O governo recebeu denúncias de que jovens das classes média e alta não só receberam duas parcelas do auxílio emergencial de R$ 600, como estão gastando o dinheiro com festas e churrasco. Ou seja, estão cometendo duas irregularidades: embolsando dinheiro público sem fazerem parte do grupo que deveria receber o benefício e descumprindo as regras de isolamento social.
Boa parte desses jovens pertence a famílias de servidores, empresários e de executivos que ganham mais de R$ 25 mil por mês, ou seja, mais de 40 vezes o valor do auxílio criado pelo governo para socorrer pessoas que ficaram sem renda por causa da pandemia do novo coronavírus.
Um empresário cujo filho se inscreveu no sistema da Caixa Econômica Federal para receber os R$ 600, disse que obrigou o jovem a devolver o dinheiro. “Descobri que meu filho tinha recebido o auxílio porque ouvi uma conversa dele com alguns amigos. Ele contava que, com o dinheiro, havia bancado uma churrascada para uma galera”, afirmou.
O jovem estuda em uma das escolas mais caras do Distrito Federal, acabou de ganhar um carro avaliado em mais de R$ 100 mil e passou quase dois anos no exterior bancado pela família. “É inaceitável o que meu filho fez. O pior é saber que vários dos amigos dele fizeram o mesmo”, acrescentou o empresário.
Descalabro
O Tribunal de Contas da União (TCU) acredita que uma das principais falhas na concessão do auxílio emergencial foi o não cruzamento dos dados detidos pela Dataprev e pelo Ministério da Cidadania com as informações em poder da Receita Federal. Se isso tivesse sido feito, o governo teria constatado que esses jovens fazem parte de famílias abonadas. Eles aparecem como dependentes nas declarações de renda.
Pelos cálculos do TCU, pelo menos 8,1 milhões de pessoas receberam, ilegalmente, o auxílio emergencial de R$ 600. Segundo o Instituto Locomotivas, um terço das famílias das classes A e B pediu ajuda oferecida pelo governo, sendo que 69% das solicitações foram aprovadas. Ou seja, 3,9 milhões de famílias das classes média e alta têm alguém que embolsou ilegalmente os R$ 600.
Diante desse quadro estarrecedor, o ministro Bruno Dantas, do TCU, recomendou que o governo aprimore os mecanismos de controle das concessões dos benefícios. Além de barrar aqueles que tentam fraudar o sistema, a meta do Tribunal é que o governo alcance pelo menos 2,7 milhões de pessoas consideradas “invisíveis”. São aquelas que não têm acesso à internet ou não sabem ler e escrever.