;É da riqueza que sai o benefício;, diz, a certa altura do documentário de Heloísa Passos, o pai da diretora, um engenheiro aposentado que abastece, com conteúdo e alguns impropérios, o longa Construindo pontes. De evidente bom berço, criada num período em que o pai teve por dividendos as 22 obras monumentais criadas sob gerência de militares, a diretora tem como proposta a exposição de perdas familiares e do senso de brasilidade derivado da implantação da ditadura que o pai teima em chamar de revolução.
Estreante, e mais conhecida pela direção de fotografia de belos longas como Mulher do pai e Viajo porque preciso, volto porque te amo, Passos, como personagem de um enredo em que quer relativizar o crescimento experimentado no país dos anos de 1970, se mostra exasperada e, por vezes, unilateral. O senhor Álvaro, por certo, testa limites de paciência, no verdadeiro ringue doméstico. Entusiasta do caráter rigoroso (com prazos cumpridos e obras entregues) e de alguns acertos do governo militar, o velho engenheiro evoca (e provoca) a tese de que fins justificam os meios (onde chegaria a aprovar até mortes).
Tal como água e óleo, desde o princípio do filme, é possível notar o descompasso (e onde a narrativa desembocará): contrastada com a objetividade do pai, Heloísa busca a subjetividade de um processo fílmico. A questão de a putrefata desgovernança recente nacional estar aquém (ou não) dos resultados alcançados por militares é um dos elementos a ilustrar Construindo pontes.
Há poética no olhar da diretora (nas cenas de submersão, com a Hidrelétrica de Itaipu), que, com coragem, enfrenta tópicos pessoais como a exposição da sexualidade, um fator de desentendimento, em suspenso, no passado. Depois de mexer com imagens literalmente explosivas (e belas), Passos empreende road movie até o município de Guaíra (Paraná), ao lado do pai, num viés inclusivo. A redenção da protagonista arisca vem justo pela inesperada contribuição do pai, capaz de colocar o desengonçado filme nos trilhos.