O aumento da desigualdade no Brasil é um dos principais fatores que explicam a falta de crescimento do país nos últimos anos. E, nesse cenário de estagnação global o Brasil, que já vinha crescendo pouco após a recessão de 2015-2016, mergulhou em uma nova crise ainda mais profunda sem ter saído da anterior.
Por conta disso, é consenso entre fiscalistas e desenvolvimentistas que o aumento da desigualdade, presente antes da chegada do novo coronavírus, será ainda mais profundo. Para eles, uma das lições desta crise é de que o governo precisa elaborar um programa melhor de assistência social, que dê garantias para uma renda básica aos mais vulneráveis.
Nesse sentido, o debate varia sobre o tamanho desse programa de renda básica, sua abrangência e duração. “A desigualdade é uma trava para o crescimento do país e, no Brasil, ela é um problema, porque é muito elevada. Um dos maiores motivos de um país ter renda média alta é que uma parcela grande da população teve acesso à educação de qualidade e formação técnica, como fez a Coreia do Sul”, comenta Otaviano Canuto, diretor do Center for Macroeconomics and Development. “O país paga um preço mais alto em termos de Produto Interno Bruto (PIB) por essa carência de educação de qualidade para uma parcela grande da população”, adiciona. “O Brasil não poderá evitar a realidade de um ajuste fiscal gradual e, ao mesmo tempo, pensar em mecanismos de proteção social para a parte debaixo da pirâmide”, pontua.
Monica de Bolle, pesquisadora sênior do Peterson Institute for International Economics, em Washington, destaca que a crise atual provocada pela pandemia está mudando uma série de paradigmas da macroeconômica e, no momento, o debate para uma saída da crise passa, necessariamente, por uma maior atuação do Estado e pelo aumento de gastos. A especialista, que não se denomina fiscalista e, muito menos, desenvolvimentista, aponta a necessidade de um programa de renda básica universal como uma das ferramentas para o país sair dessa crise sem precedentes. Na visão da especialista, mesmo custando 1,5% do PIB, um programa nesse sentido seria extremamente salutar. “A pandemia atinge muito diretamente pessoas em situação de vulnerabilidade e que estão morando em aglomeração. O que começamos a ver nos dados de países diversos é como a pandemia expõe e torna uma situação desigual mais desigual. O Brasil é um país com imensos desafios para integrar economicamente uma parcela muito significativa da população”, explica.
De Bolle reforça que não é razoável não contar com uma rede de proteção social robusta. “O país não pode passar ao largo de qualquer discussão sobre a necessidade de uma política de Estado. Esse debate de fazer o que cabe no Orçamento não é relevante no momento. Quem resolveu dividir esse assunto não entendeu o que é renda básica”, afirma.
Marcos Lisboa, presidente do Insper, lembra que é importante uma discussão para garantir políticas públicas capazes de emancipar as famílias da situação de pobreza e não faz sentido algumas categorias do serviço público defenderem reajustes salariais no meio da recessão quando possuem estabilidade e algumas categorias recebem acima do teto do funcionalismo, que passou da hora de ser respeitado. Citando um estudo do Insper, ele destaca que, para muitos trabalhadores — os informais, por exemplo —, uma política pública deveria auxiliá-los a aumentar a capacidade de geração de renda e reduzir a volatilidade dos rendimentos.“Dessa forma, é importante discutir os mecanismos por meio dos quais as pessoas poderiam aumentar seu potencial de geração de renda”, diz. (RH)