As medidas apresentadas na última segunda-feira pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, para conter os prejuízos com a disseminação do coronavírus são bem-vindas, mas estão longe de dar o fôlego necessário para que a economia consiga reagir, avaliam especialistas ouvidos pelo Correio. Grupos mais vulneráveis e setores que precisam de intervenções com urgência, reclamam que não foram contemplados. Alguns, como o setor de bares e restaurantes, alertam que estão à beira de um colapso.
O governo não anunciou nenhuma medida específica, por exemplo, para socorrer os trabalhadores informais. Pelos dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), são 38,8 milhões de brasileiros que correm o risco de ficar sem serviço e sem dinheiro. A principal fonte de rendimento desse grupo depende de demanda, restrita em tempos de crise e quarentena. E, sem carteira assinada, esses trabalhadores não têm nenhum tipo de garantia ou auxílio, caso fiquem doentes ou precisem se afastar.
Para diminuir os prejuízos dos mais necessitados, o economista Mauro Rochlin, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), acredita que o governo precisa adotar medidas que vão além da regularização do Bolsa Família e das outras providências anunciadas, que, na visão dele, “são gotas para apagar um incêndio”. Pode ser necessário, por exemplo, distribuir alimentos para a população de baixa renda e para trabalhadores informais que ficarem desassistidos.
O economista Ricardo Balistiero, especialista em economia do setor público, sugere políticas ainda mais “caras”, como colocar, literalmente, dinheiro na mão das pessoas, a exemplo do que será feito nos Estados Unidos. “Não sei se, no Brasil vamos fazer isso, mas talvez tenha que se pensar em algo parecido. No momento, temos que tomar medidas urgentes, o que não foge de políticas assistencialistas. É um choque de realidade para o ministro (Paulo Guedes), que agora entende para que serve o Estado”, disse.
O mesmo vale para as mudanças no Bolsa Família. O governo anunciou que vai zerar a fila e colocar mais 1 milhão de famílias no programa de transferência de renda. Mas, para o economista Frederico Gomes, professor do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec), falta garantir um aumento temporário nos repasses. Hoje, o governo paga, em média, R$ 191 por mês às famílias cadastradas.
O Ministério da Economia estuda ampliar o valor, mas ainda não anunciou nenhuma medida concreta nesse sentido. “Acho prudente, porque essas famílias são extremamente vulneráveis”, ressalta Gomes. Ele lembra que muitos governos estaduais e municipais estão fechando escolas, o que prejudica crianças carentes. “Muitas delas dependem da merenda. Isso faz toda a diferença no orçamento dessas famílias, que agora estão gastando mais com alimentação”, ressalta.
Colapso
Trabalhadores que têm carteira assinada também podem enfrentar problemas, mesmo com as medidas anunciadas pelo governo, como adiantamento de abono salarial e resgates do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Uma das maiores preocupações é a possibilidade de que empresas precisem fechar as portas e demitir os funcionários. Situação que, segundo o presidente executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci, não está longe de acontecer.
“A velocidade em que mudou o quadro é tão alarmante que o setor já está em colapso”, alertou. Ele levou o recado ao presidente Jair Bolsonaro e a Guedes, na última segunda-feira, e afirmou, na ocasião, que o único jeito de evitar desemprego em massa é colocar dinheiro direto no caixa das empresas. Pelos cálculos da Abrasel, é preciso que o governo libere algo entre R$ 1 bilhão e R$ 1,5 bilhão. “Vamos ter que abrir mão da política liberal agora e entender que o momento é de emergência, tem que ser enfrentado por medidas de exceção”, afirmou.
"Temos que tomar medidas urgentes, o que não foge de políticas assistencialistas. É um choque de realidade para o ministro (Paulo Guedes), que agora entende para que serve o Estado"
Ricardo Balistiero, economista estudioso do setor público