Economia

BC não vê ligação entre alta do dólar e piora da economia brasileira

Presidente do Banco Central afirma que valorização da moeda, ao contrário do que ocorria no passado, não está ligada a piora da economia brasileira. Segundo ele, demanda pela divisa aumentou porque empresas buscam quitar dívidas no exterior

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse que a autoridade monetária está tranquila em relação à alta do dólar, que começou o ano a R$ 4,01 e bateu nesta terça-feira (18/2) em R$ 4,35, novo recorde nominal de fechamento. Questionado sobre o assunto na Câmara dos Deputados, Campos Neto alegou que, ao contrário do que aconteceu no passado, a alta do dólar não é reflexo de uma piora da percepção de risco, mas consequência da estabilidade da eco nomia brasileira.

“A desvalorização (do real) tem vários motivos. Mas eles são diferentes dos vistos nos últimos movimentos de desvalorização. Toda vez que havia uma grande desvalorização era porque o risco-país estava aumentando. Aí, a taxa de juros de longo prazo subia e a Bolsa caía bastante. Nesse último movimento, é o contrário. A moeda se desvalorizou um pouco mais, mas veio acompanhada de uma melhora da percepção de risco do país”, afirmou o presidente do BC. De acordo com ele, as perspectivas econômicas do Brasil hoje são diferentes porque a taxa de juros está baixa, a inflação está controlada e o Ibovespa vinha batendo máximas históricas nos últimos meses.

Campos Neto afirmou que a alta do dólar é fruto, sobretudo, da desvalorização das commodities, mas também de um movimento do empresariado, que está aproveitando os juros baixos para tomar dinheiro emprestado no Brasil e pagar as dívidas contraídas em moeda estrangeira. “A curva de juros caiu a tal ponto que as empresas perceberam que era melhor tomar dívida local, transformar os reais em dólares e mandar a moeda à vista para liquidar a dívida em dólar lá fora. Isso gerou demanda no mercado à vista. Então, o dólar subiu. Mas isso foi gerado por uma melhora de percepção”, argumentou.

“Então, estamos tranquilos nesse sentido”, concluiu o presidente do BC, sem citar, contudo, a interferência que declarações políticas polêmicas têm surtido na cotação do dólar. Na semana passada, a moeda chegou a R$ 4,38 durante as negociações diárias depois de o ministro da Economia, Paulo Guedes, dizer que era bom manter o dólar alto para acabar com a festa das empregadas domésticas indo à Disney.

Campos Neto afirmou, porém, que o BC vai continuar de olho no câmbio e pode intervir no mercado quando achar que a volatilidade está alta, como fez na semana passada depois das afirmações de Guedes. “Obviamente que, sempre que identificarmos um movimento de falta de liquidez, que o Brasil esteja divergindo dos seus pares ou que isso esteja começando a influenciar a percepção de inflação, o BC pode fazer uma intervenção, como fez recentemente”, afirmou, frisando que o Brasil vive um regime de câmbio flutuante.

Autonomia

O presidente do Banco Central foi questionado sobre o câmbio ao conversar com a bancada do DEM na Câmara sobre o projeto de autonomia do BC, que deve ser votado pelos deputados em março. O projeto cria mandatos fixos, distintos do mandato do presidente da República, para o presidente e os diretores do BC. Por isso, é visto como uma maneira de garantir a imparcialidade e o caráter técnico das decisões da autoridade monetária. Segundo Campos Neto, também é um estímulo ao controle da inflação e à recuperação da economia brasileira.

“Países em que o Banco Central é mais independente tendem a ter inflação menor e mais contínua, com menos volatilidade, o que permite mais planejamento e investimento”, afirmou Campos Neto, dizendo que as chances de continuar com a inflação baixa aumentariam em 50% caso o projeto seja aprovado pelo Congresso. “Facilita a obtenção de inflação baixa, menores juros estruturais, menores riscos e maior estabilidade monetária e financeira”, afirmou, na apresentação que fez aos deputados.

Campos Neto ainda sugeriu que a autonomia pode facilitar a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), visto que hoje o país é cobrado por ser o único integrante do G20 a não ter um banco central autônomo. Ele explicou que o projeto é aguardado pelos investidores externos.

Contudo, ainda há incerteza sobre qual projeto de autonomia do Banco Central será priorizado pelo Congresso. A proposta que está na Câmara foi apresentada pelo governo no ano passado. Nesta terça-feira (18/2), a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado aprovou outro projeto, com o mesmo objetivo. O texto, além de prever a autonomia, estabelece que o BC deve cuidar não apenas do controle da inflação, mas também do crescimento econômico. A expectativa dos senadores é que esse texto também seja votado em plenário após o carnaval. Campos Neto não comentou as diferenças entre os projetos.