Nos últimos cinco meses, desde que o projeto de decreto legislativo que acaba com o 14; e o 15; salários dos parlamentares passou pelo Senado e chegou à Câmara, a Casa teve diversas oportunidades para acelerar sua tramitação. Deputados favoráveis à proposta já apresentaram quatro requerimentos para que o texto fosse apreciado no plenário o quanto antes, mas os pedidos foram esquecidos na montanha de outros 48 que só devem ser analisados quando houver vontade política.
O primeiro requerimento, de autoria de Rubens Bueno (PPS-PR), foi apresentado com as assinaturas dos líderes de 14 partidos e pedia a tramitação com urgência que, se aprovada, poderia entrar na pauta de uma sessão extraordinária a qualquer momento, dependendo somente da ordem do presidente ou do pedido dos líderes. Em seguida, outros três deputados apresentaram isoladamente solicitações para que a matéria entrasse na ordem do dia: Erika Kokay (PT-DF), Romário (PSB-RJ) e Jonas Donizzette (PSB-SP), último a fazer a tentativa.
O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), porém, tem dito repetidas vezes que deixaria o projeto tramitar na casa no ritmo natural, o que significa um processo lento pelas comissões. O texto está parado na Comissão de Finanças e Tramitação (CFT) desde julho, e na última quarta, quando teve a primeira chance de finalmente ser votado, acabou impedido pelo líder do PSD, Guilherme Campos (SP). Considerando o tema polêmico, ele pediu verificação de quórum e derrubou a sessão, que tinha cinco integrantes a menos do que o mínimo exigido para continuar.
Com o encerramento da sessão, a próxima oportunidade de o projeto ser avaliado na comissão ficou para depois do segundo turno das eleições municipais. Na semana que vem, a Câmara não terá atividades, exatamente para que os parlamentares se dediquem às disputas locais. ;Eu imagino que, quando as sessões forem retomadas, não terá como segurar, vai ter quórum e o projeto vai passar, porque não há motivos para não ser a favor dele na CFT, que analisa apenas se ele causa custos aos cofres públicos, o que não é o caso;, argumenta o relator da proposta na comissão, Afonso Florence (PT-BA). Após a manobra realizada, Guilherme Campos recebeu críticas de eleitores, que lhe enviaram e-mails e reclamaram nas redes sociais.
Também pela internet, um abaixo-assinado que pede a votação rápida do projeto na comissão já acumula mais de 172 mil assinaturas, em menos de dois meses de coleta. ;Essa é uma das maiores mobilizações que o Brasil já produziu e as pessoas continuam assinando e se indignando;, relata o diretor da Avaaz, órgão que organiza a lista, Pedro Abramovay. Segundo ele, o grupo irá enviar e-mails para mais de um milhão de pessoas na semana em que a Câmara retomar os trabalhos para requisitar mais assinaturas e pressionar ainda mais os parlamentares. ;É importante que as pessoas saibam como estão se comportando os representantes em quem elas votaram;, aponta.
A crítica partiu de alguns de deputados também. ;Ao que parece, a Casa não está dando a menor importância para o que pensa a opinião pública sobre essa excrescência. No momento de descrédito na política em que estamos vivendo, essa decisão está totalmente deslocada da realidade;, reclamou Augusto Carvalho (PT-DF), um dos parlamentares que abriram mão do recebimento da regalia.
O líder do PR na casa, Lincoln Portela (MG), que também abriu mão do benefício, garante que, independentemente da tramitação na CFT, vai cobrar a entrada do projeto na pauta do plenário na próxima reunião de líderes. ;É um apelo nacional e, quanto mais a Câmara demorar para aprová-lo, mais será penalizada por essa procrastinação;, comenta.