Correio Braziliense
postado em 04/08/2020 20:17
Coordenador da Frente Parlamentar Mista da Reforma Administrativa, o deputado Tiago Mitraud (Novo-MG) acredita que a estabilidade dos servidores públicos deve ser analisada caso a caso. A ideia é que a estabilidade seja garantida para carreiras de estado, mas possa ser relativizada para as demais carreiras. Porém, não deve atingir os atuais servidores e focar apenas em quem ainda vai entrar no funcionalismo público se passar pelo Congresso.
Mitraud defendeu a revisão das regras da estabilidade do serviço público em live com o mercado financeiro nesta terça-feira (04/08). Ele admitiu que a estabilidade existe em todo o mundo, porque tem "uma razão de ser". "Não é só para proteger o servidor, mas para proteger o interesse público. Para evitar que um político de ocasião ou alguém mal intencionado em um cargo comissionado obrigue o servidor a fazer algo que vai contra o interesse público", lembrou.
Porém, disse que, no Brasil, esse processo não é regulamentado da maneira adequada. "Os critérios para se adquirir estabilidade e as carreiras nas quais ela é contemplada são muito amplas. Praticamente é passar no concurso, independente de qual carreira for, e já tem estabilidade garantida para o resto da vida, até querer sair do serviço público", criticou o deputado, que classificou o estágio probatório do serviço público como um processo "praticamente protocolar" em que quase todos são aprovados.
O coordenador da Frente Parlamentar Mista da Reforma Administrativa entende que, por isso, é preciso "tratar as diferentes carreiras com as particularidades que elas têm", inclusive no que diz respeito à estabilidade. "As carreiras de estado, como diplomata, juiz federal, delegado, têm sim necessidade de uma estabilidade mais no longo prazo, mas que não necessariamente precisa ser adquirida no primeiro dia do serviço público, pode ter um estágio probatório em que realmente haja uma avaliação", defendeu.
Mitraud ainda propôs que a manutenção da estabilidade fosse analisada caso a caso e de forma periódica nas demais carreiras do serviço público, para que a estabilidade seja mantida apenas nos cargos que continuam sendo imprescindíveis para a administração pública mesmo com o passar do tempo. "Tem carreiras meio que não necessariamente você precisa dar estabilidade nas mesmas condições que as atuais. Você pode ter um período temporário, 5 ou 10 anos, até porque hoje não tem como saber como o estado vai funcionar aqui a 10 ou 15 anos", argumentou.
O deputado admitiu, contudo, que criou-se um "tabu" sobre o tema da estabilidade, que deve ser uma das peças-chave da reforma administrativa que a equipe econômica pretende apresentar ao Congresso Nacional. Por isso, indicou que essas mudanças, caso se fato entrem na discussão da reforma e sejam aprovadas pelo Legislativo, podem não afetar os atuais servidores. "A gente acredita que algumas questões têm que ser só para quem vai entrar daqui para a frente", avaliou.
A manutenção da estabilidade dos atuais servidores também já foi defendida pelo presidente Jair Bolsonaro. Afinal, a mudança nas regras atuais poderia representar uma perda de direitos para os atuais servidores, que já mostraram estar prontos para resistir à proposta. Foi para fazer esse ajuste, por sinal, que Bolsonaro segurou o envio da reforma administrativa ao Congresso no fim do ano passado.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, por outro lado, gostaria que as mudanças que devem ser propostas pela reforma valessem para todos, já que a despesa com pessoal é hoje um dos maiores gastos do governo. Por conta disso, ele já chegou a classificar a manutenção da estabilidade dos atuais servidores como uma "restrição política" do texto que deve ser enviado ao Congresso e sugeriu que os parlamentares que são a favor da reforma poderiam rever essas restrições políticas.
Ainda não há, contudo, previsão de quando o governo vai enviar a sua proposta de reforma administrativa para o Congresso. Afinal, o assunto foi postergado no fim do ano passado por conta dessa questão da estabilidade; no início deste ano, devido ao clima de instabilidade política que rondava a América Latina; e, depois disso, por conta da pandemia do novo coronavírus.
Guedes já confirmou, por sua vez, que o assunto segue na pauta e deve ser retomada pelo governo Bolsonaro. Nesta terça-feira, Mitraud garantiu, em live com o mercado financeiro, que há clima para discutir o assunto no Congresso. Para ele, é possível avançar com a reforma administrativa e a tributária ao mesmo tempo. A senadora Kátia Abreu (PP-TO) também confirmou a disposição do Congresso de tratar o assunto e disse até que a proposta poderia ser aprovada no primeiro semestre do ano que vem. Por isso, classificou como "incompreensível" o fato de o governo Bolsonaro ainda não ter apresentado a sua proposta de reforma administrativa para o Congresso.
Avaliação de desempenho
Tiago Mitraud e Kátia Abreu também defenderam nesta terça-feira a avaliação de desempenho dos servidores públicos. Eles defendem a avaliação como uma forma de garantir a eficiência do serviço público. Porém, entendem que esse processo não pode ser submetido a interesses pessoais ou políticos e, por isso, deve ser feito por meio de um comitê impessoal.
"Existe um receio de que na avaliação do desempenho, dependendo da forma que for regulamentada, o servidor esteja na mão só do chefe direto e tenha que se submeter à avaliação de alguém que não tenha o interesse público em mente. Por isso, tem que criar um mecanismo que impeça a ingerência específica de determinado indivíduo que prejudique o servidor, criando um comitê que dê impessoalidade para a avaliação de desempenho", explicou Mitraud, para quem a criação de critérios objetivos para essa avaliação é um dos pleitos legítimos dos servidores na reforma administrativa.
Repercussão
Coordenador da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público, o deputado Professor Israel (PV-DF) lembrou, por sua vez, que não basta criar um comitê para garantir que essa avaliação seja feita de forma eficiente e objetiva. "O texto que está no Senado prevê o comitê, mas abre margem para critérios de avaliação subjetivos. Por isso, é preciso critérios objetivos para que o gestor público não possa perseguir servidores de acordo com o posicionamento partidário ou antipatias pessoais", pediu.
O Professor Israel avisou, por outro lado, que o serviço público é contra qualquer flexibilização da estabilidade e vai se posicionar contra propostas como a de Mitraud caso o assunto entre na pauta do Congresso. "O fim da estabilidade é um prejuízo para a democracia brasileira", retrucou, lembrando que a estabilidade existe para blindar o servidor de pressões políticos. "Não é um privilégio. É uma conquista da democracia, que ainda nem se consolidou direito no Brasil", concluiu.
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