Diante da escalada do preço dos combustíveis, é urgente buscar alternativas à gasolina e ao diesel. As perspectivas são promissoras, com veículos elétricos, abertura do mercado de gás natural, o programa Renovabio, que incentiva o uso de biocombustíveis, e o desenvolvimento do biogás. Contudo, ainda falta infraestrutura para garantir a oferta na ponta, ou seja, levar esses combustíveis ao tanque dos carros dos brasileiros.
A secretária de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia (MME), Renata Isfer, explica que o governo quer ampliar a diversidade na matriz, para que o próprio mercado defina qual tecnologia será mais viável. “Temos opções de carro elétrico, etanol, veículos a gás. Quanto mais, melhor. Os combustíveis competem entre si. Isso é bom para o consumidor”, diz.
Como os carros elétricos ainda são caros, a participação deles na frota é inexpressiva. Dos mais de 40 milhões de veículos que circulam no país, apenas 20 mil são híbridos/elétricos, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). A questão da bateria, que dura apenas cinco anos, e não é de descarte simples, por ser altamente poluente, também trava o desenvolvimento do setor.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) vem ajudando a estimular o mercado, regulamentando a instalação e o uso de eletropostos para veículos elétricos. Em todo o país, há 63 estações de recarga. “Uma chamada de P&D deve movimentar R$ 463,8 milhões em 30 projetos de instalação de centenas de eletropostos. Além disso, os veículos elétricos plug-in podem ser recarregados nas residências”, informa a Aneel.
Energia do lixo
O biogás é o combustível do futuro, mas num horizonte ainda distante. Produzido de resíduos e rejeitos, é altamente sustentável. “Daqui a 10 anos, estaremos em outra realidade, com combustível feito do lixo”, diz Renata. De acordo com a Associação Brasileira de Biogás (ABiogás), o potencial de produção no Brasil chega a 50,4 bilhões de metros cúbicos (m³) por ano, volume suficiente para suprir 70% da demanda de diesel no país.
Enquanto o biogás não se desenvolve plenamente, uma alternativa mais viável é aumentar a participação do gás natural veicular (GNV) e do gás natural liquefeito (GNL), com o Novo Mercado do Gás. Segundo números da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), até 2030, o Brasil deve quase triplicar a produção líquida de gás natural, saindo dos atuais 59 milhões para 147 milhões de m³/dia.
Hoje, no entanto, o mercado de gás do Brasil é incipiente diante do potencial que tem, sobretudo com o pré-sal. “Isso porque a Petrobras é o principal agente do início ao fim da cadeia: produtora de gás, única proprietária de infraestrutura e maior consumidora, porque detém termelétricas. Por mais que se tenha aberto o mercado em 1997, os incentivos não foram suficientes para outros concorrentes entrarem”, explica a secretária do MME. “É aí que entra o Novo Mercado. Uma das frentes é acabar com o monopólio da Petrobras”, diz.
Segundo Renata, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e a petroleira celebraram um Termo de Compromisso de Cessação (TCC) e a estatal vai vender sua participação nas transportadoras, sendo que a Transportadora Associada de Gás (TAG) já foi vendida, assim como a TGB, ex-subsidiária de operação do gasoduto. “Um projeto de lei vai permitir o compartilhamento das estruturas da Petrobras. Houve correção da tributação e incentivo aos estados para aprimorarem os regulamentos às distribuidoras de gás, que são estaduais”, enumera.
Integrar o setor de gás com o elétrico e o industrial para aumentar a demanda também poderá desenvolver o mercado. Com essas medidas, o governo espera ampliar a participação do gás também como combustível de carros. A oferta, hoje, depende da região, porque, para transportar gás, é preciso duto, ou convertê-lo em GNL para colocar no tanque do caminhão. “No Rio de Janeiro, todos os táxis e carros de motoristas de aplicativos têm GNV. Em Brasília, há pouco, porque o custo de trazer o gás para o centro do país é mais alto, e o preço deixa de ser competitivo”, justifica.
Atualmente, 1.570 postos comercializam GNV no país. Existem 14 unidade de processamento de gás natural, que podem converter gás em líquido, e há três terminais de GNL — na Baía de Guanabara (RJ), em Conde (BA) e em Pecém (CE) —, um em fase de testes em Coqueiros (SE), outro em construção no Porto do Açu (RJ) e um projeto para Barcarena (PA). “Mas existem iniciativas muito interessantes em andamento. A Golar, empresa de transporte de GNL, fez um memorando de entendimento com a BR Distribuidora, que vai fornecer a infraestrutura de abastecimento nos seus postos”, revela.
De olho no crescimento do mercado do gás, a Scania Latin America anuncia o início da produção local e inédita de caminhões movidos a GNV e GNL. De acordo com Gustavo Bonini, diretor de Relações Institucionais e Governamentais da empresa, a decisão de apostar em combustíveis alternativos foi tomada considerando o gás do pré-sal e o biogás do agronegócio. “O governo está falando muito no gás, um choque de energia como alternativa ao diesel. A Scania está apostando nisso”, conta.
Produto sustentável
Mais sustentável do que os carros elétricos, movidos à eletricidade — que pode ser gerada de fontes não renováveis, e cujas baterias são poluentes —, os biocombustíveis ajudam a capturar CO² no processo de crescimento das plantas que dão origem ao produto. Hoje, 31% de todo o combustível consumido no Brasil é biocombustível. Com o Renovabio, que entrou em vigor em dezembro do ano passado, a expectativa é chegar a 39% em 2029. Isso inclui as misturas de 27% de etanol na gasolina e de 12% de biodiesel no diesel. Em 2023, serão 15%, o chamado B15. “O aumento é gradativo, de um ponto percentual ao ano, para os produtores se adequarem à demanda”, assinala a secretária do MME, Renata Isfer.
O biodiesel pode ser produzido a partir de soja, mamona, gorduras vegetais e até sebo de gado. Com o Renovabio, as empresas que emitem CO² terão que comprar certificados, chamados Cbios, para compensar. Com isso, a expectativa é aumentar o consumo de biocombustíveis. “O etanol já é competitivo. Quando tiver mais competição e incentivo para gerar mais etanol, a tendência é baixar o preço. Como parte da gasolina é etanol, o litro do derivado também pode baratear na ponta para o consumidor”, estima.
O diretor-superintendente da Associação dos Produtores de Biocombustíveis (Aprobio), Júlio Minelli, explica que, mesmo que a previsão seja chegar ao B15 em 2023, a legislação já permite que as distribuidoras adquiram e misturem mais biodiesel. “O setor espera chegar ao B20, ganhando um ponto percentual até 2028. Sabemos que os motores não dão problema. Em alguns países, há utilização de 100% de biocombustíveis.”
O dirigente diz que, em Curitiba, há ônibus que rodam com 100% de biodiesel. “Em relação ao B7 (diesel com 7% de biocombustível), o consumo foi de 6,5% a mais, pequena diferença”, destaca. “As montadoras estão aprimorando a tecnologia. A partir de 2023, usarão novos equipamentos para restringir a poluição e rodar com maior quantidade biodiesel”, revela.