Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) se enfrentam no segundo turno tendo mais um mês de corrida pelo Palácio do Planalto enfrentando momentos diferentes nas campanhas. O tucano aposta em repensar a estratégia, incrementar a arrecadação financeira e renovar o marketing eleitoral. A petista reúne esforços para manter a militância motivada, espantar o clima de derrota instalado no comitê central e ter o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na medida como cabo eleitoral para garantir uma vitória que parecia consolidada.
A nova rodada de votação despencou como uma derrota no comitê petista, por conta do desempenho abaixo do esperado nas urnas e da surpresa em relação aos votos de seus dois adversários. A concorrente do PV, Marina Silva, foi a responsável por jogar água na estratégia do presidente Lula de transformar o pleito num plebiscito entre os que aprovavam e os que rejeitavam seu governo.
O presidente com quase 80% de aprovação foi incapaz de transferir os votos necessários para a pupila. Dilma acabou com percentual parecido com o de Lula na eleição de 2006. Os principais responsáveis pelo segundo turno são os três maiores colégios eleitorais do país.
No Rio de Janeiro, Dilma conseguiu superar os 43%. Entre o eleitorado mineiro, teve 46% dos votos. Esses dois estados deram mais de 50% a Lula em 2006 e acabaram por compensar a derrota que ele teve em São Paulo. Nesta eleição, a campanha apostava que Dilma conseguiria sair vitoriosa entre os paulistas, mas o resultado frustrou as expectativas: Serra ganhou por margem de quatro pontos. No DF, Marina desbancou os dois.
Arranhões
A eleição ficou apertada para Dilma nas últimas semanas, quando ela foi alvejada pela denúncia que causou a demissão de Erenice Guerra, seu antigo braço direito na Casa Civil, e por uma ressaca dentro do voto conservador de religiosos evangélicos. As denúncias de irregularidades na Receita Federal também serviram para arranhar a imagem da candidata.
Dentro da campanha, uma das causas apontadas para o segundo turno é um erro de estratégia em relação à internet. Os responsáveis pelo marketing on-line foram incapazes de ver o crescimento da pregação contra Dilma em vídeos, e-mails e blogs que exploraram posições mal explicadas dela sobre religião, em especial o aborto. Quando percebeu-se a onda contrária, o remédio surgiu tarde. Dilma reuniu-se com lideranças evangélicas e católicas a três dias da eleição e, no sábado, apareceu para o batizado de seu neto de 23 dias em Porto Alegre. Com a nova rodada de votação, a campanha espera que agora essa investida religiosa tenha efeito e arrefeça as resistências dos conservadores.
Anéis
O segundo turno era tido como tabu porque Dilma não queria abrir ainda mais espaços para partidos como o PTB ou fazer a negociação com o PV. Ela terá de abrir espaço previsto para o PMDB, que tem o deputado Michel Temer (PMDB-SP) como vice e está ávido por apresentar a fatura da eleição, em caso de vitória. Nesse cenário, Dilma vê-se obrigada a ceder todos os anéis das mãos aos aliados e ficar refém das vontades de um grande leque de partidos.
A negociação com Marina Silva (PV) é prioridade. O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai se ocupar das conversas com a ex-ministra. A candidata verde dá sinais de preferir a neutralidade. O presidente do PV, José Luiz Penna, anunciou a preferência por Serra. Por isso, Lula entrará em campo usando como carta o apelo emocional. Marina Silva gosta de falar que suas duas maiores inspirações políticas são Luiz Inácio Lula da Silva e o sindicalista Chico Mendes, morto em dezembro de 1988.
Outra investida do PT é em cima da ala serrista do PTB, personificada no presidente da legenda Roberto Jefferson (RJ) e no dirigente da ala paulista Campos Machado. Esse serviço ficará a cargo do senador Gim Argello (PTB-DF) e de Jovair Arantes (PTB-GO), que apoiaram Dilma.
Jefferson abandonou Serra na última semana e anunciou voto em Plínio de Arruda Sampaio. Mas fazer essa negociação é considerada de alto risco porque representaria um maior cacife para os dois políticos petebistas. Plínio foi o franco-atirador da campanha. Criticou todos. Apesar disso, a cúpula da campanha de Dilma acredita que os eleitores do político do PSol fazem uma migração ideológica para o PT.
A semana começa com a avaliação dos erros, mas os dirigentes querem acelerar as negociações com aliados a exemplo do que Lula fez em 2006, quando na primeira semana já tinha o apoio dos partidos. Os governadores reeleitos serão utilizados como cabos eleitorais. Jaques Wagner (BA), Eduardo Campos (PE) e Cid Gomes (CE) terão agenda no Nordeste para ampliar a votação de Dilma em cima de quem optou por Marina. O trabalho mais relevante estará nas mãos de Sérgio Cabral (PMDB), reeleito governador do Rio de Janeiro, estado em que a candidata verde ficou em segundo lugar.
Análise da notícia
Que onda é essa?
Luiz Carlos Azedo
A razão do segundo turno na eleição para presidente da República tem nome e sobrenome: Marina Silva (PV). Alguns analistas, com certa razão, atribuirão a causa ao alto índice de abstenção (quase 18%) e aos votos nulos (3%) e brancos (5%), que teriam jogado para baixo a votação de Dilma Rousseff (PT) nas periferias e grotões.
Esse elevado índice de abstenção, porém, já era esperado em razão de pleitos anteriores. O que surpreendeu foi a arrancada de Marina na reta final, principalmente no Distrito Federal, no Rio de Janeiro e em algumas regiões metropolitanas, como Belo Horizonte. Nesses colégios eleitorais houve uma onda verde, provocada por eleitores mais preocupados com a questão ambiental e o desenvolvimento sustentável.
Mas não houve apenas isso. Pela primeira vez na sucessão presidencial, o voto religioso ; tanto evangélico como católico ; teve um peso ideológico específico. O alto clero católico apoiou Marina; a cúpula das igrejas evangélicas, não, mas sem conseguir barrar a identificação de muitos de seus fiéis com a candidata do PV.
E no segundo turno, para onde irão esses votos? Em ambos os casos, seja o voto verde, seja o voto religioso, tanto Dilma quanto Serra terão que correr atrás de corações e mentes. Ambos terão que tomar posição em relação à transversalidade da questão ambiental e temas polêmicos sobre comportamento, como a questão do aborto e as relações de gênero.
Do ponto de vista prático, Dilma mantém o favoritismo. Bastaria evitar uma transferência maciça de votos de Marina para Serra. O problema é que esticou a corda com a candidata verde na última semana de campanha; não será fácil receber seu apoio. Além disso, Serra está sendo beneficiado pelo resultado das eleições estaduais em São Paulo, Minas Gerais e Paraná, das quais o PSDB emerge como um robusto partido de oposição em condições de alavancar o candidato no segundo turno.