Jornal Correio Braziliense

Renato Russo

No ano em que escrevia sua peça nunca encenada, Renato adotava o nome Russo

Em 1982, o cantor também fundava a Legião Urbana

Renato Manfredini Jr. se debruçava com prazer sobre a obra de Edgar Alan Poe, Walt Whitman e Eça de Queiroz. Lia poesias em inglês e estudava a história do rock com rigor acadêmico. Versava sobre filosofia e cinema para os amigos, e para os amigos dos amigos, que frequentavam os bares do Plano Piloto e o afamado apartamento no Bloco B da SQS 303. Em 1982 ; mais precisamente em 27 de março ; , o estudante de jornalismo do Ceub completava 22 anos, mesmo ano em se iniciava a Guerra das Malvinas, que morriam Elis Regina e Adoniran Barbosa e que a Copa do Mundo acontecia na Espanha. Fora do Aborto Elétrico desde fins de 1981, Renato envereda por caminhos que iriam culminar numa drástica guinada em sua carreira ; e em sua vida.

No mesmo ano em que escreveu A verdadeira desorganização do desespero, o então rapaz apresentou-se como Trovador Solitário pelas esquinas do Distrito Federal, como na Feira de Arte e Cultura de Taguatinga (Faculta), e fundou a Legião Urbana. Um rito de passagem da era punk para a maturidade. Renato Manfredini Jr. virava Renato Russo. O novo sobrenome fazia referência à época que, trancado em seu quarto, ele criara em um caderno o grupo de rock imaginário 42th Street Band. As anotações de Renato traziam todos os detalhes sobre a banda, comandada pelo fictício vocalista Eric Russel. Este segundo nome mesclava sua admiração pelo pensador inglês Bertrand Russel, o filósofo Jean-Jaques Rousseau e o pintor Henri Rousseau. Quando foi sua vez de perseguir a fama, Renato tomou a alcunha para si.

Munido de uma craviola de 12 cordas, o Trovador Solitário deixava de lado a porção elétrica do Aborto para dar vazão a uma sonoridade acústica, com boas doses de folk à Bob Dylan, um de seus mestres. Nessa época, suas letras ficam mais elaboradas, afinal, elas seriam ouvidas de verdade pelo público dos shows que abriria na cidade. No Aborto, a barulheira, muitas vezes, escondia o teor e o sentido das composições.