Os bancos brasileiros receberam mais de 2 milhões de pedidos de renegociação desde o início da pandemia do novo coronavírus e, por isso, autorizaram a revisão de mais de R$ 130 bilhões em crédito nos últimos 30 dias. Mas a expectativa é ampliar esse volume. Por isso, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) estuda uma maneira de conceder uma carência aos clientes do crédito consignado.
Segundo o presidente da Febraban, Isaac Sidney, a maior parte das renegociações tem ocorrido por meio da medida que permitiu que os consumidores brasileiros parem de pagar por até 60 dias as parcelas dos financiamentos bancários. A medida vale para as famílias e para as micro, pequenas e médias empresas que pagavam as prestações em dia antes da crise do coronavírus e foi até estendida em bancos como a Caixa, que permitiu a suspensão do pagamento da casa própria por até 90 dias. A extensão do prazo de pagamento deve chegar ao crédito consignado.
“Estamos tentando estender a prorrogação das outras linhas para o crédito consignado. Estamos estudando dar uma carência ao consignado”, contou Isaac Sidney, em videoconferência realizada ontem para tratar das medidas adotadas pelo setor bancário diante da crise do coronavírus. Ele explicou que a possibilidade de suspender temporariamente a cobrança das parcelas do consignado só não foi implementada ainda por causa de problemas operacionais. Diferentemente do que acontece com as outras linhas de crédito, o consignado é descontado automaticamente do salário ou da aposentadoria dos brasileiros. “Estamos buscando ultrapassar os problemas operacionais, porque o consignado envolve milhares de municípios, empresas e estados que processam a folha de pagamento (dos nossos clientes)”, afirmou Sidney.
O presidente da Febraban não deu uma previsão de quando os bancos podem chegar a uma solução para essa questão, mas destacou a importância da medida, lembrando o crédito consignado representa mais de 1/3 de todo o crédito livre que é oferecido à pessoa física no Brasil. O consignado é, por sinal, o instrumento de crédito mais utilizado por aposentados e pensionistas brasileiros, grupo mais afetado pela pandemia da Covid-19. O empréstimo consignado a aposentados tem uma das menores taxas de juros do mercado.
O presidente da Febraban ainda garantiu que, se for necessário, o setor bancário pode estender a renegociação das operações de crédito por mais tempo. A prorrogação pode ser anunciada se a pandemia do novo coronavírus durar mais tempo que o esperado, por exemplo.
Juros
Sobre os juros, o presidente da Febraban garantiu que todas as operações de renegociação estão sendo feitas sem aumento de juros. “As taxas foram mantidas para pessoas físicas, micro e pequenas empresas nos mesmos níveis das contratações a isso. Os bancos estão sensíveis a isso”, afirmou.
Ele admitiu, contudo, que o atual cenário propicia a elevação dos juros. A desaceleração econômica causada pelo coronavírus provocou um aumento no custo de captação, no risco de crédito e no risco de inadimplência. Para tentar contribuir com a recuperação econômica, Sidney afirmou que os bancos estão se esforçando para não aumentar as taxas cobradas de famílias e de pequenas e médias empresas brasileiras. A exceção, segundo ele, é para as grandes empresas.
O presidente da Febraban explicou que, antes da crise da Covid-19, as grandes empresas estavam se financiando no mercado de capitais, por meio de títulos de dívida e ações. E lembrou que esses papéis tiveram seus valores reduzidos por conta da aversão ao risco que tomou conta do mercado financeiro depois da pandemia, o que levou as grandes empresas a voltarem a procurar os bancos para se financiarem.
“As grandes empresas procuraram liquidez nos bancos. São valores vultosos que têm um impacto relevante na liquidez do setor bancário. Aí sim tem havido variação na taxa de juros, por conta do custo de captação que se alterou”, admitiu.
Sidney rebateu, contudo, as críticas de que o crédito não tem chegado à ponta, para os consumidores e as empresas. Disse que, além das renegociações, o setor financeiro concedeu quase R$ 330 bilhões em novos créditos nas últimas três semanas. “É mais que a média mensal do primeiro trimestre de 2019, quando a concessão chegou a R$ 290 bilhões”, ressaltou.
Prudência com endividamento
A educadora financeira Evelyn Shintaku diz que as suspensões de parcelas podem auxiliar as emergências de muitas famílias, mas devem ser usufruídas de forma consciente. De acordo com ela, pessoas em situação de inadimplência têm a oportunidade de colocar as contas em dia; enquanto outras podem manter as contas essenciais e suprir possíveis emergências. “Mas vale lembrar que nesse cenário todo existe um grande risco, que é o endividamento excessivo”, alertou a educadora. “Um bom planejador financeiro é aquele que se esforça não só para sair da situação de endividamento ou de uma dificuldade financeira, mas, sobretudo, em se manter longe das dívidas”, observou. Alvaro Perciano, educador financeiro, indica que os clientes analisem o que pode ser reduzido nas contas antes de aderir a esses benefícios bancários. “A gente já está economizando, não tem mais gasto com gasolina, não tem mais bar”, pondera.