A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) permitirá que as operadoras de planos de saúde utilizassem os mais de R$ 15 bilhões do fundo garantidor, durante o período de pandemia da Covid-19. Mas, para poder lançar mão desse dinheiro, as empresas precisarão cumprir algumas contrapartidas, como aumentar o período de atendimento aos usuários inadimplentes.
Além disso, as operadoras deverão pagar a todos prestadores de serviços de suas redes os valores referentes ao período de 4 de março a 30 de junho de 2020 para a realização de procedimentos e serviços. Segundo nota divulgada pela ANS, “as medidas contribuem para que as operadoras possam enfrentar a tendência do cenário de retração econômica inflamado pela pandemia, evitando que a assistência à saúde dos beneficiários seja colocada em risco”.
As medidas, porém, são alvo de críticas. O advogado especializado em direito à saúde, Rafael Robba, do escritório Vilhena Silva Advogados, defende que a ANS poderia ter tomado decisões mais benéficas aos consumidores. “Essa proteção em caso de inadimplência só vai funcionar para as operadoras que aderirem ao termo do fundo garantidor. As operadoras que não aderirem, não são obrigadas a seguir essas medidas, como manter os contratos ativos até junho de 2020, ainda que haja inadimplência. Essa regra deveria ser para todas as operadoras, independentemente de utilizar o fundo garantidor”, cobrou.
Em ofício enviado à ANS, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) pediu que a utilização de recursos do fundo seja feita de forma transparente, com explicações à sociedade. O documento questiona alguns pontos, mas, sobretudo, quer saber quais serão os critérios de seleção das empresas que poderão recorrer à reserva de recursos.
“É preciso que haja mais contrapartidas para o consumidor, como um tempo maior de inadimplência. O fundo foi liberado para as operadoras serem mais tolerantes com os inadimplentes. Mas achamos que o período é muito curto. As consequências econômicas vão durar mais do que isso”, explicou Ana Navarrete, coordenadora do programa de saúde do Idec.
A FenaSaúde, que representa 15 grupos de operadoras de planos privados de assistência à saúde, afirmou que os valores do fundo serão utilizados para manter os pagamentos aos prestadores de serviços –– médicos, enfermeiros, hospitais etc. –– e para garantir que a pandemia não prejudique o atendimento aos usuários. Segundo a diretora executiva da entidade, Vera Valente, atualmente cerca de 90% do montante arrecadado pelos hospitais privados são originários do que é repassado pelas operadoras de saúde.
Reajustes
Em relação aos reajustes anuais, o advogado Rafael Robba afirma que os planos coletivos não têm reajuste regulamentado –– não passam pelo controle da ANS. “É calculado pela operadora sem transparência. O consumidor que se sentir lesado pode acionar o Judiciário, que tem estado atento a essa questão. Em casos não justificados, o percentual é revisto”, completa.
Ana Carolina Navarrete também aponta a falta de transparência nos reajustes. Segundo ela, quando a questão é judicializada, 75% dos casos são considerados abusivos pelo Judiciário. “Em tese, o impacto da Covid-19 não deveria ser incorporado ao ajuste deste ano. Mas, como não temos transparência, não há garantia disso”, cobrou.
Vera Valente, da FenaSaúde, afirma que ainda não é possível medir os impactos da pandemia nos planos e a projeção para reajustes futuros. “Até agora só há dados oficiais relativos a até fevereiro. Portanto, antes da decretação da pandemia pela OMS e da situação de calamidade no país”, explicou.
*Estagiários sob a supervisão de Fabio Grecchi
“O fundo foi liberado para as operadoras serem mais tolerantes com os inadimplentes. Mas achamos que o período é muito curto. As consequências econômicas vão durar mais do que isso”
Ana Navarrete, coordenadora do programa de saúde do Idec