partir de uma ferramenta que, em tese, não é permitida em sala de aula. Mas faz parte da vida de todos eles;, mostra Heloísa.
Engana-se quem acredita que a disciplina seja apenas uma diversão sem atenção ao que ocorre no mundo. Filmes que abordam problemas ambientais até suicídio juvenil foram produzidos pelos estudantes. ;Minha preocupação é de que os alunos conheçam a linguagem, mas façam dela o bom uso. Que não usem para o estímulo à violência. Que tenham a consciência de saber usar para passar uma mensagem informativa para outros jovens que estejam assistindo; reitera o professor.
Pequenas diretoras e artistas
A aluna Jéssica Ramos, 13 anos, diretora de quatro curtas, se empolga com o projeto do qual faz parte. ;Ele dá liberdade de os alunos criarem, soltarem a imaginação. Mudou bastante minha comunicação, eu sou menos tímida, sou bem mais sociável". Quando fala do idealizador do projeto, ela é só elogios: ;O professor é maravilhoso, está sempre disponível, tem novos projetos. Uma mente brilhante. Ele é inspirador;.
Para Letycia Ewellyn, 14, do 7; B, o celular como ferramenta de ensino é bom para quebrar a monotonia das aulas: ;A gente passa muito tempo dentro da sala de aula com caderno, mas nessa aula a gente aprende muita coisa com o celular;. A adolescente, que já até fez clipe musical, reconhece a mudança. ;Quando entrei na escola, eu não sabia sobre planos de câmera. Hoje, graças a ele, tenho essa noção;.
;O audiovisual, produzido pelos alunos, é uma aplicação muito presente das tecnologias ligadas à educação e tem extrema visibilidade porque está nas mãos da maioria deles;, completa o professor Zaldo.
O Banco de Práticas Inspiradoras, do MEC e Instituto Península (organização do terceiro setor que atua em educação e esporte no aprimoramento da formação de professores) tem diversas histórias de inovação, cujos temas abrangem desde relações étnico-raciais, conservação de patrimônio por meio da arte, musicalização e outros.
* Estagiário sob supervisão de Ana Sá