Especialistas apostam nesse corte como sendo o último “residual” apontado na ata do Copom, apesar de os indicadores mostrarem uma inflação oficial bem abaixo do piso da meta, de 2,5% ao ano no fim do ano, abrindo espaço para uma política monetária mais expansionista. Contudo, lembram que a diretoria do BC está dividida, principalmente devido ao aumento dos riscos fiscais, o que deverá pressionar para o fim dos cortes nos juros.
Os temores de descontrole fiscal crescem com a guinada do governo na linha ortodoxa, que foi um dos motivos da eleição do presidente Jair Bolsonaro. Essa mudança vem sinalizando que o teto de gastos, principal âncora fiscal, deverá ruir no ano que vem. A emenda constitucional, aprovada em 2016, que não permite o auimento de despesas primárias acima da inflação acumulada em 12 meses até junho, vem sofrendo críticas, e tudo indica que poderá ser flexibilizada em 2021. O presidente e os ministros da ala militar sinalizam que pretendem aumentar os gastos públicos, na contramão da cartilha do ministro da Economia, Paulo Guedes.
Vale lembrar que, na semana passada, o BC divulgou aumento recorde na dívida pública bruta, de 81,9% para 85,5% do Produto Interno Bruto (PIB), ultrapassando a marca histórica de R$ 6 bilhões. As estimativas do mercado apontam para o endividamento do governo superando 100% do PIB até 2022.
Pandemia
A piora dos dados fiscais de junho foi resultado do crescimento exponencial do rombo das contas públicas, devido às medidas de combate aos efeitos negativos da pandemia, que fizeram o rombo consolidado do setor público saltar quase 7.000% no primeiro semestre, para R$ 402,7 bilhões. E diante do aumento da desconfiança do mercado sobre a capacidade do governo em honrar dívidas, o prazo de vencimento dos títulos públicos estão encurtando. Com isso, o governo está ficando pendurado no “overnight”, com a maioria de papéis que representam 19,1% do PIB, ou R$ 1,3 trilhão, vencendo em apenas um dia.“Os riscos fiscais aumentam todos os dias”, alertou a economista-chefe da ARX Investimentos Solange Srour. Para ela, a piora no cenário fiscal não deve mudar as perspectivas em relação ao Copom. “O BC deve estar mais preocupado com o médio prazo. Fortalece minha visão de que ele deveria sinalizar que este risco fiscal traz risco para manutenção dos juros parados por muito tempo”, avaliou.
Expectativa
“Dada a orientação da reunião anterior, e os recentes desenvolvimentos macrofinanceiros, esperamos que o Copom reduza a taxa em 0,25 ponto percentual, para um piso recorde de 2% ao ano. As impressões recentes de inflação abaixo do esperado, e as projeções de inflação condicional visivelmente abaixo da meta para 2021, apoiam esse último corte adicional”, apontou Alberto Ramos, economista-chefe para a América Latina do Goldman Sachs, que pretende ficar bem atento ao comunicado da autoridade monetária para ver se a divisão na diretoria do BC permanecem.Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset Management, também está apostando na queda de 0,25 chama a atenção para os riscos fiscais crescentes. “O prêmio de risco na curva longa está em 6,62% para os contratos de 2029. É mais do que 10 vezes os juros norte-americanos”, comparou. Para ele, a Selic vai voltar a subir em 2021.
Um dos termômetros para o risco país, o Credit Default Swap (CDS) para cinco anos, já está em 215 pontos, mais do que o dobro dos patamares no início do ano, quando chegou a ficar abaixo de 100 pontos.
A Selic, pelas projeções do Top Five (grupo das instituições que mais acertam no Focus), ainda pode cair mais. A mediana das apostas desse grupo para a taxa básica está 1,88% ao ano, pela segunda semana consecutiva. Para 2021, as estimativas do mercado para a Selic estão em 3% anuais, passando para 5% ao ano, em 2022. E, pelas novas projeções do boletim, a estimativa de queda do PIB deste ano teve a quinta redução consecutiva: de 5,77%, na semana passada, para 5,66% nesta semana.
Na avaliação do estrategista da INVX Global, Eduardo Velho, a Selic ainda poderá cair além de 0,25 devido à melhora nas estimativas para o PIB. “O Copom não deve acelerar a queda dos juros devido ao otimismo com a retração menor do PIB e, por conta disso, não quer dizer que necessariamente a queda da Selic vai parar em 2%. Como há muita incerteza, a inflação ainda pode surpreender para baixo e isso pode fazer com que a Selic termine o ano em 1,75%. Mas há espaço para os juros caírem até 1,5%”, afirmou.