Jornal Correio Braziliense

Eleicoes2010

Equipe de transição dos presidentes estará de olho nas contas federais

Quase oito anos depois, a equipe de transição escalada para municiar o presidente eleito de informações sobre o governo verá sem cortes e por todos os ângulos o quadro financeiro e estrutural da gestão Luiz Inácio Lula da Silva. Ex-ministros, parlamentares e especialistas em orçamento ouvidos pelo Correio explicam que, apesar de todos os esforços para garantir a transparência das contas e dos atos públicos, o retrato original de uma administração tem contornos disfarçáveis pelo botox da conveniência institucional. Quem vencer a eleição presidencial em 31 de outubro se debruçará, nos próximos dois meses, sobre um panorama do governo Lula, que terá que abrir dados até então resguardados graças ao argumento da segurança do Estado.

Informações exatas e aprofundadas sobre a relação do país com o Fundo Monetário Internacional (FMI), a gestão da dívida pública, os gastos com despesas de pessoal, o caixa de empresas estatais, o cronograma físico-financeiro de execução de investimentos e a administração dos convênios da União com estados e municípios figuram na lista dos relatórios que serão analisados com lupa pelo novo presidente. Além da agenda financeira, o eleito também será informado dos meandros das Forças Armadas, em especial, o real motivo do impasse na compra dos caças que reforçariam a frota da Aeronáutica.

Euclides Scalco ; ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência na gestão Fernando Henrique Cardoso e integrante da equipe de transição que entregou o governo ao PT depois de oito anos de mandato tucano ; explica que os ministérios da Fazenda e do Planejamento são as pastas que exigem maior atenção. ;A equipe de transição tem acesso a todo o sistema do governo. A parte mais delicada é a econômica. O Ministério do Planejamento também é muito importante, porque reúne dados sobre pessoal.; Scalco lembra que FHC editou em 2002 decreto para regular a transição e pondera que o presidente Lula deveria atualizar a regra com detalhes específicos para a formação da equipe, este ano, devido ao acirramento dos ânimos entre PT e PSDB. ;Nunca houve uma transição tão tranquila como aquela. Acho que, com o quadro que está aí, com o clima que se criou, vai ser difícil.;

Ministro da Fazenda no governo de Itamar Franco, o senador Eliseu Resende (DEM-MG) ; que entregou a Fazenda a FHC ; explica que a transição do ministério é difícil, pois muitas questões estratégicas não deveriam ser repassadas à equipe do presidente eleito, mas ao sucessor direto da pasta de finanças. De acordo com o ex-ministro, apesar de ser tradição na pasta manter relatórios técnicos detalhados sobre o desempenho do ministério, ;tem muita coisa para conversar em estratégia; e somente ;do novo ministro para o antigo; essas informações poderiam ser repassadas de forma segura. ;Na verdade, é um problema básico, fundamental. O ministro da Fazenda, conforme o estilo do novo governo, toma cuidado de preservar dados do comando. No exercício da pasta, ele absorve todo os dados. O ministro pode até ver se é o caso de relatar uma conversa mais reservada e aprofundada que teve com o Fundo Internacional;, exemplifica o ex-ministro da Fazenda.

Defasagem
Coordenador da bancada do DEM na Comissão Mista de Orçamento e estudioso das contas públicas, o deputado Luiz Carreira (BA) aponta a defasagem de R$ 17,5 bilhões em receita identificada pelos consultores do Congresso na rubrica de recursos destinados a pagar o custeio da máquina como um indício de uma futura surpresa para o novo presidente. O impacto real do reajuste dos servidores dos Três Poderes, o aumento do número de funcionários e as manobras financeiras que podem ter maquiado as despesas do governo são informações guardadas com cautela. ;Nesse governo, ficou menos transparente. Usaram uma série de dotações globais em vez de especificar os gastos;, diz.

A gestão da dívida pública e os convênios do governo com sindicatos e ONGs também são apontadas como dados sigilosos, que serão desfiados pela equipe de transição do governo. ;Muitas vezes, o governo superestima a dívida pública para ter uma folga orçamentária. Isso só se saberá com os dados na mão, e quem tem os dados é o governo. A gente também não sabe o que está por trás dos convênios com entidades, sindicatos;, afirma Carreira. O deputado do DEM, no entanto, elogia o Ministério do Desenvolvimento Social como modelo de transparência em gestão.


As preciosidades

Áreas que guardam informações sigilosas e estratégicas que serão analisadas a fundo pelo próximo governo

  • Despesas com pessoal
  • Gestão da dívida pública
  • Convênios com prefeituras, estados, ONGs e sindicatos
  • Informações estratégicas da política financeira internacional
  • Capitalização do Banco Nacional de Desenvolvimento
  • Econômico e Social (BNDES)
  • Gestão do caixa das estatais
  • Execução financeira comparada ao cronograma de execução de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)