; Ana Maria Campos
; Tércio Amaral
Recife e Brasília ; O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, descartou ontem a necessidade de a Justiça conceder proteção ao empresário Marcos Valério, que, no fim de setembro, propôs colaborar com o Ministério Público em troca de um benefício de delação premiada. Segundo Gurgel, não há nada que justifique uma providência imediata. Diante das especulações quanto a uma possível diminuição das penas de Valério, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres Britto, ponderou que a possibilidade de redução da pena ;é viável;. No entanto, as punições aplicadas até agora são consideravelmente menores que o máximo previsto pelo Código Penal.
;A notícia que me foi transmitida (por Valério) foi de que não havia nada que justificasse uma providência imediata. Agora, se ele viesse a fazer novas revelações, esse risco poderia se consubstanciar;, destacou Gurgel ontem, durante entrevista em Aracaju, onde participa do Encontro Nacional do Judiciário.
O procurador-geral confirmou que Valério adiantou ao Ministério Público que poderá fazer novas revelações relativas ao escândalo do mensalão. Entretanto, Gurgel reiterou que qualquer vantagem ao empresário, como a eventual diminuição das penas, não atingirá o processo em andamento no Supremo, mas apenas outras ações a que ele responde na primeira instância da Justiça.
No Recife, onde participou de uma solenidade no Tribunal Regional Federal da 5; Região, Ayres Britto admitiu que Valério poderá ter a pena amenizada antes do término da fase de dosimetria, embora tenha frisado que a possibilidade do benefício nada tem a ver com o pedido de delação. ;Claro que, no plano das possibilidades, é viável;, declarou. ;É uma questão técnica. Teoricamente, tudo é possível quando do ajuste final do que nós chamamos de dosimetria;, completou.
Desde o fim do cálculo das penas relativas ao operador do mensalão, os ministros da Suprema Corte vêm falando reiteradas vezes sobre a possibilidade de revisão da pena fixada até o momento em mais de 40 anos de cadeia. Ministros ouvidos pelo Correio, porém, avaliam que Valério não deu contribuições suficientes, durante a fase de instrução do processo, que justifiquem o abrandamento da pena que lhe foi imposta.
;Não sei com o que ele teria colaborado nesse processo. Para diminuir a pena, teria que considerar a colaboração dele quanto a esse processo e, por enquanto, o relator não colocou nada. Vamos ver se surge. Seria até possível (reduzir a pena), mas temos que aguardar um pouco. Com a palavra, o relator (Joaquim Barbosa);, disse o ministro Marco Aurélio Mello.
Marcos Valério teria revelado em seu depoimento ao Ministério Público, em setembro, informações sobre o assassinato em 2002 do prefeito de Santo André à época, Celso Daniel (PT), e teria citado também o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-ministro Antonio Palocci. Em troca das novas informações, Valério pretende obter a redução de sua pena e ser incluído no serviço de proteção à testemunha. ;Isso (a possibilidade de redução da pena) é com base no que já se encontra nos autos. Não tem nada a ver com o que ele falou;, disse Britto.
Punição
Único réu que já teve todas as penas calculadas pelo Supremo, Marcos Valério soma, por enquanto, uma punição superior à aplicada a muitos acusados de crimes como homicídio e latrocínio. No entanto, o Supremo não fixou a pena máxima prevista na legislação brasileira em nenhum dos crimes apontados contra o empresário, mesmo sendo ele o chefe do núcleo operacional do esquema. A soma de 40 anos, segundo ministros, é justificada pelo excesso de crimes cometidos por Valério.
O procurador da República Hélio Telho, que tem acompanhado o julgamento, avalia que as penas aplicadas pelo STF até agora para Marcos Valério não são altas porque estão bem longe do máximo previsto no Código Penal e em leis específicas. ;Se esse caso do mensalão não justifica pena próxima da máxima, qual caso justificaria? A pena máxima não é uma utopia, existe para ser aplicada;, afirmou. ;As penas individualmente consideradas estão aquém da gravidade dos fatos e do grau de reprovabilidade das condutas dos réus;, acrescentou. Segundo o integrante do Ministério Público, a pena de 40 anos definida para Valério resulta da soma de vários crimes aos quais ele foi condenado.
O Supremo retomará amanhã o julgamento do mensalão, que está na fase de dosimetria das penas. A análise da Ação Penal 470, que está interrompida há 13 dias, vai ser reiniciada a partir do cálculo das punições de Ramon Hollerbach, ex-sócio de Valério.