Garantido o avanço de pautas econômicas e de ajuste fiscal, a agenda social passará a ter mais atenção do Congresso em 2020. Uma das discussões em pauta é colocar o programa Bolsa Família na Constituição, para que deixe de gerar insegurança em época de eleição e de ser usado politicamente por quem estiver no governo.
A medida faz parte da agenda social elaborada pela deputada Tábata Amaral (PDT-SP) e apresentada, em novembro do ano passado, pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ). A proposta relativa ao Bolsa Família inclui, ainda, um reforço de R$ 9,8 bilhões no programa.
Há outros pontos de destaque no pacote, que conta com sete projetos de lei e uma proposta de emenda à Constituição (PEC) sobre garantia de renda, inclusão produtiva, proteção ao trabalhador, água e saneamento, governança e incentivos aos municípios que combaterem a pobreza.
Uma das novidades é a criação do Benefício Infantil Focalizado para famílias com crianças de até seis anos que ainda não recebem o Bolsa Família, o que beneficiaria cerca de 3,2 mil pessoas. Além disso, os valores transferidos por criança, dentro do Bolsa Família, passariam de R$ 41 para R$ 50, enquanto o Benefício de Superação da Extrema Pobreza alcançaria R$ 100.
Kátia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil, elogia a iniciativa, que chega para preencher um vácuo deixado pelo governo federal. Ela afirma, entretanto, que o ponto de partida deve ser o combate ao racismo. “É importante que o Congresso coloque no centro um dos pilares da desigualdade, que é a questão do racismo. Significa trazer o pensamento político de especialistas negros e, realmente, trazer para o debate essa maioria, para que pense as políticas e elabore as propostas que vão ser colocadas em debate social”, explica.
Preconceito
A falta de representatividade também preocupa a ex-copeira Maria José Santos, de 51 anos. Separada há 11 anos e criando os três filhos sozinha, ela sofre por não conseguir voltar ao mercado de trabalho e aponta como uma das causas o preconceito racial. “Eu vejo que a desigualdade e a pobreza atingem muito mais as pessoas negras. O Brasil é muito racista”, afirma a dona de casa, que está com diversas contas atrasadas de água e luz.
Maria José busca alternativas para sair da atual situação. Já vendeu dindin pelas ruas do Distrito Federal, e café, entre outras coisas. Mas destaca que essas opções não ajudam no sustento da casa. Atualmente, ela cursa o EJA (Educação de Jovens e Adultos) para concluir o ensino médio e entrar na faculdade. “Voltei a estudar no ano retrasado. Eu parei no primeiro ano e, agora, estou no último grau. Acho que os estudos ajudam e dão mais chances e alternativas de empregos”, diz.
O discurso de meritocracia desmancha com casos como os de Maria José, afirma Kátia, da Ofxam. “Fala-se muito nisso, como se todos partissem do mesmo lugar. Um país que tem o nível de desigualdade que o Brasil tem não pode se dar o luxo de ficar falando de meritocracia, porque não existe isso quando há uma maioria da população que tem salário abaixo do mínimo, que não consegue se manter, muito menos estudar”, explica. (AA e AP)