A substituição do sistema de seriação tradicional no ensino fundamental é uma tentativa do Governo do DF de reduzir os índices de reprovação e a evasão escolar. ;Tivemos uma experiência positiva com o BIA, que reestruturou os três primeiros anos do ensino fundamental. Vamos ampliar essa experiência para o 4; e o 5; anos;, disse o secretário de Educação, Denilson Bento da Costa. Neste ano, a mudança será obrigatória em pelo menos cinco regionais: Santa Maria, São Sebastião, Recanto das Emas, Núcleo Bandeirante e Guará. Mas outras instituições podem solicitar a participação. A partir de 2014, o sistema será válido para todas.
Segundo Denilson Bento, os ciclos vão aproximar professor e aluno, além de possibilitar que cada estudante atinja os níveis de conhecimento no tempo adequado a ele. Não ter reprovação não significa um problema para o chefe da pasta da Educação. ;As dificuldades podem ser analisadas caso a caso, com possibilidades de intervenção com estratégias pedagógicas bem traçadas;, ressaltou.
A pesquisadora da Universidade Católica de Brasília (UCB) Leda Gonçalves, no entanto, tem restrições às mudanças previstas para o ensino público. De acordo com a especialista, prolongar o bloco inicial de alfabetização pode apenas adiar a reprovação do estudante que enfrentar dificuldades no aprendizado. ;As experiências que temos visto com ciclo não são muito bem-sucedidas. A tese é boa, mas, na prática, não vemos mudança no processo pedagógico;, comenta. ;O que acontece é apenas uma maquiagem nos índices de reprovação, não muda a qualidade do ensino;, emenda.
Ensino médio
Já para os estudantes de nível médio, o ensino passa a ser semestral. As aulas serão divididas por áreas de conhecimento: nos primeiros seis meses, o aluno aprende exatas e, nos outros seis, humanas, por exemplo. Português e matemática serão lecionados nos dois semestres. A mudança segue uma tendência discutida pelo Governo Federal de reestruturação dessa etapa da educação. O DF conta com 86 escolas de ensino médio, mas 63 têm capacidade para aderir ao sistema. No novo modelo, as turmas serão reduzidas pela metade. Se uma classe tem 30 alunos, por exemplo, 15 estudarão um bloco de disciplinas e os demais as outras matérias.
O revezamento em dois blocos proporcionará um contato mais intenso com os docentes, além da oportunidade de se aprofundar mais em cada disciplina. ;Em vez de ver o aluno duas vezes por mês, o docente poderá passar mais tempo com ele a cada semestre para ampliar o debate;, ressalta o secretário de Educação, Denilson Bento. Com a mudança, ele pretende mudar a atual colocação do DF no ranking nacional na qualidade de ensino. ;Ocupamos o segundo pior lugar em reprovação. Estamos trabalhando para mudar isso;, disse.
Mas a pesquisadora da UCB Leda Gonçalves faz algumas ponderações quanto à mudança. Ela acredita que o modelo semestral pode prejudicar o desempenho dos candidatos a uma vaga no vestibular. ;A aprendizagem é um processo contínuo. O aluno estuda o ano inteiro para vivenciar uma avaliação depois. Ao mudar isso, você prejudica o candidato;, avaliou.
Já o professor colaborador da Universidade de Brasília (UnB) e doutor na área de educação Carlos Augusto de Medeiros está otimista quanto à proposta apresentada pela Secretaria de Educação. ;Se o aluno vai ter menos componentes para estudar, vai poder focar mais em cada disciplina e terá um conhecimento mais profundo de cada uma. Assim, no fim do ano, retomar esses conteúdos será mais fácil;, acredita.
Mas, para que a experiência tenha sucesso, ele sugere que as instituições de ensino invistam em revisões ao final de cada ano escolar. ;É necessário haver um acompanhamento dos estudantes para deixar os alunos afiados para o vestibular;, aconselhou.
63
Número de escolas públicas de ensino médio com capacidade para aderir ao novo sistema de ensino este ano
Como será
1; ciclo ; 1; ao 3; ano
do ensino fundamental
; O Bloco Inicial de Alfabetização (BIA) funciona no DF desde 2005. Esta fase não será alterada. Os alunos instalados nesse modelo são avaliados com frequência, mas sem reprovação. Somente no último ano do ciclo é que eles estão sujeitos à retenção. Caso eles não conquistem nota suficiente para avançar até o ciclo seguinte, podem ser retidos por um ano ou somente por três meses até conseguirem atingir o patamar de aprendizado necessário para o avanço.
2; ciclo ; 4; ao 5; ano
do ensino fundamental
; O BIA será ampliado para essas séries. A partir do ano letivo de 2013, não haverá reprovação na passagem de uma série para a outra. Isso só ocorrerá no avanço para o 6; ano. Caso o aluno reprove nesta etapa, pode ser retido por mais um ano até recuperar o conteúdo que não sabe. Porém, essa retenção é diferente do atual sistema de ensino. Se o aluno alcançou o desempenho necessário em português, por exemplo, mas ainda tem deficiência em matemática, ele terá aulas focadas nas dificuldades dele até que esteja nivelado com os outros estudantes.
; Em 2013, essa mudança só é obrigatória em cinco regionais de ensino, com capacidade para implementar o sistema: Santa Maria, São Sebastião, Recanto das Emas, Núcleo Bandeirante e Guará. São 70 escolas e 35 mil alunos atingidos.
3; ciclo ; 6; ao 9; ano
do ensino fundamental
; Não haverá mudanças nessa fase. O ensino continua seriado, com avaliação anual, com possibilidade de retenção caso o aluno reprove. Hoje, somente três escolas no DF têm condições de mudar o sistema seriado para o de ciclos nesta fase. Caberá a elas fazer a escolha sobre o que pretendem adotar. Nenhuma instituição será obrigada a mudar o modelo de aprendizagem ainda em 2013. O estudo é de que haja mudanças em 2014.
