Às 9h30 de 21 de abril de 1960, Juscelino Kubitschek abria as portas de Brasília para famílias de todo o país. Aos poucos, mães e patriarcas, vindos das mais várias regiões do país, adotaram a nova capital como lar e a transformaram em um reduto da diversidade. Cinquenta e sete anos depois, a cidade presencia a aparição da terceira geração candanga e esbanja o florescimento de uma identidade genuinamente brasiliense.
Individualidade esta que é percebida na cena artística, no linguajar e, principalmente, na gastronomia. Com temperos provenientes de todos os estados do Brasil (e do exterior), a capital cria e recria receitas com potencial ; modéstia à parte ; para revelarem-se tão icônicas quanto os traços arquitetônicos brasilienses que encantam o mundo. Hoje, quem vem a Brasília, além de guardar na memória as obras de Oscar Niemeyer e a imensidão azul do céu, carrega no paladar o gosto dos sabores candangos.
Essa singularidade é resultado das empreitadas de dezenas de amantes da culinária que, além do aspecto comercial, importam-se com as sensações despertadas ao saborear bons pratos. É o caso de André Batista, que iniciou, em 2014, uma produção de linguiças. Farto de produtos industrializados e similares, com a marca Cacciatore Charcutaria, o cozinheiro oferece ao público, por R$ 20 (600g), três variações inusitadas do embutido, feitas de forma integral em sua propriedade: de barriga de porco com defumação a frio; de chorizo de Rueda com vinho tinto, páprica e ervas à de pimenta-jalapenho com cominho.
;Brasília carecia de um produto bom, com diferenciais. Senti a existência de um nicho no mercado que, se preenchido, poderia me beneficiar e agradar ao público;, pontua André. Diante das possibilidades, ele arregaçou as mangas, listou fornecedores e abriu espaço para a criatividade. O processo, com o tempo, tornou-se simples e produtivo.
As delícias fazem sucesso na Mercearia Colaborativa, da qual o cozinheiro é sócio. Ao todo, ele vende 200kg de embutidos por mês (para donas de casa e restaurante). O cardápio já foi bem maior: eram 12 sabores diferentes e 1,2 tonelada de linguiça entregues ao consumidor por mês. Mas, como o produto é totalmente tratado de maneira artesanal, para manter a qualidade em alta, André optou por diminuir o negócio. Uma questão de respeito ao cliente.
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O apreço pelas receitas é estampado nos braços: ao lado direito, tatuagens de facas antigas e, ao esquerdo, imagens de vacas, porcos e carneiros. ;Fiz gastronomia pela profissão, claro, mas também pelo amor. Quero que o consumidor sinta isso ao provar meus embutidos;, brinca.
Qualidade em primeiro lugar
O zelo durante a produção dos alimentos, inclusive, é consenso entre os que estão à frente da cozinha brasiliense. Na sorveteria Oni-Uno, cada fruta levada à máquina de mistura é cortada pela proprietária do estabelecimento, Vanessa Jair. Mas a mistura dos ingredientes é a última etapa. Antes disso, a moça retira das prateleiras de frutarias ; ou das caixas de produtores locais ; as bananas, maracujás, mangas, amoras e afins previstas para as receitas. Também é ela quem busca o leite fresquinho em fazendas do território candango.
Satisfeita, com todos os componentes em mãos, segue para a pequena loja, situada no subsolo da quadra 103 do Sudoeste. No laboratório, a criatividade não tem limites: misturas e mais misturas. Afinal, ;dá para fazer sorvete de tudo;, como Vanessa gosta de ressaltar.
A empreitada começou em 2015. Amante de gelatos, a moça desbravou cursos em São Paulo para tornar-se apta a produzir os próprios sorvetes, que inclui frutas da região. Há dois meses, deixou de lado a ortodontia, profissão que garantia a renda mensal, e se jogou no novo negócio. ;Faço questão de participar de todas as etapas. Tudo é feito com muito carinho. É importante que o cliente se lembre de cada sensação despertada pelo meu sorvete;, destaca orgulhosa.
O empenho, claro, rende frutos. O gelato é daqueles que instigam pela cremosidade e sabor. Novas experiências estão a caminho. Entre os possíveis gostos, os candangos castanha de baru, cajá-manga e baunilha do Cerrado estarão no cardápio. ;As pessoas pedem bastante. Elas gostam de ter à disposição sabores locais;, acrescenta. O valor dos potinhos varia entre R$ 6 e R$ 14. O estabelecimento fica de portas abertas de terça-feira a domingo, entre 12h e 20h.
Inspiração
E, para garantir a singularidade dos sabores, a participação em cada etapa da produção também é considerada necessária pela dupla, mãe e filho, Luci Maeda e Ricardo Maeda. Na estância que leva o sobrenome de mãe e filho, a 30km do centro da capital federal, eles preparam o Doce de Leite D;Alice. Todo o processo ocorre na propriedade ; da pastagem das vacas à colagem dos selos nos potes de entrega.