Economia

Coronavírus leva inflação ao menor nível dos últimos 22 anos

IPCA registrou deflação de 0,31% em abril, influenciado pela queda dos preços dos combustíveis. Os alimentos, contudo, subiram 1,79%

Apesar de muitos consumidores estarem reclamando dos preços encontrados nos supermercados do país, a inflação oficial brasileira registrou o menor nível dos últimos 22 anos em abril. O índice foi negativo, marcando uma deflação de 0,31%.

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), divulgado nesta sexta-feira (8/5) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), explicou que a alta dos alimentos foi compensada pelos demais componentes da inflação, que ficaram mais baratos devido, sobretudo, à redução da demanda registrada durante a pandemia do novo coronavírus. Por isso, a inflação teve a variação mensal desde agosto de 1998 em abril.

O principal impacto negativo veio do grupo dos transportes, que responde por 20% do orçamento das famílias e teve uma deflação de 2,66% (impacto de -0,54 ponto percentual) em março. O resultado reflete a queda dos preços dos combustíveis, que foi influenciada pela redução da demanda e também pelo recuo dos preços internacionais de petróleo. Só a gasolina, que já havia ficado 1,75% mais barata em março, teve uma queda de mais 9,31% em abril. E ainda houve baixas nos preços do etanol (-13,51%), do óleo diesel (-6,09%) e do gás veicular (-0,79%).

"O resultado de abril foi muito influenciado pela série de reduções nos preços dos combustíveis", disse o gerente da pesquisa, Pedro Kislanov, lembrando que em abril a Petrobras anunciou duas reduções no preço da gasolina: no dia 28 de março, de 5%, e no dia 20 de abril, de 8%.

Outra queda significativa veio do grupo de artigos de residência, que registrou uma deflação de 1,37% em abril por conta da redução dos preços de produtos como itens mobiliário (-2,92%), eletrodomésticos e equipamentos (-3,58%). 

Ainda foi registrada deflação nos grupos de habitação, que variou -0,1%, devido ao recuo nos preços da energia elétrica (-0,76%); comunicação, que caiu 0,2% por conta do barateamento de 1,1% dos aparelhos telefônicos; e despesas pessoais, que marcou -0,14% devido à variação negativa de serviços como cabeleireiro (-0,26%) e recreação (-0,8%).

Houve queda até no grupo de saúde e cuidados pessoais, que caiu 0,22% por conta da baixa de preços como produtos farmacêuticos e óticos (-1,68%), antibióticos (-2,83%) e antidiabéticos (-3,32%).

Alimentos

O grupo de alimentação e bebidas, que responde por 19% do orçamento das famílias, contudo, acelerou a alta de preços em abril. O grupo, que já havia ficado 1,13% mais caro em março, subiu mais 1,79% em abril. E, por isso, exerceu uma pressão positiva de 0,35 ponto percentual na inflação de abril.

A alta dos alimentos se explica, sobretudo, pela alimentação no domicílio, que subiu 1,40% em março, no início do isolamento social, e mais 2,24% em abril, no decorrer da quarentena. A alta se explica, sobretudo, pela variação de produtos como cebola (34,83%), batata-inglesa (22,81%), feijão-carioca (17,29%) e leite longa vida (9,59%). As carnes, por sua vez, ficaram 0,3% mais baratas. 

"Há uma relação da restrição de oferta, natural nos primeiros meses do ano, e de aumento da demanda provocado pela pandemia de covid-19, com as pessoas indo mais ao mercado, cozinhando mais em casa", disse Kislanov.

Mas também houve alta no grupo classificado como alimentação fora do domicílio, já que esse item engloba os deliverys, que ganharam força nesse período de isolamento social. Segundo o IPCA, nessa forma de pedir comida, foi registrada uma alta de 3,07% no preço dos lanches como os sanduíches, apesar de uma deflação de 0,13% nas refeições.

Outro segmento considerado essencial durante a pandemia do novo coronavírus também acabou ficando mais caro: o de produtos de limpeza. O segmento variou 0,1% em abril, devido à alta de produtos como amaciante e alvejante (1,82%), água sanitária (0,90%), detergente (0,81%) e desinfetante (0,59%).

E é importante lembrar que essa alta dos produtos essenciais pesa mais no bolso dos consumidores de baixa renda, que dedicam uma parcela maior da renda mensal para a compra da cesta básica. Por isso, a deflação foi menor nesse grupo. Segundo o IBGE, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que considera os consumidores que ganham até cinco salários mínimos, variou -0,23% em abril. Isso porque, nesse grupo social, a alta dos alimentos pesou 1,91%.

Regiões

De acordo com o IBGE, 14 das 16 áreas pesquisadas registraram deflação em abril. Os maiores baques negativos foram registrados em Curitiba (-1,16%), Brasília (-0,58%) e Goiânia (-0,53%).

Apenas Rio de Janeiro e Aracaju tiveram uma inflação ainda positiva. Os índices, contudo, também foram muito próximos de zero: 0,18% e 0,15%, respectivamente.
 

Impacto macroeconômico 

A variação negativa de 0,31% de abril levou a inflação oficial brasileira a uma variação acumulada de 2,4% nos últimos 12 meses. O índice é bem menor que os 3,3% registrados nos 12 meses imediatamente anteriores e está abaixo do piso da meta de inflação estipulado para este ano pelo Banco Central: a meta é de 4%, com um intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para baixo (2,5%) ou para cima (5,5%).

"O resultado reforçou o nosso entendimento de que a inflação deve arrefecer tanto em 2020 quanto em 2021, uma vez que os efeitos da desaceleração econômica e da retração dos preços de commodities devem prevalecer sobre os efeitos inflacionários advindos do câmbio e do choque negativo de oferta global", comentou a XP Investimentos.

Saiba Mais

O índice ainda afetou a taxa de juros reais da economia brasileira, que é a diferença entre a inflação acumulada nos últimos 12 meses (2,4%) e a taxa básica de juros (Selic), que nesta semana foi reduzida de 3,75% para 3% pelo Banco Central. A taxa de juros reais caiu, portanto, para apenas 0,6%.

"Esta não é a melhor forma de se observar o fenômeno, o ideal é pegar um contrato de juros de 12 meses e subtrair da expectativa para 12 meses a frente, mas serve como medida para mostrar que estamos próximo de juros reais nulos ou mesmo negativos", lembrou o economista-chefe da Necton Investimentos, André Perfeito.