Um candidato, dois programas eleitorais gratuitos totalmente diferentes. Na televisão, semblantes tranquilos, sorrisos dirigidos pelos marqueteiros e depoimentos de aliados e militantes exaltando as qualidades daquele que almeja o cargo. Enquanto isso, no rádio, os ataques são mais veementes, os adjetivos são extremamente coloquiais e as tentativas de desqualificar os adversários aparecem de maneira constante. As formatações desiguais, no entanto, não são resultado apenas da linguagem e do tipo de cada um desses meios: o conteúdo apresentado destoa muito, especialmente no quesito agressividade, fazendo lembrar os boatos espalhados por meio de virais na internet.
Tomando como exemplo as peças publicitárias dos presidenciáveis do PT, Dilma Rousseff, e do PSDB, José Serra, as disparidades ficam ainda mais claras. Na propaganda do tucano, divulgada na última quarta-feira, uma narradora contava a tentativa malsucedida da petista como empreendedora em uma loja que comercializava produtos a R$ 1,99. Em seguida, a mesma mulher questionava a capacidade da ex-ministra de administrar o Brasil usando a experiência ruim no comércio. No mesmo dia, ainda no horário de Serra, durante conversa numa oficina mecânica fictícia, um amigo pergunta para o outro em qual ;das duas Dilmas; ele votou: na que fala uma coisa de manhã ou na que tem outra opinião à tarde.
A criação dos programas de Dilma também beira a hostilidade. Na sexta-feira, para responder a afirmações de Serra, a propaganda do PT subiu o tom. ;Eles não param, continuam com esse método sujo de repetição de mentiras;, diz um locutor. ;Eles faltam com a verdade e sem a mínima vergonha;, completa outro. Um dos jingles de Dilma Rousseff faz uma paródia de uma música de José Serra cujo refrão é ;Serra é do bem;. A versão da petista proclama: ;Serra é do bem... Do bem rico, do bem ganancioso, do bem desempregado;. Outros jingles apresentam frases como ;esse tal de Serra não trabalha legal, só dá pedágio e porrada em professor; e ;Zé promessa, Zé conversa (;) quando estava no governo não fez nada pro povão;.
A ;criatividade; dos marqueteiros tucanos está à altura da apresentada nos horários de Dilma. Um dos mais populares traz uma letra sobre uma batida empolgante produzida a partir de um pandeiro que remete ao ex-ministro e deputado cassado José Dirceu. ;Toc, toc, toc. Bate na madeira: Dilma e Zé Dirceu, nem de brincadeira;, versam os aliados ligados ao PSDB.
Popular?
Para os políticos dos dois partidos, as campanhas preparadas para o rádio estão dentro do esperado. De acordo com parlamentares que fazem parte das coordenações de campanha, o tom mais agressivo é ;normal; e pode ser explicado pela diferença de linguagem dos meios e pela audiência desses programas. ;Concordo que as críticas são mais agudas. É uma questão de linguagem entre os meios de comunicação. Cada mídia tem seu meio de se expressar e, no rádio, é desse jeito. As campanhas, normalmente, têm seus exageros e suas faltas, mas, na média, não acho que passe do ponto;, afirma o senador Sérgio Guerra (PSDB-PE).
O deputado André Vargas, secretário de comunicação do Partido dos Trabalhadores, considera a linguagem utilizada na corrida ao Palácio do Planalto normal. ;É comum. Não é o melhor, mas é comum. No rádio não tem imagens. Agressão é ruim, mas a crítica política é razoável. É igual quando dizemos que a Dilma lutou contra a ditadura e o Serra fugiu. É uma linguagem popular, mas é um efeito de dois lados porque mostra uma visão preconceituosa também;, explica. ;A audiência é mais popular no rádio;, emenda.
Desrespeito
A justificativa para o baixo nível das propagandas eleitorais gratuitas no rádio não é tão simples assim, segundo Emmanuel Publio Dias, especialista em marketing político da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). ;As propagandas de rádio são ruins ou, pelo menos, piores das que são apresentados na televisão. Os estrategistas colocam essas agressões no rádio porque a audiência, na verdade, é menor. Eles atendem ao lado da campanha que quer ver sangue, atendem à militância, que assiste a todos os programas;, pondera.
Dias classificou como um equívoco a explicação de que a audiência de rádio é mais popular. ;É uma grande bobagem, além de ser um desrespeito à audiência. Achar que o público pode ser mais maltratado é ofensivo. Aliás, a baixa audiência pode ser explicada pela baixa qualidade dos programas;, diz. ;A propaganda eleitoral já foi muito boa. Foi revolucionária quando foi criada, mas continua a mesma há 25 anos. Não houve avanço. Atualmente, é preciso mais integração com as novas mídias.;