Poeta e professor de português: Coordenador do Colégio Presbiteriano Mackenzie Brasília e professor da secretaria de Educação do DF
;A linguagem é uma fonte de mal-entendidos.; Essa frase da Raposa, na obra O Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry, justifica, em grande medida, a necessidade de ampliarmos nossos conhecimentos linguísticos e, por conseguinte, desenvolvermos nossa capacidade de comunicação. Motivo de preocupação para os educadores da área de linguagens, códigos e suas tecnologias, infelizmente a baixa proficiência dos candidatos no Enem parece comprovar o pensamento da personagem.
Cabe ressaltar que as competências e habilidades avaliadas no exame, particularmente no que se refere à língua e à literatura, consubstanciam saberes elementares necessários a um candidato que pretende prosseguir estudos em nível superior. Ou seja, diferentemente dos processos seletivos de outrora, não se trata de uma prova carregada de termos e nomenclaturas gramaticais complexos e/ou estudos detalhados de literatura.
Então, o quê fazer para melhorar o desempenho? O primeiro passo é compreender a estrutura da prova. Apresento, a seguir, orientações que podem ajudar o candidato nesse desafio.
De modo geral, trata-se de um exame que avalia se os candidatos compreendem bem o que leem, decodificando o texto, captando ideias explícitas e implícitas, pressupostos, desvendando estratégias argumentativas e estabelecendo relações intra e extratextuais. Além disso, no caso da redação, mede se eles conseguem expressar, por escrito, de modo organizado, bem articulado, consistente, claro e objetivo, suas ideias a respeito de determinado tema. Obviamente, quem domina a norma-padrão e as variações linguísticas, com a consciência da necessidade de adequação da linguagem a cada contexto, leva vantagem sobre aquele que se limita a memorizar regras e, por vezes, até pratica o preconceito linguístico, postura condenada no certame.
Nesse contexto, o reconhecimento das funções da linguagem, que se vinculam à intencionalidade da produção textual, é imprescindível. Afinal, uma construção aparentemente ingênua, por exemplo, pode revelar uma fina ironia (Machado de Assis que o diga), a depender do contexto.
Para melhorar o nível de leitura, é fundamental, ainda, que o estudante conheça as peculiaridades dos diversos gêneros discursivos com que convive. São muitas: tirinhas, charges, cartuns, piadas, crônicas, fábulas, romances, notícias, diários, autobiografias, artigos enciclopédicos, resumos, relatórios científicos, textos de opinião, resenhas críticas, editoriais, regras de jogo, manuais de instruções, bulas, receitas, mensagens eletrônicas, peças publicitárias, entre tantos outros. A julgar pela extensão dessa lista, percebe-se que, apesar do nome, o Enem vai muito além do ensino médio e da sala de aula!
Ganham destaque as composições que conjugam as linguagens verbal e não verbal, procedimento muito comum na comunicação da era digital. E, por falar em modernidade, é desejável que o jovem do século 21 esteja antenado e perceba o impacto das novas tecnologias não somente na dinâmica da comunicação, mas também nas relações interpessoais. Em ano eleitoral, as famigeradas fake news ilustram bem esse fato.
No âmbito da literatura, soma-se a tudo isso a importância de que o leitor seja capaz de reconhecer o texto literário ; pelos aspectos que caracterizam a escrita artística ; e, conhecedor dos diversos gêneros e estilos literários, relacionados aos respectivos contextos históricos, compreenda-o, assumindo uma postura crítica diante dessa produção. Foi-se o tempo em que era suficiente saber datas, obras, autores e características para sair-se bem.
Enfim, uma boa preparação para o Enem passa pelo investimento forte em leitura ; de textos e do mundo. Se, com esse trabalho, os mal-entendidos referidos na fala da Raposa deixarão de existir? Certamente, não. A natureza humana está impregnada de contradições! Indubitavelmente, porém, serão minorados.
Boas leituras e bom Enem!