O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso votou hoje (30) a favor da ação da Procuradoria-Geral da República (PGR) que pede que a Corte reconheça que o ensino religioso nas escolas públicas deve ser de natureza não confessional, com a proibição de admissão de professores que atuem como representantes de confissões religiosas. Após o voto do ministro, relator do caso, o julgamento foi suspenso e será retomado na sessão de amanhã (31), prevista para começar às 14h.
Único a votar na sessão desta tarde, Barroso votou para dar interpretação conforme a Constituição e declarar que o ensino religioso nas escolas públicas de todo o país deve ser de forma não confessional, com proibição de admissão de professores ligados a qualquer religião e com matrícula facultativa.
A ação da PGR foi proposta em 2010 pela então vice-procuradora Débora Duprat. Segundo entendimento da procuradoria, o ensino religioso só pode ser oferecido se o conteúdo programático da disciplina consistir na exposição ;das doutrinas, práticas, histórias e dimensão social das diferentes religiões;, sem que o professor tome partido.
Para a procuradora, o ensino religioso no país aponta para a adoção do ;ensino da religião católica;, fato que afronta o princípio constitucional da laicidade. O ensino religioso está previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e no Decreto 7.107/2010, acordo assinado entre o Brasil e o Vaticano para o ensino da matéria.
Relator
Se o voto do relator prevalecer no retorno do julgamento, alguns estados serão obrigados a rever o atual modelo de ensino religioso porque não houve regulamentação nacional sobre o tema pelo Ministério da Educação. Segundo Barroso, alguns estados, como a Bahia, Ceará e Rio de Janeiro, adotam modelo confessional, ligado a uma religião. Outros realizam matrícula automática dos alunos na disciplina e não oferecem opções para substituir a matéria.
Barroso iniciou a fundamentação de seu voto afirmando que o Estado deve assegurar a liberdade religiosa e conservar uma posição de neutralidade, sem privilegiar ou favorecer nenhuma religião. "O que está em jogo é a definição do papel do Estado na educação religiosa de crianças e adolescentes brasileiros. Cumpre, portanto, estabelecer qual a melhor forma de prepará-los com valores e informações para que possam fazer as suas próprias escolhas na vida", disse.
De acordo com o ministro, o ensino confessional é inconstitucional por entender que a sala de aula, como local público, não pode ser usada para pregação de uma religião específica e o Estado não pode permitir que professores sejam contratos como representante das religiões. ;O ensino religioso confessional viola a laicidade porque identifica estado e igreja, o que é vedado pela Constituição. A incompatibilidade parece patente;, concluiu.
PGR
Durante o julgamento, ao se manifestar novamente sobre o caso, a Procuradoria-Geral da República (PGR) voltou a defender a ação. Para o procurador-geral, Rodrigo Janot, as escolas e professores não podem tomar partido sobre as diferentes denominações religiosas.
"A única forma, ao ver do Ministério Público, de compatibilizar o caráter laico do Estado brasileiro com o ensino religioso nas escolas públicas é através da adoção de modelo não confessional, em que o conteúdo programático da disciplina consiste na exposição das doutrinas das práticas da história e das dimensões das diferentes religiões, sem qualquer tomada de partido por parte dos educadores".
Outro lado
O advogado Fernando Neves, representante da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), defendeu a obrigatoriedade do ensino religioso por estar previsto na Constituição. Além disso, Neves argumentou que o poder público não pode impedir o cidadão de ter a opção de aprofundar os conceitos sobre sua fé.
;O ensino religioso não é catequese, não é proselitismo. É aprofundamento daquele que já escolheu aquela fé, por si ou por sua família. Os alunos são livres para frequentar;, argumentou.
Advocacia-Geral da União
Durante o julgamento, a advogada-geral da União, Grace Mendonça, defendeu também o ensino religioso nas escolas públicas no formato atual. Para ela, ao prever expressamente a disciplina, a Constituição obriga o Estado a oferecê-la. Gracie argumentou que a oferta da disciplina nas escolas públicas fortalece a democracia, tornando-a mais inclusiva.
;O que fortalece mais a democracia, eliminarmos o ensino confessional ou ampliarmos a base do ensino confessional, permitindo que todas as crenças se desenvolvam no ambiente escolar? O ensino é ofertado pelo Estado, mas não se impõe qualquer tipo de credo. O que se busca aqui, na verdade, é assegurar uma democracia mais forte e mais inclusiva;, disse.
Em 2011, publicou uma série de matérias retratando o desafio das escolas brasileiras de oferecer um ensino religioso que respeite as diversas crenças. O especial foi vencedor do Prêmio Andifes de Jornalismo 2012, na categoria educação básica.