Após dois meses consecutivos de queda, as vendas do varejo avançaram 13,9% em maio último. O crescimento reflete a reabertura gradual do comércio. Porém, veio acima das expectativas do mercado, que projetava uma recuperação de 7% das vendas no início da flexibilização do isolamento social. Por isso, reforçou em muitos analistas a impressão de que o pior da crise do novo coronavírus já ficou para trás e despertou a esperança de que o baque provocado pela pandemia no Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil pode não ser tão grande quanto se projetava no segundo trimestre deste ano.
O avanço de 13,9% das vendas do varejo é o maior da série histórica da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E fica ainda mais significativo quando se olha para o varejo ampliado, que considera, também, as vendas de veículos e materiais de construção: 19,6%.
“Todas as atividades varejistas tiveram uma variação positiva na passagem de abril para maio. E algumas variações foram recordes na série, como a de tecidos e vestuário e calçados, que cresceu 100,6%; móveis e eletrodomésticos (47,5%) e outros artigos de uso pessoal e doméstico (45,2%)”, disse o gerente da pesquisa, Cristiano Santos.
Prejuízo
Esse avanço, porém, ainda não foi suficiente para reverter todo o prejuízo causado pela pandemia de covid-19. Afinal, o varejo caiu 2,8% em março e despencou 16,3% em abril, mês em que todo o comércio não essencial permaneceu fechado, devido ao isolamento social. Por conta disso, os resultados ainda estão no vermelho na base anual.
Em relação a maio do ano passado, o resultado é negativo em 7,2% no varejo restrito e em 14,9% no varejo ampliado. E no acumulado do ano, as quedas são de 3,9% e 8,6%, respectivamente. “Foi um crescimento grande percentualmente, mas a base de comparação foi muito baixa”, lembrou Santos.
Ainda assim, o crescimento do varejo provocou otimismo no mercado ontem (veja matéria ao lado). “A expectativa era de uma alta de 6%, mas ela foi de quase 14%”, explicou o economista da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Fábio Bentes. “A perspectiva era positiva, mas o esperado era que o grande avanço fosse em junho. Entretanto, maio já veio forte”, reforçou o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez.
Projeções
Por conta disso e do fato de que o comércio representa uma parcela significativa da economia brasileira, alguns economistas correram para revisar as suas projeções para o PIB deste ano. “O setor varejista surpreendeu as expectativas em maio e também registrou uma queda um pouco menos negativa em abril. Isso traz um viés de alta para as projeções do PIB”, afirmou a economista da XP Investimentos, Lisandra Barbero.A XP vai melhorar as suas estimativas, que hoje apontam para uma queda de 11,7% da economia, no segundo trimestre, e de 6% no ano. Porém, vai esperar para fazer isso amanhã, depois que o IBGE divulgar o desempenho do setor de serviços em maio. Setor que, junto com o comércio, responde por dois terços do PIB e também deve vir positivo, embora com uma taxa menor que a do comércio, já que serviços importantes como restaurantes e academias ainda estavam fechados em maio.
Especialistas admitem, por outro lado, que há explicações para essa retomada acelerada do comércio já em maio. A principal delas é mesmo a flexibilização do isolamento social em diversas cidades. Porém, também pesou bastante o pagamento de benefícios como o auxílio emergencial, num contexto em que milhões de trabalhadores perderam o emprego ou tiveram salários reduzidos devido à crise do novo coronavírus.
“A massa salarial teve uma queda de R$ 7,3 bilhões no último trimestre. Mas, em maio, houve o pagamento de uma parcela do 13º salário dos aposentados e do auxílio emergencial, benefícios que a massa de rendimento não engloba”, comentou o gerente da PMC. “O auxílio pesa bastante no orçamento de muitas famílias brasileiras. Por isso, permitiu que as pessoas não adiassem novamente suas decisões de consumo”, explicou Lisandra Barbero, da XP.