O consumo precoce de drogas tem gerado graves efeitos cognitivos e afastado cada vez mais crianças e adolescentes da escola. Substâncias presentes no álcool, na maconha, na cocaína,nocrack e eminalantes, entre outros, gerama perda das conexões sinápticas do sistema nervoso central, responsáveis pela capacidade de entendimento. Essaincompreensão causada pelo efeito dessas substâncias é um dos motivos pelos quais um jovem se afasta dos estudos. Especialistas ouvidos pelo Correio explicam ainda que quem começa a usar drogas muito cedo está mais vulnerável à depressão, ansiedade e doenças como o mal de Alzheimer.
De acordo com o neuropsicólogo do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP) Paulo Jannuzzi Cunha, em adultos, as drogas atuam no cérebro e causam deficit cognitivo em virtude de alterações neurofisiológicas. Nos jovens, porém, os efeitos são mais devastadoresem razão de as substâncias químicas impedirem que o cérebro realize o processo de maturação, como ocorre naturalmente emoutras crianças e adolescentes.
A alteração nos jovens pode ser aguda ou crônica. Na primeira, as células neuronais são comprometidas por conta do consumo recente. Na segunda, as sequelas podem ser permanentes. ;Odano pode ser irreversível porque temos que pensar no cérebro do adolescente como um campo muito mais vulnerável que o do adulto;, explica Jannuzzi, que atende entre 25 e 30 adolescentes por mês no consultório e noHospital das Clínicas de São Paulo. O número é maior que a quantidade de adultos, geralmentre entre 15 e 20 atendimentos.
Crack
Os efeitos da droga são diferentes em cada pessoa e dependemda quantidade e da frequência do consumo. Entretanto, o crack é tido como o mais perigoso devido à composição química derivada da sobra da pasta base da cocaína somada a outras misturas impuras como amônia, bicarbonato de sódio, gasolina e até solução de bateria. O crack causa diversos problemas respiratórios, digestivos e mentais sérios. O efeito psicoativo tem curta duração e, portanto, a sensação de fissura dura poucos minutos, motivo pelo qual os usuários sentem necessidade de consumir mais pedras.
Na adolescência, mesmo drogas classificadas mais leves, como a maconha, são consideradas altamente prejudiciais no curto prazo. Dos pacientes entrevistados por Jannuzzi, entre70%e80% já apresentam sintomas psiquiátricos graves,comosurtos psicóticos, síndrome do pânico e esquizofrenia. ;Estudos internacionais falamquenãoprecisa terumcontato prolongado com a maconha, mas, dependendo da quantidade consumida, a chance deousuário ter esquizofrenia aumenta em quatro vezes. Isso é pior atualmente porque a maconha vendida hoje é 10 vezes mais potente do que a utilizada anos atrás;, explica o especialista.
Para jovens em idade escolar, o consumo de qualquer tipo de entorpecente afeta a capacidade de entendimento dos assuntos abordados em sala de aula. ;As substâncias podem trazer lentidão no processo cognitivo porque a velocidade com que uma célula comunica com outra fica mais lenta;, destaca Jannuzzi. Além disso, dependentes químicos passam a ter dificuldade na articulação das palavras e problemas psiquiátricos, como depressão e ansiedade.
Maconha X neurônios
Doutor em psicobiologia pela Universidade de São Paulo (USP) e professor da Universidade de Brasília (UnB), José Eduardo Pandossio explica que os efeitos das drogas variam de pessoa para pessoa e são mais ou menos intensos, dependendo do tipo utilizado. Oespecialista destaca que o consumo de maconha por parte dos jovens pode ser devastador ao longo do tempo. ;A maconha é um alucinógeno,eos efeitos(mais sérios) são causados pela cocaína e crack.Mas não quer dizer que a erva seja mais leve. Fumar maconha mata neurônios e existe de fato uma dependência. Se uma pessoa tem menos neurônios, o cérebro tem menos possibilidade de formar novas conexões sinápticas;, diz o especialista.
A psiquiatra do Serviço Especializado de Álcool e Drogas e professora voluntária do Laboratório de Psiquiatria da UnB,Maria CéliaVitor de Sousa Brangioni, afirmaque todas as drogas são substâncias psicoativas. ;Elas agem em uma área especifica do cérebro, no chamado sistema de recompensa. Esse sistema é responsável por dar a sensação de prazer ao corpo, assim como acontece quando estamos comendooutendo relações sexuais. A droga entra nesse circuito e faz com que o cérebro acredite que aquilo seja necessário;, explica.
Além do cérebro, a droga afeta outros órgãos. ;Temos como exemplo o fígado, no caso do consumo de bebidas alcoólicas, e os pulmões, no caso do uso do cigarro. São diversas as possíveis doenças relacionadas ao uso de drogas. Vão desde o envelhecimento precoce ao câncer. A maconha está relacionada a alterações de memória. O uso dessa droga por estudantes repercute na aprendizagem do aluno e tem relação direta com frequência escolar, alterações de comportamento, ansiedade, irritabilidade, hostilidade e depressão;, diz.