Jornal Correio Braziliense

Eleicoes2010

Presidente do TRE-SE acredita que o crime não tem relação com as eleições


Aracaju ; Um dia após escapar ileso de um atentado à bala em uma das avenidas mais movimentas de Aracaju, o presidente do Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe (TRE-SE), desembargador Luiz Mendonça, procurou descartar a hipótese de motivação eleitoral para o crime. Após receber alta médica, o magistrado concedeu uma entrevista coletiva na manhã de ontem, na sede do Tribunal de Justiça, e tentou desvincular a emboscada do processo eleitoral no estado. O crime foi o assunto mais comentado na capital sergipana, onde não se tinha notícia de uma ocorrência dessa natureza à luz do dia, muito menos envolvendo uma das maiores autoridades locais.

Bem-humorado e apresentando pequenos ferimentos causados por estilhaços de vidro, o magistrado afirmou que não pretende mudar a sua rotina e disse que nem sequer usará colete à prova de balas: ;Pesa demais;. Por volta de 8h20 da última quarta-feira, o carro oficial do presidente do TRE sergipano parou em um semáforo da Avenida Beira Mar e foi alvo de cerca de 40 tiros de calibres diferentes, disparados por dois homens encapuzados. A dupla contou com a cobertura de outros dois criminosos, que estavam em um carro roubado em Maceió em 8 de agosto. O motorista do magistrado, o cabo da PM Jaílton Batista, levou um tiro na cabeça e, até o fechamento desta edição, continuava internado em estado grave.

O desembargador contou que estava falando ao telefone quando ouviu os primeiros disparos. Ele disse que só conseguiu escapar depois de se jogar no chão do veículo, no espaço entre os bancos traseiro e dianteiro. Ao mesmo tempo, utilizou a submetralhadora do PM, que estava guardada embaixo do banco do motorista, disparando uma vez contra os bandidos, que fugiram em seguida. ;Pelo volume dos disparos, o carro balançava muito. Eu me senti dentro de uma rede. Mas uma rede desconfortável.;

Indagado sobre a possível motivação política da emboscada, Luiz Mendonça disse que a eleição em Sergipe está transcorrendo pacificamente e que o TRE só indeferiu candidaturas que apresentavam falhas formais, como ausência de documentação. ;A (hipótese) de (motivação) política eu descarto totalmente. Eu conheço todos os políticos de Sergipe. A eleição está sendo conduzida de forma pacífica, ordeira, sem qualquer desmando;, disse, negando tratar-se de uma estratégia para desviar o foco da investigação. Conhecido no meio jurídico de Sergipe como um juiz linha-dura, Luiz Mendonça deixou transparecer que a origem do atentado pode estar vinculada ao período em que ele ainda era promotor de Justiça e, posteriormente, secretário estadual de Segurança Pública.

Quadrilha
Ele contou que, em 2001, quando era promotor, ajudou a desarticular uma quadrilha na cidade de Canindé do São Francisco, a 200km de Aracaju. A ação resultou na prisão de diversas pessoas que, segundo ele, desviavam mensalmente R$ 2 milhões dos cofres municipais. Um dos integrantes da quadrilha presos à época era o agiota Floro Calheiros, foragido da Justiça desde 2009, que foi apontado pelo governador de Sergipe, Marcelo Déda (PT), como o principal suspeito de encomendar a emboscada contra o desembargador.

No entanto, a polícia sergipana não descartou nenhuma hipótese e ainda procura por suspeitos. Quatro equipes da Polícia Civil estão em diligência, mas ninguém tinha sido preso até a noite de ontem.









Registros imobiliários são cancelados no Pará

Lúcio Vaz
A grilagem de terras na Amazônia teve um revés ontem após decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp, determinou o cancelamento de registros imobiliários e matrículas considerados irregulares no Pará. O CNJ estima que sejam cancelados mais de 5 mil registros, com área total ainda não determinada. Só na comarca de Altamira, o corregedor nacional determinou, em setembro do ano passado, o cancelamento de registros envolvendo área superior a 410 milhões de hectares, o equivalente a metade do território brasileiro. A medida tomada ontem afeta todos os registros que não obedeceram os limites de área definidos pela Constituição federal. O objetivo é garantir a segurança jurídica das propriedades.

A norma reforça decisão da Corregedoria de Justiça das Comarcas do Interior do Pará, que já havia determinado, em 2006, o bloqueio dos registros considerados ilegais. A Corregedoria do Pará concluiu que há vários municípios do interior com áreas registradas que superam em uma, duas ou mais vezes a sua superfície territorial. No Amazonas, nos últimos 10 anos, em apenas um terço do estado foram cancelados registros de cerca de 48 milhões de hectares ; o equivalente à área do estado da Bahia. Só no município de Canutama, com área de 2,4 milhões de hectares, foram anulados registros de terras totalizando 10,3 milhões de hectares. No Pará, entre os atos irregulares, estão registros de terras de políticos e de empresas multinacionais.

