Economia

'Propostas de reforma tributária são ruins', diz Heleno Taveira Torres

Heleno Taveira Torres, professor titular de Direito Tributário da Universidade de São Paulo, considera as duas propostas de reforma tributária que tramitam no Congresso - uma na Câmara e outra no Senado - inviáveis e tecnicamente muito ruins. Ele defende uma reforma tributária fatiada, que reformule a estrutura de cada imposto existente, sem criar novos. Essa mudança, na sua opinião, poderia ser feita por meio de leis ordinária e complementar, sem necessidade de alterar a Constituição. A seguir, os principais trechos da entrevista. Como o sr. avalia o sistema tributário atual? É um sistema defasado. A legislação é muito ruim, com conceitos indeterminados e uma quantidade enorme de leis, que vão gerando dúvidas na interpretação e que acabam questionadas na Justiça. Isso cria muita litigiosidade. O passivo tributário chega a R$ 5 trilhões. É quase um PIB (Produto Interno Bruto) inteiro. Como o sr. vê o encaminhamento da reforma tributária? Temos a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 110 no Senado e a PEC 45 na Câmara. O meu entendimento é que, para fazer a reforma, não é preciso mudança excessiva na Constituição. Poderíamos fazer uma reforma ampla, dando segurança jurídica aos investimentos, reduzindo conflitos e gerando melhor ambiente de negócios com ações rápidas e efetivas na própria legislação de cada imposto existente. Por que, então, as PECs? Quando não havia proposta, Rodrigo Maia (presidente da Câmara) abraçou o projeto do IBS. Na época, era a única proposta, que se consolidou na PEC 45. O objetivo foi manter ativa a discussão da reforma. Ainda bem que ele fez isso. Mas até agora não veio a proposta do governo. A Constituição diz que é competência do presidente e, obviamente dos ministros, de apresentar mudanças sobre tributação. O que o sr. acha das PECs? Do ponto de vista técnico, são muito ruins. A reforma que está sendo construída é só sobre a tributação do consumo. Mas o sistema envolve também a tributação da renda, da folha de salários, questões sobre multas, processo de arrecadação e cobrança. Precisamos de uma reforma tributária mais ampla. As duas PECs não resolvem os problemas dos tributos sobre consumo, criam duplicidade de sistemas, o que não é bom para a economia. As pessoas vão ficar com medo de investir até que conheçam as leis e como vai se comportar o novo imposto. O sistema velho, não reformado, estará funcionando ao lado do novo sistema de tributação de consumo. Isso é perigosíssimo. O que o sr. acha do movimento dos empresários contra as PECs, pedindo a desoneração da folha e a criação da nova CPMF? Um absurdo, vergonha alheia. Só compreendo e entendo essa manifestação como uma rejeição às PECs e por falta de medidas reais e concretas de reforma, que deveriam vir do Ministério da Economia. Qual seria a proposta factível? A reforma não deveria ser constitucional, mas infraconstitucional. O correto hoje, para ser mais rápido e atender às demandas da sociedade, seria reformar a estrutura de cada imposto, por lei ordinária e complementar. Qual o mecanismo para fazer uma reforma tributária sem mexer na Constituição? O mecanismo seria o ministro da Economia, Paulo Guedes, ter um olhar reformador sobre o sistema tributário. Ele precisa mandar para o Congresso projetos de lei complementar. O Guedes tem de sair da caixinha do IBS e criar a caixinha do fatiamento. Vamos fatiar essa reforma tributária, tributo a tributo, e mexer em cada um. Seria mais rápido e eficiente. A celeridade está nas mãos do ministro. Ele é quem decide: se quer fazer uma reforma rápida e simplificadora e indutora de segurança jurídica ou se quer continuar com um sistema absolutamente confuso, complexo e com um debate centrado em duas PECs, que não vão para lugar nenhum. E por que o ministro não faz isso? Ele é um homem de mercado financeiro e não tem essa compreensão de Estado e da importância do que é ser um estadista reformador. O sistema tributário não é só o pagamento de imposto. É também o grande processo de alinhamentos federativos, de equalização de financiamentos de Estados e municípios, de redução de conflitos. É preciso usar o sistema tributário como indutor das políticas que o Estado quer ver realizadas. Quais são essas políticas? Nós não sabemos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.