Economia

No pós-pandemia, bancos deverão enfrentar maior concorrência digital

Instituições financeiras terão de lidar com mais concorrência e avanço na digitalização dos serviços

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 10/07/2020 06:00
homem falandoGoverno, Congresso Nacional e bancos têm trabalhado juntos para tentar fazer o crédito chegar na ponta. Porém, reconhecem que ainda é preciso fazer mais porque os dados deixam claro que a liberação de recursos pode até ter crescido, mas as operações acabaram concentradas entre as grandes empresas e continuam custando muito caro para os pequenos negócios e para as famílias brasileiras. Todos admitem que, além de resolver o presente, é preciso pensar no pós-coronavírus para garantir que o sistema financeiro nacional cumprirá seu papel de forma adequada na retomada da economia.

ilustração de dados

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, diz
que a oferta de crédito cresceu no Brasil no início da quarentena.
As concessões registradas em março e em abril deste ano superaram as liberações de empréstimos e financiamentos do mesmo período de 2019. Em algumas semanas, esse crescimento foi significativo no segmento de pessoas jurídicas: na última semana de março, logo após o início das medidas de distanciamento social, por exemplo, o crédito às empresas somou R$ 52 bilhões, bem mais do que o computado na semana anterior (R$ 38,4 bilhões) e e em igual semana do ano passado (R$ 23,9 bilhões).

O BC calcula aumento de 24% no crédito às pessoas jurídicas durante a pandemia. ;É importante manter o sistema financeiro funcionando em um momento como esse, porque a capacidade de
alocar recurso é o que vai fazer a economia voltar a um formato
desejado;, assinala. O BC ressalta, ainda, que os
bancos liberaram R$ 658,1 bilhões em empréstimos entre 16
de março e 26 de junho. Contudo, quase a metade disso foi emprestada às grandes companhias: R$ 307,8 bilhões. Restaram R$ 80,8 bilhões para as médias e R$ 67,1 bilhões para as micro e as pequenas, além de R$ 202,2 bilhões para as pessoas físicas. As maiores empresas responderam, também, pela principal parcela das renovações de contratos: R$ 104,7 bilhões de R$ 276,8 bilhões.
Foi somente nas repactuações ; isto é, nos acordos que permitiram postergar o pagamento das parcelas financiadas ; que os pequenos e os médios negócios e as famílias tiveram prioridade.

Oportunidade

Além disso, o crédito oferecido a esses segmentos segue caro.
Apesar de a taxa básica de juros (Selic) estar na mínima histórica,
de 2,25% ao ano, os encargos médios para quem toma crédito
são de 20,4% anuais. Isso porque o spread bancário ; diferença
entre o que as instituições cobram dos devedores e pagam aos
investidores ; está em 17,2 pontos percentuais, segundo o BC.
;Parte do estigma da sociedade em relação ao sistema financeiro
está no fato de o spread ser alto, mais alto do que o de outros países;, reconhece Campos Neto.

Ele ressalta que esse indicador é um reflexo de ;ineficiências; do
sistema de recuperação de crédito e do sistema tributário brasileiro, mas garante que o governo vem trabalhando para atacar alguns desses problemas.

Presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban),
Isaac Sidney Ferreira reforça que ;os juros não são altos no Brasil
porque os bancos querem, mas em razão de uma série de características da economia brasileira;. E pede ao governo que, de fato, trate dessas questões para melhorar o ambiente brasileiro de
negócios e, assim, atrair investimentos privados no pós-pandemia.
;Teremos juros baixos por um bom tempo no mundo e aqui,
no Brasil. E isso é uma grande oportunidade;, frisa o executivo,
garantindo que os bancos estão prontos para financiar projetos
que ajudem na recuperação da economia.

Garantir o acesso ao crédito a um custo adequado, contudo,
não será o único desafio do sistema financeiro depois da crise
provocada pelo novo coronavírus. É que a pandemia revelou
milhões de ;invisíveis; que não constavam nos cadastros do governo e dos bancos, mas que, agora, foram bancarizados para
receber benefícios sociais, como o auxílio emergencial de R$ 600.
;Precisamos continuar olhando para o exército de trabalhadores
autônomos e informais que, agora, estão movimentando, pela
primeira vez, suas contas bancárias;, destaca o presidente da Febraban. ;Milhões de pessoas que eram invisíveis passaram a ter
contas digitais. Isso mudará a dinâmica financeira daqui para a
frente;, ressalta Campos Neto.

Futuro à vista

O presidente do BC destaca, ainda, que a maior parte desses
trabalhadores recebeu o auxílio emergencial de forma digital. E
lembrou que o isolamento social levou outras camadas da população brasileira a ampliarem o uso da tecnologia, sobretudo para fazer compras e pagar contas de forma remota. Por isso, ele acredita que tal momento transformará diversos hábitos sociais e exigirá cada vez mais inovação e competitividade do sistema financeiro. ;Temos que construir o sistema financeiro do futuro;, avisa. Diante desse desafio, Campos Neto garante que a agenda de competição, inovação e inclusão do BC segue forte. ;Todos os prazos estão mantidos;, frisa. A autoridade monetária promete lançar, nos próximos meses, por exemplo, o open banking e o sistema de pagamentos instantâneos PIX.

E ainda quer estimular a ;desconcentração bancária;. Não por acaso, tem desenhado medidas de estímulo às fintechs e, especialmente, às cooperativas de crédito, que, na atual pandemia, mostraram- se mais próximas das micro e pequenas empresas do que os grandes bancos brasileiros. ;O preço que o sistema financeiro pagou em todas as crises é a enorme
concentração na saída da crise. Mas o sistema financeiro do
Brasil funciona bem, é competitivo. E nossa agenda de competição, inovação e inclusão segue forte;, emenda.
O presidente do BC afirma que, como a ideia é ampliar cada vez
mais a concorrência do setor, a instituição não proibiu o sistema
de pagamentos do WhatsApp de operar no Brasil. Segundo ele, a
operação só foi suspensa para ser regulamentada da maneira adequada.

;Queremos que nos mostrem o arranjo, para termos certeza
de que vai ser competitivo. E tem outro ponto, que é a proteção
de dados. Entendendo que o sistema é competitivo e que os dados das pessoas serão protegidos de forma adequada, o BC está disposto a autorizar, assim que for seguido o mesmo trilho dos outros arranjos;, enfatiza. No entender de Campos Neto, todos os planos de inovação do sistema financeiro têm que prezar por dois princípios: a competitividade do setor e a proteção dos dados pessoais e financeiros dos brasileiros.

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