4; ciclo ; 1;, 2; e 3; anos
do ensino médio
; Continua a ser seriado, mas o ensino ocorrerá por semestres. Na antiga metodologia, os alunos tinham até 19 matérias divididas durante todo o ano letivo. Com as mudanças definidas pela nova política educacional, o ensino será reorganizado por áreas de conhecimento.
; Valerá somente para as escolas exclusivas de ensino médio, com número de turmas pares. Serão afetadas 63 instituições desse tipo, entre as 86 do DF.
; Funcionará com a divisão dos alunos por área de conhecimento. Em uma turma de 30 alunos, por exemplo, 15 estudarão exatas no primeiro semestre e 15, humanas. No segundo semestre, isso é invertido.
; Caso o estudante fique de recuperação em um a disciplina, ele terá três chances para melhorar. Serão duas recuperações ao longo do semestre no qual a matéria é ministrada e mais uma no fim do ano. O aluno ainda avança de série por meio da dependência. Ele pode reprovar em até duas matérias e ir para a série seguinte com o compromisso de recuperar a nota nas disciplinas anteriores.
Três perguntas para
Denilson Bento da Costa, secretário de Educação do DF
De que forma o sistema
de ciclos ai melhorar o
aprendizado dos alunos?
Esse modelo é melhor no sentido que dá mais oportunidades de o professor vivenciar com esse aluno as experiências pedagógicas em vez de avaliá-lo em uma determinada circunstância. Há tempo necessário para trabalhar com esse estudante uma atividade lúdica, pedagógica, com ações fora da sala de aula. Além disso, o tempo de aprendizagem é maior. Cada um tem um tempo diferente de aprendizagem e o ciclo proporciona que ele aprenda dentro da capacidade dele. O modelo seriado, não.
O sistema de ciclos diminui a
reprovação por ter avaliações mais
espaçadas. Isso não mascara os índices?
Não necessariamente a reprovação diminuirá. Obviamente, depende da aprendizagem desse aluno e do que é ensinado a ele. É obvio que o bloco tem um tempo maior por ser de dois ou três anos consecutivos, mas, ao longo desse tempo, são feitas avaliações periódicas. No ano, você tem 3, 4, 5 ou 10 avaliações, depende muito da escola. Isso significa dizer que tem mais tempo, mais condições de aprender. A reprovação cai, mas não será eliminada.
Essa mudança ocorre devido
à queda dos índices de qualidade
no ensino do DF nos últimos anos?
A qualidade da educação no DF vem caindo ao longo dos últimos 10 anos. Já fomos o primeiro do ranking nos sistemas de avaliação da educação e é impraticável que o DF seja hoje o segundo pior em reprovação no ensino médio do país. Com a semestralidade, o aluno terá muito mais contato com o professor. Teremos um interstício muito menor em relação aos conteúdos. É impraticável você ter, no ensino médio, 15, 16, 19 disciplinas. A semestralidade divide isso e dá condições a um projeto que incentive o aprendizado e não a decoreba.
"É uma imposição desnecessária"
A política anunciada a menos de um mês do início das aulas na rede pública do DF preocupa especialistas e representantes de classe. O Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro) lamenta a decisão da Secretaria de Educação de implementar o novo sistema em 2013. ;O plano não foi apresentado à categoria. Os professores vão para as salas de aula em alguns dias sem saber como vai funcionar. É uma imposição desnecessária, que poderia ter sido debatida;, ressaltou o diretor da entidade representativa, Washington Dourado.
Para ele, se o governo não investir em materiais pedagógicos e na contratação tanto de professores quanto de psicólogos, fonoaudiólogos, nenhum modelo, por melhor que seja, funcionará. ;Se não forem realizadas melhorias na rede, qualquer projeto será um fracasso;, lamentou o diretor. Ele ressalta que a insatisfação da categoria com a falta de informação já foi demonstrada em assembleia e duvida ainda dos resultados. ;Nunca se falou em qualidade, mas sim em alterar índices de aprovação e reprovação. Não é assim que a educação deve ser pensada;, disse.
Surpresa
O presidente da Associação de Pais e Alunos das Instituições de Ensino do DF, Luís Cláudio Megiorin, também afirmou ter sido pego de surpresa. Ele diz estar descrente quanto à melhora prometida para os níveis fundamental e médio. ;Sem a cooperação dos professores e dos pais, não vai funcionar;, afirmou.
Para Megiorin, é, sim, importante reforçar a atenção aos cinco anos iniciais do ensino fundamental. Mas ele vê com desconfiança a maneira como o sistema público tem lidado com a questão. ;Sem a perspectiva de reprovação, qual vai ser o estímulo que os alunos vão ter para estudar?;, indaga. ;O estudante vai levar as dificuldades que tiver para os anos posteriores, até chegar à universidade;, aposta.
O especialista em política educacional Erasto Fortes Mendonça também critica a maneira como o GDF fará as mudanças no ensino público. Apesar de ser defensor do modelo de ciclos, Fortes está pessimista em relação às alterações pela falta de espaço dado aos professores no debate do tema. ;Querem implantar uma política que tem tudo para dar certo em um ambiente desfavorável. Como está sendo imposto, tende a não dar certo;, pondera.
Embora não seja a favor da implementação imediata da medida, o Sinpro pretende fazer panfletos explicativos sobre o novo modelo. ;Não vamos para a Justiça discutir uma política de educação. Isso deve ser feito com os profissionais da categoria, pais e interessados. É isso que faremos;, completou Washington. (MA e BV)