Correio Braziliense
postado em 08/05/2020 21:09
Da próxima segunda-feira (11/5) até 22 de maio, estarão abertas as inscrições para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Mesmo com a mobilização da classe estudantil com protestos virtuais, como a hashtag #AdiaEnem, o Ministério da Educação (MEC) segue com os planos, ignorando os efeitos da pandemia mundial do novo coronavírus, que nesta sexta-feira (8/5), atingiu a marca de 9.897 mortos só no Brasil.
A União Brasileira de Estudantes Secundaristas (Ubes) convocou, por meio das mídias sociais, o Dia Nacional Pelo Adiamento do Enem, uma manifestação virtual marcada para 15 de maio.
“#AdiaEnem é o apelo de cada estudante, jovem ou adulto que entende a importância dessa prova como a maior porta de entrada para o ensino superior no Brasil. #AdiaEnem é por todas as famílias que ainda sentem na pele, diariamente, a desigualdade. É também por toda a nossa população, porque pintar a universidade de povo é o que garante um futuro de esperança para o nosso país”, diz uma parte do texto publicado no Instagram da entidade.
Rozana Barroso, a nova presidente da Ubes, avalia que as escolas públicas não têm a mesma estrutura tecnológica da rede particular, além disso os alunos também não têm recursos para acompanharem as aulas a distância. “As escolas públicas, ainda hoje, trabalham com quadro branco e giz. A realidade da casa das pessoas, em maioria, é a de quem não tem um quarto sozinho, computador, boa internet, uma estrutura igual a que passa atualmente no comercial do MEC, como se toda a juventude brasileira tivesse acesso a isso.”
Para Rozana, manter o calendário do exame demonstra descaso do MEC com os estudantes. “Milhares de brasileiros estão sofrendo por causa do coronavírus;para nós, é muito irresponsável agir como se nada estivesse acontecendo. Como pode acontecer uma prova tão importante em um momento como este, em que a maior parte dos estudantes não têm acesso a educação a distância?”, questiona.
A presidente da Ubes reforça que o adiamento do Enem é de suma importância para defender o direito de todos os estudantes brasileiros a ingressarem no ensino superior. “Meu cursinho popular nem conseguiu começar as aulas. Eu, que sonho em ser a primeira da minha família a entrar em uma universidade federal, estou tendo os sonhos destruídos”, diz.
Saiba Mais
A escolha de 15 de maio para a manifestação virtual não foi feita ao acaso. “Faz um ano do tsunami da educação, que foi quando os estudantes brasileiros ocuparam as ruas para poder barrar os cortes das universidades federais”, explica. O cronograma da manifestação prevê programação para todo o mês de maio, com twittaço, debates, conteúdos, tudo on-line.
No Congresso Nacional
Tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado propostas para a data do Enem. O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) apresentou projeto para suspender os editais do governo federal que determinam as datas para a realização das provas deste ano (PDL 137/2020). A senadora Daniella Ribeiro (PP-PB) é autora de um projeto que muda as datas das provas (PL 1277/2020), prevendo a prorrogação automática até que estejam concluídos os respectivos anos letivos nas instituições de ensino público e particular.
O que pensa a comunidade escolar
Rodrigo Oliveira é professor de história no ensino médio de uma rede particular de Goiânia. Para ele, o Enem deve ser adiado por respeito ao princípio de equidade estabelecido na própria matriz formadora da prova. “Acreditar que, em meio à pandemia, todos os estudantes estão tendo as mesmas condições de estudo é um equívoco. Mesmo que a prova já seja marcada por inúmeros problemas que acabam segregando muitos ao seu acesso, manter a data da prova impressa é escancarar a desigualdade enquanto regra”, protesta.
O professor, que participará da manifestação virtual de 15 de maio, completa: “É defender que os mais pobres não têm o direito de acesso às universidades. Em um país que poucos têm acesso regular à internet, que tem uma clara marcação de cor e regional nas condições de moradia, a manutenção da data deve ser repudiada por todos os que acreditam na educação como caminho para uma sociedade justa”, reflete.
E se o senso de responsabilidade não é suficiente para que o MEC adie a prova, Rodrigo ainda apresenta dados, retirados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2018. “Vale destacar que: 33% (69 milhões) da população brasileira não têm acesso à internet; que entre os 67% conectados, 56% usam celular como única forma de acesso e que, desses, 51% acessam por contas pré-pagas. Como vão manter a conexão em tempo de pandemia, redução salarial e desemprego? Como terão aulas remotas e/ou a distância dessa maneira? Além disso, temos 52% da população sem moradia digna.”
Pedro Henrique Santos Souza, 18 anos, é estudante do cursinho pré-vestibular comunitário, Galt Vestibulares. Sonhando em cursar direito na Universidade de Brasília (UnB), o aluno oriundo de escola pública veio do interior da Bahia para morar com os tios e a prima em Vicente Pires (DF).
Na rotina de estudos, conta com o celular e o notebook emprestado da prima. “Estudo todos os dias, de segunda à segunda. Eu estou estudando por meio dos conteúdos repassados pelos professores do Galt, e também utilizo as atividades do Descomplica. Temos acesso devido à parceria do Galt com a plataforma. Tento assistir a videoaulas diariamente para conseguir ampliar meus estudos, não ficar apenas nos assuntos dados no Galt”, explica.
“Acredito que a maioria dos estudantes não dispõe de meios para estudar. É que todo esse sacrifício deve ser levado em conta pelo Ministério da Educação”, diz. Pedro se preocupa com o próprio futuro e o dos colegas. “Eu, enquanto aluno do Galt, ainda tenho acesso a esse material de estudo, mas e os outros alunos da rede pública? Eles também precisam de ajuda, entende?”, comove-se.
Confira o calendário de datas para o Enem 2020
- 11 a 22 de maio: Inscrições pelo site
- 11 a 28 de maio: Pagamento da taxa de inscrição
- Outubro de 2020: Divulgação do cartão de confirmação da inscrição
- 1º e 8 de novembro: Prova impressa
- 11 de novembro: Divulgação de gabaritos da prova impressa
- 22 e 29 de novembro: Enem digital
- 2 de dezembro: Divulgação de gabaritos do Enem digital
- Janeiro de 2021: Divulgação de resultados e abertura do Sisu
É importante reforçar que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) vai garantir a gratuidade da taxa de inscrição a todos os participantes que se enquadrarem nos perfis especificados nos editais do Exame Nacional do Ensino Médio, mesmo sem o pedido formal dos inscritos.
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