Os presentes também destacaram que o distanciamento funciona, mas faltam campanhas educativas para a população. O desencontro das lideranças também atrapalha esse tipo de medida. “Entendemos que esse é debate essencial para, de forma técnica e respeitando a ciência e o comportamento do vírus no nosso país, a gente analise a situação e discuta parâmetros para o período pós pandemia”, destacou Maia.
Participaram da sessão a presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Nisia Trindade, a estatística e pesquisadora da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, Márcia Castro, diretor geral do Hospital Sírio Libanês, Paulo Chapchap, e o economista e ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga. Entre os temas tratados, falou-se também de economia, e as projeções que a dívida do Brasil atinja 100% do PIB até o próximo ano. Maia destacou que uma reforma administrativa, para lidar com um país empobrecido, talvez não possa atingir somente os funcionários públicos concursados que entrarem para o governo depois da aprovação de um futuro texto, por exemplo.
“Foi um aprendizado importante, e fica a certeza que, infelizmente, estamos longe de termos todas as informações importantes para pensarmos no fim do isolamento. O mapa apresentado mostra que a contaminação cresce rápido e vai atingir todos os municípios do nosso país. Há uma concentração de de leitos de UTI nas grandes cidades, então teremos situações mais graves em cidades pequenas. Um médico me falou que em cidades sem UTIs, seria preciso um isolamento radical desde já”, afirmou Maia.
O presidente da Câmara também lamentou o déficit de testes de coronavírus, e destacou a importância de isolar a população. “Temos um déficit grande de testes. Recebi dados mostrando que da forma como o vírus está contaminando em vários países, a situação de normalidade só virá em junho de 2021, e temos o setor privado pressionando pela abertura. Devemos ter capacidade de debater, respeitando o debate e as vidas dos brasileiros. Não é possível que a gente estimule o fim do isolamento quando apenas a elite brasileira poderá ficar isolada, e as pessoas mais simples ficarão nos transportes públicos e aglomerações e as comunidades sem possibilidade de isolamento”, avaliou.
“Como não organizamos como separar e isolar idosos do resto das comunidades, já que não há nenhum espaço para isolamento? O fortalecimento do tema da assistência social será necessário daqui pra frente. Eu tinha uma visão muito pró-mercado privado de saúde, mas a gente vê que o SUS é importante. E precisamos de melhorar os gastos públicos. Vemos críticas permanentes da qualidade de atendimento na saúde e educação e esse é um grande debate que o congresso deve se debruçar”, completou
Além de uma reforma administrativa mais profunda, Maia também concordou com armínio Fraga a respeito de revisitar a reforma da previdência. “A necessidade que a reforma administrativa não trate apenas dos novos funcionários, com 100% na relação de dívida-PIB, precisaremos ter outro tamanho não apenas em economia, mas na qualidade dos gastos públicos. Cabe ao parlamento iniciar esse debate. Em que ponto estamos, o que fizemos, o que não fizemos, onde erramos e como vamos organizar, com o poder executivo, judiciário, estados e municípios, o estado brasileiro como um todo para que a gente possa salvar vidas. Quanto melhor nós sairmos da crise menor é o custo da sociedade”, destacou.
Armínio Fraga destacou que, no momento, o brasil vive “a tempestade perfeita”. “Saímos de uma crise econômica profunda, de um colapso fiscal e problemas de produção. O colapso fiscal gerou desconfiança. A recuperação tem sido modesta, a despeito de esforços louváveis dessa Casa. Quando também incorporamos um clima político geral bastante tenso e, em função disso, pouco produtivo. Isso significa que temos que caminhar na questão sanitária. Há um quadro econômico muito difícil. E podemos falar sem medo de um clima geral na nação tenso, e que faz parte do desafio que temos que enfrentar”, destacou.
“O que vem acontecendo no Brasil é um problema global. Passamos por uma recessão mundial. Itália sofrerá queda de dois dígitos no PIB. Aqui, a previsão é difícil, mas já se delineia uma queda grande. Pode ser de 8%. São números especulativos. Mas é uma baita de uma recessão. Não existe fórmula mágica para fazer a economia funcionar. As pessoas não querem morrer. As que podem se isolam. As que não podem, se expõe, mas tenho certeza que gostariam de se isolar se pudessem” avaliou o economista.
O economista destacou a importância das medidas de contenção do alastramento do vírus, pois com o avanço da doença, um maior número de contaminações e mortes resultará em maior prejuízo tanto social quanto econômico. Armínio Fraga falou de “grande destaque para assistência social”. “O país poderia ter um ano com queda de 10% do PIB e seguir seu caminho. Mas isso não acontece de forma uniforme e há uma massa enorme de pessoas que sofrerão perda total com consequências dramáticas. Várias medidas foram tomadas para garantir a liquidez do sistema. A dificuldade é fazer os recursos chegarem a pequenas e médias empresas. Não é uma questão de sistemas bancários funcionando em tempos normais. Pequenos negócios, com contato direto com os clientes, que empregam muita gente, evaporaram. É assunto de pol pública”, argumentou.
“O objetivo é o famoso achatamento da curva não só para evitar a tragédia, que já bastaria, mas também porque ganha tempo. O Brasil, nesse contexto, tem várias ferramentas de combate ao covid. Márcia falou sobre rede do SUS, os mecanismos de distribuição e de assistência social existem e têm um papel importante. Canais de distribuição do Bolsa Família e o Cadastro Único, que já cobrem 70 milhões de pessoas e, com esforço pode chegar a 100 mi. Há espaço para melhorar. Outro campo é alimentação. O agronegócio vem mantendo sua produção. Um ingrediente a menos nessa ansiedade é que as pessoas possam comer”, elencou o especialista.
Para o economista, o governo perdeu muito tempo no combate ao coronavírus. “Perdemos a chance de interromper esse processo, houve falta de foco ou pior. Ainda há tempo para uma participação do governo federal agindo de maneira coordenada e científica. Segundo, temos alta proporção de vulneráveis. São mais de 1/3 de vulneráveis entre idosos e pessoas com dificuldades crônicas. Imensas desigualdades. jovens e velhos vivendo no mesmo cômodo. É um espaço desenhado para a infecção. Falta uma estratégia nacional”, alertou.
Para sair do isolamento, na visão do economista, será necessário aguardar que as curvas baixem. “Vamos depender de uma inversão confiável nas curvas. É fundamental investir em informação de qualidade. Não podemos errar. Isso lembra o trabalho do Banco Central no sistema de metas. Existem modelos variados e sofisticados, mas nada substitui a informação das curas e enquanto apontam para cima, não dá pra pensar em relaxamento. Isso vai demorar e tem consequências econômicas e parece provável que ondas surjam”, afirmou.
O economista destacou que será importante gastar para enfrentar a crise. “Temos que gastar sim, temos que gastar com a questão sanitária, humanitária, social, e que esses gastos sejam temporários e que não surjam gastos permanentes em um momento que não temos condição de seguir esse caminho. A dívida caminha para 100% do PIB até, no máximo, no ano que vem. É preciso insistir em reformas. O país precisa e deve isso aos seus cidadãos. Reforma administrativa caprichada. É um tema maduro. Provavelmente teremos que revisitar a previdência e vejo espaço para eliminação de subsídios que não fazem sentido, e que são de grande monta”, apontou.