Jornal Correio Braziliense

Eleicoes2010

Pelo voto religioso, Dilma promete carta

Perante lideranças evangélicas, presidenciável se compromete a não descriminalizar o aborto e a não enviar projetos que firam crenças religiosas

Sob pressão, a candidata à Presidência da República pelo PT, Dilma Rousseff, comprometeu-se a elaborar uma carta assumindo promessas polêmicas, como não descriminalizar o aborto e vetar, se eleita, o casamento entre homossexuais. Lideranças religiosas e aliados políticos cobraram ontem, durante encontro em Brasília, uma posição mais clara da candidata sobre temas tabus. Entre eles, liberdade religiosa, adoção de crianças por pessoas do mesmo sexo e homossexualidade. O apoio depende da redação desse manifesto e ainda de ;comprometimento; político. Os evangélicos querem marcar território, aumentar a representação no Legislativo e ocupar outros cargos públicos. Só assim estariam dispostos a colocar a tropa de choque nas ruas ; ou melhor ; nos templos.

;Eles perceberam o tamanho da nossa força. Ficaram surpresos com os votos da Marina porque não sabiam como os evangélicos são organizados;, disse um pastor, após a reunião com a candidata em Brasília. Cruzamento de pesquisa Datafolha com Censo/IBGE 2000 mostra que 42,2 milhões de pessoas declaram-se evangélicas, ou 22% da população brasileira.

A reunião, marcada com urgência pela coordenação da campanha petista, teve início no fim da manhã. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva passou rapidamente pelo encontro. Lembrou a boa relação com as igrejas e a vitória dos evangélicos na alteração do Código Civil, ainda no primeiro mandato petista. Pela proposta, as igrejas se tornariam associações civis. Lula cedeu à pressão e manteve a liberdade estatutária das instituições religiosas.

Ao lado de Lula, Dilma citou ;Deus; e reforçou o discurso, repetido exaustivamente nas últimas semanas, de que é contrária ao aborto. Só que desta vez, segundo os pastores, abandonou a tese de que o assunto é questão de saúde pública. ;Ela não pode ter duas opiniões. As pessoas não entendem esse discurso de saúde pública. Tem que ser contra e ponto;, afirmou outro pastor. A candidata ouviu com atenção o cenário traçado pelos líderes. ;Falar mal é fácil. Para falar bem você precisa de argumentação. O problema é que estamos perdendo a guerra por falta de contundência;, disse o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Cruzada


Parlamentares estão organizando uma cruzada nas igrejas. Preparam reuniões regionais para divulgar o manifesto petista e ainda cobram dos pastores a disseminação das ideias da candidata. ;A tarefa não é fácil;, assume o deputado Gilmar Machado (PT-MG). O senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) defendeu o combate aos ;boatos que distorcem; a opinião da candidata. ;Ela não vai encaminhar nem sancionar qualquer coisa que ofenda os direitos religiosos, que descriminalize o aborto ou que promova o casamento homossexual;, repetiu o senador.

Foram convidados 51 representantes de correntes evangélicas. Há uma divisão entre protestantes, igrejas pentecostais e neopentecostais. A coordenação de campanha da petista aproveitou a presença dos religiosos para gravar depoimentos que podem ser usados no programa eleitoral. Seis pastores declararam apoio a Dilma e ainda defenderam as ideias da candidata. Hoje, a ex-ministra tenta aproveitar a agenda no Pará para articular reunião com evangélicos do estado.

SEM INTERFERÊNCIA

A candidata petista evitou comentar a tramitação do Projeto de Lei n; 122/2006 no Congresso. O texto torna crime a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero, equiparando a prática à discriminação de raça. O autor do crime ficaria sujeito a pena, reclusão e multa. Evangélicos são contrários à aprovação da proposta porque acreditam que ela fere a liberdade religiosa. Dilma disse que o assunto está no Legislativo e não pretende interferir na tramitação.

Manifestos contrários

Durante os compromissos em Teresina, Dilma enfatizou a preocupação com a distribuição de manifestos pela Igreja contra sua candidatura e enfatizando que ela seria favorável ao aborto. ;Sei que têm manifestos e posicionamentos absolutamente equivocados a respeito da minha pessoa, da minha campanha e do meu partido. Acredito que isso não contribui para o país;, comentou Dilma. ;É inadmissível que se aceite como padrão de discussão, numa campanha eleitoral para presidente, que a temática seja o preconceito. A temática não pode ser o preconceito;.

Dilma disse que não pode dar direito a um tirando o direito dos outros. ;O preconceito contra o homossexual, temos que condenar. A parte relativa a criminalizar as igrejas, quando dentro delas existe manifestação que elas não aceitam, é um absurdo. Criminalizar é um excesso. Tem que ter equilíbrio;, assinalou a petista. A ex-ministra de Lula afirmou ainda que sua campanha não está mais agressiva, mas em evidência, porque a corrida está focada em dois candidatos.