Resultado
A decisão do CNJ tem um primeiro resultado prático: a propriedade não pode ser vendida ou utilizada como garantia em transações bancárias até que a sua situação seja regularizada.


Memória
Criminoso foragido
Apesar de não descartar oficialmente nenhuma linha de investigação sobre a emboscada ao presidente do Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe (TRE-SE), a Polícia Civil do estado está no encalço do agiota alagoano Floro Calheiros, apontado como mandante de homicídios de deputados estaduais, delegados e até da sua ex-mulher. O acusado, que responde a processos nos estados de Sergipe e da Bahia, está foragido e é considerado um dos criminosos mais perigosos daquela região do país.

Preso por duas vezes, Floro Calheiros foi protagonista de fugas cinematográficas em Aracaju. A primeira delas ocorreu em uma delegacia da cidade, em 2003, enquanto a última foi no ano passado, quando usou uma peruca e se disfarçou de médico para sair pela porta da frente de um hospital da capital sergipana sem chamar a atenção da polícia.

Na ocasião, Calheiros estava internado sob a escolta de agentes penitenciários que o acompanharam ao hospital. Os agentes foram rendidos por três comparsas do foragido. As imagens da fuga foram gravadas por um circuito interno de segurança. Coincidentemente, trata-se do mesmo hospital em que foi internado o desembargador Luiz Mendonça após a emboscada executada na última quarta-feira.

Na Justiça sergipana, Floro Calheiros responde a dois processos por homicídio e foi condenado em um terceiro por crime eleitoral. Em pelo menos dois desses casos, o presidente do tribunal eleitoral sergipano foi o seu algoz, um como promotor de Justiça e outro como secretário estadual de Segurança Pública.

Em 2003, Calheiros foi denunciado por encomendar o assassinato do deputado estadual Joaldo Barbosa, morto a tiros na porta da sua casa em Aracaju. Dois anos antes, quando ainda era promotor, o atual presidente do TRE ajudou a desarticular uma quadrilha enraizada na Prefeitura de Canindé do São Francisco, da qual Floro fazia parte. Na Bahia, o agiota ainda responde pela participação no assassinato do deputado Maurício Contrim Guimarães. (AD)



Ponto a ponto - Luiz Mendonça
;Não tenho desafetos;
Confira os principais trechos da entrevista do desembargador Luiz Mendonça:

Suspeitos
Não posso afirmar ser ele (o agiota Floro Calheiros, foragido da Justiça sergipana) o autor (intelectual do crime). Eu estaria cometendo uma injustiça. Não é função nossa precipitar-se em qualquer investigação, que tem vários indícios para apurar. Confio plenamente na polícia de Sergipe. Esse personagem tem um histórico de crimes, que às vezes pode levar até a uma injustiça de apontar ele por conta disso. Mas o histórico não é bom.

Intervenção judicial em Canindé do São Francisco (SE)
(Em 2001) Eu fui designado para apurar o homicídio de um promotor de Justiça. Anos depois, houve denúncias gravíssimas que apontavam a cidade de Canindé do São Francisco como o município no qual o desvio de dinheiro público era uma ferida exposta à sociedade. Invadiram o Fórum de Canindé do São Francisco, roubaram e incendiaram as urnas, e urinaram na gaveta do juiz. Houve desvio de dinheiro público comprovado de quantia superior a R$ 2 milhões. Nenhuma quadrilha fica satisfeita de estar ganhando R$ 2 milhões por mês e, de repente, passou a ganhar zero e ainda ir para a cadeia.

Detalhes da emboscada
Ao ver que tinha criança no carro ao lado, preferi a morte. Fiz um disparo para cima. O cenário que eu vi foi de quase destruição do veículo. Pelos locais onde houve perfuração, perguntaram como é que eu consegui me acomodar ali e não ser atingido. A gente aprende um pouco quando lida com policiais. A gente não deve detalhar muito porque são técnicas defensivas. Pelo volume dos disparos, que aproximou-se de 40 cápsulas recolhidas, o carro balançava muito. Eu me senti dentro de uma rede. Mas uma rede desconfortável. No momento em que eles (bandidos) saíram, eu também saí do veículo com uma arma na mão, observando se não tinha ninguém dando apoio.

Motivação político-eleitoral
Não tenho desafeto algum. Cumpro apenas o meu dever e não suspeito de ninguém. Seria uma informação injusta. A (hipótese) de (motivação) política eu descarto totalmente. Eu conheço todos os políticos de Sergipe. A eleição está sendo conduzida de forma pacífica, ordeira, sem qualquer desmando. Conheço a natureza dos políticos de Sergipe. O que pode ocorrer é uma palavra mais áspera, mas fica limitada a esse tipo de ação. Não é a nossa cultura. Aquele que tiver os votos será eleito. A polícia vai dar essa resposta (se foi ou não crime político). Os indeferimentos (de candidaturas) foram de pessoas que não tiveram cuidado com prazos, com documentos. Tivemos pouquíssimas decisões baseadas na Lei da Ficha Limpa.